Prestes a ser encaminhado à Câmara Municipal, um projeto de lei do Executivo proíbe a atividade de guardadores de veículos em Porto Alegre. O texto é abrangente: revoga as duas leis que regulamentam a atividade, de 1986 e 1990, e estipula multa de R$ 300 para quem for pego exercendo a atividade a partir da publicação das novas regras.
A proposta destaca ainda que caberá ao poder público "de forma exclusiva ou mediante concessão ou permissão, a exploração de estacionamento pago" em vias públicas, e prevê que a fiscalização será realizada por "agentes de fiscalização, guardas municipais e agentes de trânsito e transporte, de forma compartilhada".
O assunto é tratado como pauta de segurança pública. Em entrevista na manhã desta terça-feira, o secretário de Segurança, Rafael Oliveira, disse que partiu de reuniões do Gabinete de Gestão Integrada Municipal (GGIM), que inclui representantes da prefeitura, das polícias e de órgãos como o Ministério Público, e é "fruto de uma demanda da sociedade".
— Muitos flanelinhas estão a serviço do tráfico. Para restabelecer a ordem e o bom convívio social, achamos prudente proibir a atuação — disse o secretário.
O titular da segurança diz que a atuação dos flanelinhas em pontos de grande circulação é marcada por "achaques" — na orla do Guaíba, alguns chegam a cobrar R$ 30 dos motoristas, e há relatos de ameaças. Segundo ele, nas ações de fiscalização realizadas nos últimos três finais de semana, cinco foragidos foram apreendidos atuando como guardadores.
Caso aprovado, o projeto extinguirá uma atividade regulamentada há mais de 30 anos na Capital e que conta, atualmente, com mais de 1,4 mil guardadores cadastrados — para atuar, eles precisam apresentar atestado de bons antecedentes, certidão negativa dos cartórios criminais e só podem trabalhar em locais autorizados pela prefeitura.
A notícia pegou de surpresa representantes da categoria. Segundo o presidente do Sindicato dos Guardadores de Automóveis de Porto Alegre, Júlio Moura, a proposta da prefeitura coloca os regularizados e os irregulares "em um saco só".
— Estamos atuando há 35 anos em Porto Alegre. Fiz dois cursos, pagos pela prefeitura, em 2012 e 2014. Hoje são 1,4 mil famílias, quase 5 mil pessoas que vivem dessa renda. Aonde vão colocar esse pessoal? — questiona o sindicalista, que pretende buscar auxílio jurídico caso o projeto seja aprovado pelos vereadores.
A proposta do Executivo não prevê alternativas para quem atualmente vive desse tipo de atividade na Capital. O texto também não detalha como deve funcionar a fiscalização nem qual deve ser o modelo de estacionamento adotado nas áreas onde hoje atuam os guardadores. Segundo a prefeitura, o projeto está em fase final de redação.
Oposição critica projeto "simplista"
De viés polêmico, o projeto que põe fim aos flanelinhas promete levantar debates na Câmara Municipal. Para o vereador Marcelo Sgarbossa (PT), a proposta é "simplista" e não deve resolver o problema dos achaques.
— É óbvio que flanelinhas, numa sociedade justa, não precisariam existir. Uma pessoa ter de cuidar do carro da outra não é coisa de sociedade justa. Repudio a extorsão, mas isso não se resolve com mera proibição. Não pode partir de cima para baixo — disse o parlamentar, que acredita que o prefeito está buscando "capital político" com algo que "não vai ter resultado".
A constitucionalidade da proposta também já está sendo questionada entre os parlamentares. De acordo com o vereador Adeli Sell (PT), que propôs uma lei sobre o mesmo tema no começo dos anos 2000, o projeto do Executivo entra em conflito com a legislação federal, que regulamenta o exercício das profissões de guardador e lavador autônomo da veículos desde a década de 1970. Caso seja considerado inconstitucional, o projeto do Executivo pode ser descartado antes de ir a votação.