A 8ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central de Porto Alegre possui 47 mil ações relativas a contendas sobre impostos municipais, como Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN),Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). O cartório, que já possui as prateleiras e mesas lotadas de pilhas de processos, teria de arrumar espaço para vários outros, sem contar os que são movidos pelo sistema eletrônico do Tribunal de Justiça (TJ). Essa é a projeção do juiz Alex Custódio, que divide com mais um colega todos os julgamentos relativos a impostos municipais da capital.
A estimativa do magistrado é que, devido ao aumento considerável do IPTU de alguns imóveis, é possível que aconteça uma “enxurrada” de ações revisionais do imposto, com o objetivo de barrar, mesmo que momentaneamente, o pagamento do tributo reajustado. Em alguns bairros da cidade, como o Jardim do Salso, por exemplo, o aumento chega a 168%. Há, porém, um escalonamento do reajuste — o percentual não passa de 30% no primeiro ano e de 20% nos anos seguintes, até 2025. O projeto foi aprovado em 30 de abril pela Câmara de Vereadores, mas ainda não foi sancionado pelo prefeito Nelson Marchezan Júnior.
— Em 2015, quando foi feito o fotogeoreferenciamento (que alterou o valor do IPTU de alguns imóveis) foram geradas cerca de oito mil ações judiciais. No caso de agora, o número de ações será maior. Acredito que entre 10 mil e 15 mil — projeta o juiz.
O fotogeoreferenciamento — ou aerolevantamento, como também foi chamado — foi uma iniciativa da Prefeitura ocorrida em 2014 para verificar os imóveis que foram modificados e não informados à administração municipal. A partir de imagens aéreas, visitas foram feitas para fiscalizar as áreas com indícios de modificações. Constatadas as alterações, o IPTU foi recalculado e, consequentemente, reajustado. Isso acabou gerando ações judiciais revisionais na época.
Conforme o juiz, em ações como essas, os advogados pedem inicialmente tutela antecipada para impedir o aumento e também para pagamento dos valores que consideram devido em juízo.
— A duração desses julgamentos é, em média, entre seis meses e oito meses. É feita uma perícia por perito contratado pelo juízo que avaliará o imóvel — explica o Custódio.
Caso sua projeção se confirme, o juiz avalia que haverá necessidade de aumento de servidores no cartório.
O que diz o Ministério Público
A Promotoria de Justiça da Fazenda Pública tem intervenção nessas ações e dará parecer nas ações individuais, mas não se pode adiantar o posicionamento, pois as ações ainda não chegaram a juízo.
O que diz a OAB
O presidente da Comissão Especial de Direito Tributário da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio Grande do Sul, Rafael Korff Wagner, também acredita em um número grande de ações questionando o aumento do imposto, caso a lei venha a ser sancionada.
— Entendemos que haverá uma enxurrada de ações judiciais contra o município. Um aumento muito grande da judicialização dessa questão — avalia o advogado.
Korff Wagner diz que “vai haver aumento global desse imposto (IPTU), que vai impactar a maioria dos contribuintes de Porto Alegre”.
— Esse projeto não traz só revisão, traz uma série de mudanças na legislação. Se fosse só a atualização da planta de valores, não precisaria uma lei, bastaria um decreto — pondera o advogado.
O que diz a Prefeitura de Porto Alegre
A prefeitura acredita que a opinião do juiz é uma "projeção premonitória", que não tem dados concretos para aprofundar o assunto. Confira na íntegra a manifestação da prefeitura:
As projeções premonitórias de possíveis processos contra a revisão do IPTU não são dados concretos para uma manifestação aprofundada sobre o assunto. A lei aprovada na Câmara de Vereadores sequer foi sancionada e publicada no Diário Oficial. Mesmo com o caráter estritamente especulativo da matéria, a Prefeitura de Porto Alegre reitera que a atualização da planta genérica do IPTU é um projeto que defende a justiça tributária e beneficia 1,5 milhão de cidadãos que vivem na cidade. Ele corrige uma distorção histórica em que os imóveis mais valorizados desembolsavam a mesma quantia de imposto do que propriedades em regiões periféricas. Lembrando que metade dos imóveis terão redução ou isenção imediata do imposto. Para a outra metade, o aumento será escalonado em seis anos. A Secretaria Municipal da Fazenda assegura o direito do contribuinte discordar da avaliação do IPTU e se coloca à disposição de quem quiser solicitar novo cálculo.
O que diz o Tribunal de Justiça
Até o fechamento dessa reportagem, o TJ não se manifestou.