Você já se cansou de esperar tanto pelo ônibus que resolveu ligar para a prefeitura e reclamar da situação? Caso não, saiba que muitos passageiros fazem isso. A pedido de GaúchaZH, a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) levantou o número de reclamações recebidas neste ano por atrasos nas linhas de ônibus que operam em Porto Alegre.
Os dados correspondem ao período de 1º de janeiro a 28 de julho. No total, foram 5.241 reclamações por descumprimento de tabela horária. E, entre as cinco linhas com mais registros de reclamações, todas são operadas pela Carris — que teve 1.741 registros. Destes cinco itinerários, o campeão de reclamações é o Transversal 4 (T4), que liga as zonas Norte e Sul. De acordo com os números da EPTC, a linha teve 172 reclamações de atrasos registradas por usuários no período de sete meses.
As outras linhas da empresa pública que aparecem no ranking são todas transversais. Por ordem, depois do T4, as mais citadas são T3 (155 reclamações), T11 (116 reclamações), T1 (102 reclamações) e T9 (102 reclamações).
Na metade de maio, GaúchaZH publicou reportagem mostrando que as empresas de ônibus da Capital já haviam recebido 929 multas por descumprirem os horários determinados pela EPTC só nos primeiros quatro meses do ano. À época, a Carris também foi a empresa que liderou o ranking, com 434 autuações — que têm valor de R$ 496,16 cada. Na mesma matéria, o DG mostrou o drama dos usuários da linha T3. Em março, o desafio dos passageiros da linha T9 para embarcar nos coletivos também foi alvo de reportagem. Agora, as duas linhas da Carris aparecem no ranking da EPTC, mostrando a recorrência das reclamações.
O que chama a atenção é que, nos últimos dois anos, este mesmo levantamento feito pelo DG mostrou que as linhas que lideravam o ranking de reclamações não eram operadas pelas Carris. Em 2017, por exemplo, a linha com mais registros foi a 340 (Jardim Botânico), operado pelo consórcio Via Leste, que teve 132 reclamações, seguida da 283 (Ipanema/Cavalhada), operada pelo consórcio Viva Sul, com 121 reclamações. No ano passado, a liderança do ranking ficou com a linha B55 (Protásio/Humaitá), do consórcio MOB, que teve 106 reclamações. Em segundo lugar, empataram 340 (Jardim Botânico) e T3, com 75 reclamações cada.
Os dados de 2019 levantam duas questões: o que levou a Carris a dominar as primeiras colocações do ranking de reclamações? E o que os consórcios, que lideravam a lista nos últimos dois anos, fizeram para melhorar o serviço? A seguir, veja as explicações de cada um.
O que diz a Carris
Em relação ao T4, a empresa afirmou que os ônibus deste itinerário rodam 4,5 mil quilômetros por dia. Porém, somente 17% desse trecho é percorrido em vias exclusivas para os coletivos. A Carris acrescentou que essa característica "torna a transversal vulnerável a condições de trânsito como congestionamentos, bloqueios e aumento de tráfego".
Segundo a nota enviada pela Carris, em setembro de 2018, foi implantado o Plano de Manutenção Preventiva dos ônibus da frota. Essa ação elevou o nível de aprovação nas vistorias da EPTC para 95%.
A Carris diz que a falta de manutenção preventiva nos ônibus em anos anteriores e a frota fadigada decorrente dessa realidade são alguns pontos a se considerar na análise do que leva os usuários a reclamarem das linhas. Por fim, a empresa acredita que a evolução do Plano de Manutenção Preventiva terá como resultado a melhoria significativa das condições dos ônibus da Companhia.
O que dizem os consórcios
Operadores da linha Jardim Botânico, os consórcios Mais e Via Leste creditam a melhoria nos indicadores do itinerário à implantação gradual de tecnologias de monitoramento da operação. Isso tem permitido uma "melhor programação de horários, considerando tempos de viagem mais próximos à realidade da operação". Com isso, apesar de atuar em "vias com velocidade irregular, devido às variações do trânsito", o consórcio cita que a utilização de tempos médios medidos tecnologicamente permitiram uma melhor performance da linha.
Operador da linha Ipanema/Cavalhada, que apareceu no ranking em 2017, o consórcio Viva Sul acredita que a redução se deve "ao trabalho diário e intenso que se faz junto às empresas do consórcio e aos colaboradores, com o intuito de melhorar o atendimento". O grupo também cita a realização de treinamentos nas empresas para qualificar o serviço prestado.
O consórcio MOB, que opera a linha Protásio/Humaitá, campeã de reclamações no ano passado, diz que a melhoria no serviço se deve à "análise detalhada de cada reclamação e ao fornecimento de respostas aos clientes com a providência tomada para solucionar a questão". O MOB ainda afirma que busca "sempre melhorar a qualidade do serviço, seguindo as regras rígidas impostas pelo contrato de concessão".
A Associação dos Transportadores de Passageiros da Capital (ATP), que representa os consórcios, diz que as empresas têm buscado o tratamento detalhado de cada reclamação, análise de procedência, correções de procedimento e aprendizado e melhoria constante. Além disso, a ATP cita a implantação, neste ano, do sistema de GPS na frota (ainda em fase de teste), além das câmeras de monitoramento dos veículos. Para a associação, "essas tecnologias permitem analisar com eficácia a procedência de cada reclamação, o que facilita a análise e suas eventuais correções".
Quem usa concorda com os números
No terminal do T4 na Zona Sul, usuários da linha relatam as experiências diárias de espera no ponto de ônibus. A operadora de caixa Jeniffer Alves, 24 anos, diz que usa a linha de três a quatro vezes por semana. Para ela, o maior problema está nos horários que circulam entre 18h e 19h. A passageira conta que, neste período, além do tempo maior na parada, embarcar no veículo é um desafio — principalmente, em razão da superlotação.
— Pelo menos quando eu saio tarde, depois das 22h, como é um horário mais tranquilo, costuma vir na hora que está na tabela — conta Jeniffer.
Também operadora de caixa em uma loja do BarraShoppingSul, Carla Dregon, 24 anos, define a linha como "horrível". Ela, que costuma pegar o ônibus no cruzamento das avenidas Oscar Pereira e Aparício Borges, nos horários de pico, conta que já teve de esperar quase uma hora.
— Cheguei antes das 9h50min, que era o horário da tabela, mas só veio um ônibus às 10h45min — recorda.
Lotação
O atendente de lanchonete Christian Pereira, 19 anos, relata que, além da demora, a superlotação é outro problema da linha. Morador do bairro Bom Jesus, ele utiliza o coletivo diariamente, saindo de casa para o trabalho por volta das 6h50min:
— Nesse horário, costuma ser muito cheio. O pessoal se estressa, vejo discussões acontecendo repetidamente.
Usuária frequente do T4, a estudante de psicologia Vitória Broqua, 19 anos, diz que não acha a linha tão demorada, pois "já viu piores". Para ela, o problema maior é a qualidade dos ônibus.
— Acho os carros muito velhos, isso que me incomoda — critica ela.
A Carris anunciou a compra de 87 ônibus novos no início deste ano. Segundo a previsão da direção da empresa, os veículos devem chegar até outubro. Consultada, a Carris reiterou que "a consolidação da compra será informada na ocasião da obtenção da linha de crédito".
Como reclamar
- As reclamações podem ser feitas pelos telefones 156 e 118 ou pelo e-mail eptc@eptc.prefpoa.com.br.
- A EPTC pede que a reclamação contenha o horário, a linha atrasada e o local.
Campeãs de reclamações*
- 1º T4 — 172 reclamações
- 2º T3 — 155 reclamações
- 3° T11 — 116 reclamações
- 4º T1 — 102 reclamações
- 5º T9 — 102 reclamações
* Dados de 1º de janeiro a 28 de julho.