Qualquer cidadão nascido e criado em Porto Alegre tem boas chances de, em algum momento, infringir ou já ter violado uma lei municipal: ao todo, a Capital conta com mais de 12,8 mil normas sobre os temas mais diversos.
Justo por parecer impossível conhecer todas as regras, um grupo de vereadores trabalha, desde abril, para tornar a legislação municipal um pouco mais acessível à população. Até o começo do mês que vem, a Comissão Especial de Revisão Legislativa deverá elaborar relatório que sugere agrupamentos de leis que versem sobre o mesmo tema, a revogação de normas inócuas e uma revisão das desatualizadas.
— A nossa ideia é fazer um pente fino para ver o que pode ser consolidado, atualizado ou revogado, levando em consideração o pluralismo de visões da Câmara. Também vamos sugerir um trabalho permanente de revisão legislativa, seja através de uma comissão ou que seja feito de tempos em tempos — diz o presidente da comissão, Felipe Camozzato (Novo).
O grupo é composto ainda por Rafão Oliveira (PTB), Mendes Ribeiro (MDB), Moisés Barboza (PSDB), Ricardo Gomes (PP), Hamilton Sossmeier (PSC), João Bosco Vaz (PDT), José Freitas (PRB), Nelcir Tessaro (DEM) e Wambert Di Lorenzo (PROS). Todos os parlamentares indicaram assessores para realizar leitura e análise das leis, divididas por grupos. A comissão reúne-se a cada 15 dias para avaliar o trabalho e determinar o que deve entrar no relatório. Os projetos e minutas de lei feitos após análise devem passar por votação em plenário.
Na mira da comissão, estão alguns projetos peculiares, como a proibição da venda da chamada "carne de Chernobyl", de 1991, e uma lei que obriga imóveis com mais de 2 mil metros quadrados a terem, pelo menos, uma obra de arte. Também deve ter a cabeça a prêmio a proibição do funcionamento do comércio aos domingos e feriados, cujo descumprimento é passível de multa. Embora pouco respeitada, a lei de 1990 (atualizada por outra em 2002) segue em vigor no município.
Outra preocupação do grupo é aglutinar normas que versem sobre um mesmo tema _ segundo Camozzato, somente sobre transporte público há 64 leis diferentes. O processo já vinha sendo estimulado pela diretoria legislativa da Casa, que, desde 2009, informa aos vereadores que protocolam projetos de lei quando já existe uma regra sobre o mesmo assunto, estimulando que o parlamentar busque a atualização ou revogação da anterior.
— A consolidação das leis esparsas traz vantagens tanto para quem aplica quanto para quem se vale dessas normas. Mas é fato que existe um passivo grande anterior a esse período que precisa ser revisado — diz o diretor legislativo da Casa, Luiz Afonso de Melo Peres.
Segundo a Diretoria Legislativa, é a primeira vez que é feita uma análise global da legislação municipal _ entre 2017 e 2018, uma frente parlamentar começou a trabalhar no assunto, encaminhando 17 projetos para revogação. O processo mostrou-se trabalhoso. No dia 23 de maio, a comissão foi prorrogada por mais 30 dias. O texto final deverá ser apresentado no dia 2 de julho.
Revisão ajuda a "organizar a casa", segundo especialista
Prática pouco difundida entre o legislativo das diferentes esferas, a revisão periódica das leis pode mostrar-se salutar para organizar a máquina burocrática e evitar que leis anacrônicas atrapalhem o funcionamento das instituições, segundo o professor da UFRGS Gustavo Grohmann.
— Em geral, essa prática não é feita sistematicamente, mas de forma mais pontual, e os parlamentos têm diferentes mecanismos para fazer. No sentido de arrumar a casa, pode ser uma coisa positiva. Não que vá render algo maior, mas é importante liberar a legislação — diz o cientista político.
Apesar dos esforços dos vereadores, a revisão das leis municipais não deve ter impacto financeiro direto no orçamento do Legislativo e do Executivo. Para o líder da comissão, no entanto, a revogação de leis consideradas anacrônicas deve acarretar uma "simplificação burocrática" que pode melhorar o ambiente econômico no município.