ESPECIAL HAITI: MISÉRIA, AJUDA E ESPERANÇA
Bairro de Ti Haiti - Porto Príncipe
Os 42 segundos relatados pelo major Marcelo Fauri destruíram o país, que recém começava a se reerguer da crise política de 2004, que obrigou a ONU a instalar a Missão para Estabilização do Haiti. A Rádio Gaúcha viajou para Porto Príncipe, capital do Haiti, para conferir como está o país cinco anos após o terremoto.
Durante uma semana visitamos diversas regiões do Haiti, ouvimos autoridades da ONU, do governo haitiano, do governo brasileiro, os militares que fazem parte das Forças de Paz e a população. Cerca de 300 mil pessoas morreram no terremoto. Milhares ficaram sem lar.
Encontramos em Porto Príncipe um militar que estava no Haiti no momento do terremoto, no dia 12 de janeiro de 2010. Gaúcho de Porto Alegre, o major Marcelo Fauri recorda os momentos de tensão.
"Eu estava correndo com um colega dentro da Base General Bacellar quando começou o terremoto. Foi uma sensação diferente, porque nós nunca tivemos uma sensação como essa no nosso país. Até esse meu colega achou que estava tendo um enfarto, depois achou que era um atentado a bomba. Quando nós percebemos realmente que era um terremoto", conta o militar.
Major Marcelo Fauri
Fauri lembra que após o tremor o trabalho foi intenso.
"As tropas se reuniram. Foram resgatar primeiramente os militares que se encontravam no nosso QG, que era o Hotel Cristopher e nas bases militares, onde tivemos baixas de alguns militares".
Vinte e dois militares brasileiros morreram no terremoto. O major lembra que o cenário era de um filme de terror.
"Muitos corpos. A cultura do povo haitiano, o morto é enrolado no lençol branco e colocado no meio da rua, onde as tropas de engenharia recolhiam esses corpos e enterravam".
Cinco anos depois do terremoto, o major está de volta o Haiti. Para ele, o país está muito melhor do que quando deixou Porto Príncipe em 2010. Mas claro, precisa melhorar muito.
"Hoje eu me encontro na segunda missão. Então houve uma melhoria muito grande dentro do país. Mas ainda precisam muitas melhorias. E a Engenharia encontra-se aqui em solo haitiano justamente para ajudar nessas melhorias", relata o major Marcelo Fauri.
Infraestrutura
Ainda há muitas casas destruídas desde o terremoto de 2010
Pelas ruas de Porto Príncipe, muita coisa segue destruída. A área onde ficava o Palácio Presidencial, por exemplo, destruído no terremoto, segue cercada, mas os escombros já foram retirados. O Governo ainda funciona em local provisório. O parlamento haitiano ainda não possui sede. Funciona em contêineres. As ruas seguem de chão batido e muito esburacadas. A poeira quase impede a respiração de quem não está acostumado. Mas pelo menos agora as ruas estão desobstruídas.
A energia elétrica no país é quase inexistente na maioria das regiões. No bairro de Simon, acompanhamos uma patrulha noturna dos militares. Se não fossem os holofotes dos blindados, talvez não enxergaríamos nada. Em função do calor, as pessoas ficam deitadas na frente das casas ou nos telhados.
Local onde ficava o Palácio do Governo Haitiano
O coronel Aléssio Silva estava no comando do setor de comunicação do 20º Batalhão de Infantaria de Força de Paz do Brasil no Haiti quando estivemos no país.
Coronel Aléssio Silva
"Pelas imagens que a gente via daquela época e comparando com as imagens que a gente encontra pela cidade hoje, a gente percebe uma grande melhora. A gente já vê que diversos locais já conseguem demonstrar grande progresso. Ainda se encontram alguns bolsões de pobreza que já havia no Haiti antes, que atualmente ainda são fruto de esforços das Nações Unidas para sua recuperação".
Jeandie Biw, de 42 anos, conversava com amigos na escuridão do bairro de Simon e aceitou falar conosco.
Jeandie Biw, de 42 anos
"Para nós, no Haiti, a gente não tem nada. Na questão de reconstrução. Só tem muitos estrangeiros. É só isso que a gente está percebendo. Mas quase a gente não tem nada", disse o haitiano em creole.
Quando falamos com o capitão Monteiro de Barros, da Companhia de Engenharia de Força de Paz, ele estava nos seus últimos dias no Haiti, após seis meses de missão. Carioca, vai servir agora em Santa Maria, na Região Central do Rio Grande do Sul. Garante que o papel dos militares brasileiros foi fundamental para reerguer o Haiti.
Capitão Monteiro de Barros
"O terremoto realmente foi uma catástrofe muito grande. Não foi uma coisa pouca não. Muita gente morreu, muita coisa ficou destruída. Muitos avanços que a tropa brasileira da Minustah conseguiu fazer até então foi pro chão literalmente. Então realmente falta muita coisa", diz o militar.
Em umas das vielas de Cite Soleil, região mais violenta e mais pobre do Haiti, um grupo de homens jogava dominó valendo doces. Bilan Nissan, de 32 anos, era um deles. Quando o assunto é a reconstrução do Haiti pós-terremoto, a impressão que se tem é que a população não vê qualquer melhora.
Bilan Nissan, de 32 anos
"Mesma coisa. Não melhorou nada, não", reclamava o haitiano.
A reportagem da Rádio Gaúcha entrevistou em Porto Príncipe o embaixador brasileiro no Haiti. Natural de Porto Alegre, José Luiz Machado e Costa está há três anos no país.
Embaixador brasileiro no Haiti - José Luiz Machado e Costa
"O país apresenta índices muito baixos de desenvolvimento, de crescimento. E no momento que ele estava justamente superando suas crises políticas após a crise Duvalier (ex-presidente Jean-Claude Duvalier) veio a catástrofe do terremoto que interferiu em todos os esforços que se vinha fazendo no sentido de se possibilitar um desenvolvimento melhor do país", destaca o embaixador.
As tropas militares da ONU que estão no Haiti, dos mais diversos países, são comandadas por um brasileiro. Conversamos com o general José Luiz Jaborandy na Base General Bacellar, em Porto Príncipe. Para ele, ainda há muito o que fazer em termos de reconstrução, mas no que diz respeito a segurança a situação melhorou muito.
General José Luiz Jaborandy - Comandante das tropas militares no Haiti
"Inicialmente com uma postura mais forte, até certo ponto agressiva para buscar o restabelecimento da segurança. A Segurança foi conquistada. Então a segurança é uma base sólida para o início da estabilidade", afirma o general.
Na próxima reportagem, confira um balanço dos 10 anos da Missão das Nações Unidas para Estabilização do Haiti.
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