A 3ª Vara Federal de Porto Alegre (RS) decidiu manter as remoções e realocações das famílias da Vila Nazaré, na Capital, para a sequência das obras do aeroporto Salgado Filho. A juíza Thaís Helena Della Giustina entendeu que, diante da adoção de protocolos de segurança sanitária pelas pessoas envolvidas, não há motivos para suspensão do serviço.
O pedido para parar os trabalhos foi feito pelos ministérios públicos Federal e Estadual e pelas defensorias públicas da União e do Estado. Conforme as instituições, estava ocorrendo a demolição de residências com todos os móveis e pertences no dia 18 de março, sem fornecimento de alternativa habitacional. Enfatizaram ainda que tal atitude em meio à pandemia global de coronavírus, na qual a principal recomendação é de que as pessoas permaneçam em casa, ultrapassa qualquer limite imaginável em um Estado Democrático de Direito.
Alegaram, ainda, que a realização de remoções e realocações, no quadro atual de pandemia, mostra-se como medida absurda e que coloca em risco as pessoas removidas, muitas em estado de vulnerabilidade social, idosos e com problemas sérios de saúde, distanciando-os de suas redes de proteção, além de colocar em risco os próprios trabalhadores envolvidos.
Ressaltaram, no entanto, que, eventualmente, algumas famílias podem entender ser mais adequado serem realocadas, o que poderia ser feito desde que comunicado ao juízo e seguindo os protocolos sanitários adequados.
Contraponto
A concessionária do aeroporto Salgado Filho, Fraport Brasil, sustentou a regularidade da demolição das construções, ressaltando que se tratam de imóveis localizados dentro do sítio aeroportuário e que eram residências esvaziadas. Observa que os autores não verificaram corretamente os fatos, além de tentar impor obstáculos à criação de cenário mais favorável à efetivação dos direitos fundamentais dos moradores.
Afirmou ainda que a manutenção do quadro atual, com mais de 700 famílias residindo na Vila Nazaré, traz imensas complicações ao necessário combate à covid-19, já que é impossível a implementação de medidas de higiene pessoal e isolamento/distanciamento social.
Defendeu que a mudança dos moradores para os empreendimentos Minha Casa Minha Vida, que contam com infraestrutura sanitária básica e com mais espaço e delimitação das residências para garantir a efetividade do isolamento social, aumentam em muito as chances de prevenção do novo coranavírus e de menores números de contágios e óbitos, já que várias dessas pessoas integram grupos de risco.
A prefeitura argumenta que tem amplo interesse em resguardar as condições de vida e de saúde dessa população, afastando a possibilidade de desabrigá-las sem a garantia do recebimento das chaves da nova moradia. Ressalta que há uma equipe de servidores do Departamento Municipal de Habitação (Demhab) envolvida, dentre os quais agentes comunitários, assistentes sociais, sociólogos e gestores dedicados neste reassentamento, justamente para que, neste momento de pandemia, as pessoas sejam resguardadas e recebam um local de moradia que atenda o mínimo existencial da condição humana.
Realocações devem continuar
Ao analisar os argumentos e os documentos apresentados aos autos, a juíza Thaís Helena Della Giustina concluiu que os dois imóveis apontados pelos autores foram "efetivamente desocupados, tendo sido regular a sua demolição". Segundo ela, a Fraport Brasil também apresentou as medidas adotadas para execução segura do processo de reassentamento, diante da pandemia, como realizar o sorteio e a escolha das unidades habitacionais em espaço aberto apenas com a presença das pessoas indispensáveis e a disponibilização de álcool em gel, máscaras e luvas, as assinaturas dos contratos serão feitas individualmente no dia da mudança, que ocorrerá em data pré-agendada.
A magistrada apontou que os autores mencionam a suspensão de ordens de despejo como medidas adotadas em outros países. “No entanto, insta observar que as circunstâncias do caso têm que ser analisadas sob outro viés, ou seja, à vista das condições precárias das habitações existentes na Vila Nazaré, conforme já retratado nos autos, em cotejo com o fato de que o empreendimento oferecido às famílias apresenta irrefutavelmente melhores condições de habitação. Em verdade, o acolhimento do pedido de suspensão das remoções, importaria, ao que se conclui, prejuízo às famílias, pelo que há de ser indeferido”.
Della Giustina determinou que a prefeitura inspecione se todas as medidas de segurança e higiene estão sendo adotadas para evitar a disseminação do coronavírus durante o processo de remoção e realocação das famílias.
Cabe recurso da decisão ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.