O campus da UniRitter em Canoas abriu suas portas neste sábado (31) para um público diferente do que costuma circular pelos corredores da universidade.
Em vez de jovens estudantes com livros embaixo do braço, as salas foram ocupadas por homens e mulheres que deixaram seus países de origem e rumaram para o Brasil em busca de uma vida melhor. Pelo menos 150 migrantes e refugiados, muitos deles acompanhados pelos filhos, enfrentaram a chuva para participar de atividades como oficinas de capacitação e saúde, encaminhar documentos e ter aulas de informática.
A iniciativa, chamada Braços Abertos para a Comunidade Migrante, foi organizada em parceria com a prefeitura de Canoas, a Defensoria Pública da União e a seção canoense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) com objetivo de melhorar a qualidade de vida dos estrangeiros que encontraram refúgio na Região Metropolitana. Para isso, foram oferecidas opções como cursos nas áreas de informática e gastronomia, oficinas de saúde bucal e da mulher, dicas para elaboração de currículo, além de cadastro em banco de oportunidades de emprego, das 10h às 14h.
A maioria dos participantes era formada por haitianos como Jacquenel Evariste, 34 anos. Radicado no Brasil desde 2013, três anos depois de um terremoto devastar o país de origem, participou de um curso de informática. Apesar das dificuldades em construir uma nova vida, Evariste é um exemplo de integração entre a comunidade de migrantes e o Rio Grande do Sul. Trouxe a namorada do Haiti e casou com ela em solo gaúcho, onde também nasceu o primeiro filho, James, de dois anos.
— O início foi muito difícil, principalmente por causa da língua e da luta para conseguir trabalho. Hoje a situação é melhor — conta o haitiano, que trabalha como auxiliar de segurança, enquanto a mulher atua na área de limpeza.
Evariste também faz um curso de licenciatura em Letras e, por enquanto, não tem planos de abandonar o Estado — mesmo que tenha deixado irmãos e tios no Haiti. O quase gaúcho só não se habituou a um dos costumes mais típicos da nova terra:
— Experimentei chimarrão uma vez só. Vamos ver se um dia eu me acostumo.
Enquanto os pais faziam as oficinas, James e cerca de 20 crianças participavam de atividades pedagógicas.
— Percebemos que muitos precisavam ter onde deixar as crianças para poder participar — afirma a coordenadora do Núcleo de Apoio e Assessoria a Imigrantes e Refugiados (Naari) da universidade, Fernanda Barasuol.
Conterrâneo de Evariste, Cantel Docilet, 39 anos, viajou sozinho e assim continua morando em Canoas. Mas garante que "está na caminhada" para tentar formar uma família no Brasil. Enquanto isso, conseguiu emprego em uma empresa de pintura e foi ao campus para aprender noções de informática e como melhorar o currículo.
— Meu sonho é, um dia, abrir meu próprio negócio e poder visitar meus parentes que ficaram no Haiti — conta Docilet.
Iniciativa começou com grupo de alunos
Foi para facilitar sonhos como esse que a ideia de acolher migrantes e refugiados teve início na UniRitter, em 2016. O projeto nasceu de um grupo de três alunos do curso de Relações Internacionais, hoje já formados: Mateus Perez, 27 anos, Yuri Padilha, 25, e Aléxia Araújo, 23.
— Vimos que as pessoas estavam chegando desamparadas ao Brasil, então começamos a atuar ajudando na emissão e validação de documentos — conta Aléxia.
Assim surgiu o Núcleo de Apoio e Assessoria a Imigrantes e Refugiados (Naari), vinculado ao curso de Relações Internacionais, que organizou a primeira edição do dia de acolhimento aos migrantes no campus da universidade neste sábado. A ideia é que o evento, que ganhou apoio institucional da UniRitter e contou com professores e alunos voluntários de vários outros cursos, seja repetido todos os anos.
— A gente tinha a intenção de criar uma extensão do curso de Relações Internacionais, mas acabou virando uma coisa muito maior — conta Perez.
Inicialmente, os voluntários do projeto iam até as comunidades de estrangeiros e procuravam atender às demandas. Depois disso, o grupo sentiu a necessidade de também atrair os imigrantes e refugiados para dentro da universidade.
— Também é uma maneira de acabar com os estereótipos em relação aos imigrantes. Cada um tem a sua própria história — afirma Padilha.
A gerente acadêmica do Campus Canoas da UniRitter, Fabiane Klein, afirma que cerca de cem pessoas, entre professores e alunos, participaram do Braços Abertos.