Nem deu tempo de supor que provar cachaça era bagunça. Ao questionar o mestre alambiqueiro Rafael Lutgmeyer, ao telefone, sobre a experiência que vende no Airbnb, fui prontamente advertida:
— Não posso fazer degustação sem contar a história do Brasil — explicou, adiantando que era aconselhável aparecer com tempo.
Conforme anunciado, minha primeira hora e meia na Cachaçaria Brix 21, localizada em meio aos antiquários da Rua Marechal Floriano Peixoto, no Centro Histórico, em Porto Alegre, foi essencialmente teórica. Começou no Ciclo do Açúcar, quando os escravos que trabalhavam nas plantações de cana começaram a tomar a espuma fermentada que viria a ser a cachaça, e evoluiu para a popularização da bebida "raiz", hoje marginalizada, até chegar ao atual sistema produtivo, desde a produção em larguíssima escala (em torno de 500 milhões de litros ao ano), até os alambiques de médio e pequeno porte, alguns deles responsáveis pelos cerca de 150 rótulos de cachaças especiais (boa parte custa entre R$ 50 e R$ 200) vendidos no local que administra há cerca de cinco anos. Deu para ficar com sede.
Antes de partir para a degustação dos quatro rótulos locais, como descrito no anúncio, Rafael foi mais sucinto ao explicar como se identifica uma cachaça de qualidade:
— Quando é boa não queima, e coloca um sorriso no rosto — disse.
A cachaça é uma bebida amorosa por princípio: dela consome-se apenas o coração do processo de fermentação (a cabeça e a cauda, começo e fim desse processo, são descartados por conterem substâncias tóxicas). A ternura parece desdobrar-se para a fala de Rafael, que propaga sua paixão com superlativos: para ele, não só é a "melhor", como a bebida "mais fit" que existe — conforme ele, por se tratar de um produto feito apenas com a cana, um ingrediente natural.
De largada, serviu a mais vendida da casa, uma bebida "neutra" (armazenada em alumínio, é incolor e a mais indicada para preparar caipirinha). A ela, seguiram-se outras três envelhecidas em diferentes madeiras: amburana, carvalho e, por fim, grápia, uma madeira "perfumada, mas seca, como o gaúcho". De fato, nenhuma lembrava sequer remotamente uma cachaça de garrafa plástica. Pelo contrário. Apresentavam bom aroma, e sabor que variou entre o adocicado e o amadeirado.
A degustação contou, ainda, com um regalo da casa: duas doses (e não apenas provinhas, como as quatro primeiras) de bebidas curtidas em barris de cinco madeiras diferentes armazenados na loja. Diante de tamanha generosidade, a teoria de Rafael comprovou-se, e, além de ter conhecido um pouco melhor o lado gourmet do mundo cachaceiro, deixei o local mais sorridente do que havia chegado.
O valor cobrado pela experiência, por pessoa, é de R$ 35.