Uma playlist com Guns N' Roses e Metallica recepciona os fieis no Partenon. O púlpito em que se apoia a Bíblia, no Sarandi, é uma prancha de surfe. No bairro Azenha, canhões de luz, máquina de fumaça e telas gigantes de LED turbinam o louvor. Quem faz a pregação no Bom Fim é um pastor com os braços e as mãos tatuadas.
Igrejas evangélicas nunca foram tão jovens — especialmente focadas nos rebanhos mais novos de Porto Alegre. Um movimento que, para o doutor em Antropologia Social e pesquisador associado ao Núcleo de Estudos da Religião da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Marcelo Tadvald, é uma tendência.
— O campo evangélico tem crescido muito desde década de 80 (o número de evangélicos aumentou 61% entre o último censo e o anterior), e os jovens sempre foram importantes para as congregações. Não é de se estranhar que começassem a surgir denominações voltadas para esse público.
Essas igrejas agora são church. Top, friends e flame são outras expressões em inglês que pipocam nas páginas de Facebook — in Jesus we Trust (em Jesus nós confiamos) era o slogan da Bola de Neve até pouco tempo. É que elas já descobriram que, muito mais eficiente do que buscar pedestres que tenham "um minutinho para a palavra do Senhor", é atrair novos fieis pelas redes.
— Hoje a mídia social é fundamental para o trabalho de evangelização. Trata-se de uma vitrine: quanto mais a marca for atrativa, melhor. O campo evangélico está disputando um mercado, porque é muita igreja. Diferentemente do Catolicismo, que tem um monobloco, uma instituição centralizadora que não se diversificou — explica Tadvald, acrescentando: — E aí entra o vocabulário cool, para usar um tempo que combine, para mostrar que eles estão inseridos.
Criada na Capital há seis anos, a Brasa Church já tem mais de 83 mil seguidores virtuais. A página no Facebook tem um design profissional e jovens estilosos e sorridentes na foto de capa. A linguagem é importante para esse público, a visual e, ainda mais, a falada. O pastor Mauricio Martins, 42 anos, ressalta a importância de difundir textos bíblicos escritos há milhares de anos de uma forma que o jovem entenda hoje.
— Todos têm a necessidade de se comunicar com seu Criador. E, quando a gente facilita essa conexão, aí acontece isso. Aqui e em todo o Brasil.
Tentando traduzir a aparência do rei de Israel enquanto lia uma passagem do Cântico dos Cânticos, o pastor da Igreja Cristã Vintage180 o comparou a um ator que a internet transformou no cúmulo da perfeição.
— Salomão era o Rodrigo Hilbert do Velho Testamento — disse Jackson Jacques, arrancando risadas.
Além de analogias atuais, a igreja criada pelo pastor Jack há quatro anos também sabe derrubar alguns tabus. Sexualidade é discutida com naturalidade no local, que recebe um público de 25 a 35 anos de idade, na maior parte. Nas perguntas que ele e a esposa respondem ao microfone no final dos cultos, já surgiram temas como sexo oral, anal e também orgasmos múltiplos — "uma bênção que Deus deu às mulheres", na palavra do pastor, capaz de explicar de forma fisiológica como acontecem. O objetivo é que os casais da igreja se realizem nos momentos de intimidade, que consideram a comunhão do relacionamento.
Mas não confunda comunicação franca e moderna com atitude liberal. As igrejas visitadas para esta reportagem não apoiam uniões homoafetivas ou sexo antes do casamento, por exemplo. Quando perguntado sobre o que o fiel deve fazer se transou com uma mulher não cristã, o pastor Jack responde que, se for um pecado pontual, deve se arrepender e pedir perdão a ela. Se transou com uma mulher cristã, a resposta é casar.
— Nós somos culturalmente liberais e teologicamente conservadores — define o líder da Vintage180.
Confira outras reportagens da série sobre igrejas evangélicas voltadas para o público jovem:
Encontros para jogar vôlei e fazer slackline, bate-volta para surfar e até motoclube fazem parte da estratégia de evangelização.
Reuniões da Cavalo Branco 2.0 ocorrem mensalmente em uma igreja do Partenon.
Banda religiosa Brasa Church Music faz jovens lançarem as mãos para cima, pularem e se emocionarem em um templo do bairro Azenha.
Emanuel Malinoski, 27 anos, está trabalhando na implantação da igreja Onda Dura na cidade.