O número de recursos em primeira instância contra multas aplicadas no trânsito de Porto Alegre praticamente dobrou em apenas três anos. A quantidade de apelações contra as autuações passou de 28,9 mil em 2015 para mais de 56 mil no ano passado, em um salto de 95%. Essa disparada superou o aumento verificado no registro de multas no mesmo período. Apesar da tendência crescente de tentar evitar uma punição por parte dos motoristas, o percentual de defesas aceitas pelos julgadores foi reduzido.
Esses números contabilizam as duas etapas em que é possível recorrer contra autuações de trânsito no primeiro grau. A primeira é uma defesa prévia (quando o condutor é notificado da infração, ainda sem imposição de multa), analisada pela própria EPTC. A segunda é o recurso contra a multa propriamente dita submetido a uma Junta Administrativa de Recursos de Infrações (Jari).
Se os argumentos do condutor não forem acatados nessas etapas, ainda é possível recorrer à segunda instância: o Conselho Estadual de Trânsito (vias municipais e estaduais) ou o colegiado da Polícia Rodoviária Federal (vias federais).
O diretor-presidente interino da EPTC, Fábio Berwanger Juliano, acredita que a crise econômica experimentada nos últimos anos impulsionou o fenômeno dos recursos contra as autuações porque o ritmo superou em muito o crescimento das multas aplicadas no mesmo período. Enquanto os requerimentos de anulação dobraram, as autuações aumentaram em um terço ao longo dos mesmos três anos — mas apresentaram queda de 2017 para o ano passado.
— Quando o condutor recorre, pode receber o IPVA ou negociar o veículo mesmo sem ter pago a multa ainda. Acreditamos que isso tenha estimulado muita gente a entrar com o requerimento — analisa Juliano.
Isso poderia explicar, também, porque o percentual de recursos acatados pelos julgadores apresentou tendência inversa ao longo do mesmo período. Em 2015, 9% das defesas eram aceitas, proporção que caiu para 4% em 2018. Para se contrapor à ideia de que o índice representa alguma forma de injustiça, durante a entrevista em seu gabinete o presidente da EPTC puxa uma mala azul recheada de requerimentos a serem julgados em segunda instância (ele também é conselheiro do Cetran).
Tira três lá de dentro, aleatoriamente. Em um deles, o condutor culpa o despachante por não ter providenciado a documentação obrigatória do veículo. Um segundo diz que não obteve o mesmo tipo de documentação porque o veículo estava circulando em outro Estado. E um terceiro usa o espaço de defesa simplesmente para dizer que não concordava com a multa e, por isso, gostaria que ela fosse anulada.
— Me diz, daria para anular qualquer uma dessas multas com base nesses argumentos? — questiona Juliano.
Advogado com atuação na área de trânsito, Guilherme de Azevedo Frank concorda que, algumas vezes, motoristas recorrem apenas para adiar o pagamento da multa. Mas afirma que, em outras oportunidades, falta apenas um embasamento técnico mais adequado na defesa e isso acaba frustrando as pretensões do condutor.
— Não é obrigatório ter um advogado para recorrer, mas sem uma assistência técnica mais adequada tudo fica mais difícil — afirma Frank.
Mas, por vezes, é possível reverter a punição — ainda que o caminho possa ser tortuoso. Uma cliente do advogado, que prefere não se identificar, conta que passou a receber várias multas após ter vendido o carro sem alterar o registro no Detran. Para se livrar das infrações, foi preciso localizar o atual proprietário e, mediante uma ação judicial, celebrar um acordo para transferir o veículo e quitar as multas.
MAIS MULTAS E RECURSOS EM POA
- Recursos apresentados dobraram
2015: 28.925
2016: 31.441
2017: 43.514
2018: 56.354
Variação 2015/2018: 95% - Percentual de recursos deferidos caiu pela metade
2015: 9,2%
2016: 6,5%
2017: 7,7%
2018: 4,2%
Variação 2015/2018: -54% - Multas aplicadas cresceram um terço
2015: 435.054
2016: 563.973
2017: 584.675
2018: 570.647
Variação 2015/2018: 31%
OS ARGUMENTOS
Alegações mais frequentes em recursos aceitos (mediante apresentação de provas):
- Furto ou roubo do veículo
- Clonagem do veículo
- Prestação de socorro
- Erro cometido no preenchimento do auto de infração
Alegações mais comuns em recursos negados
- Justificativa sem apresentação de provas
- Simples negação do cometimento da infração
COMO PROCEDER
Há duas etapas em que é possível recorrer em nível de primeira instância. Veja como
DEFESA PRÉVIA
O condutor inicialmente recebe uma notificação da autuação, antes da multa propriamente dita. É possível apresentar uma espécie de defesa prévia segundo os seguintes passos básicos:
- Preencher um requerimento (disponível no site da EPTC) com dados do proprietário ou condutor indicado, razões da defesa e assinatura
- Anexar cópia da notificação, do CRLV do veículo, cópia do documento de identificação (pessoa física) ou cópia do contrato social da empresa e documento de identificação do representante legal. Se houver procurador, cópia da procuração e do documento de identificação do proprietário ou condutor indicado
- Entregar a defesa no prazo indicado na Notificação de Autuação de Infração de Trânsito na Central de Atendimento ao Cidadão da EPTC (Erico Verissimo, 100, de segunda a sexta-feira, das 9h às 16h). Deve-se levar o maior número possível de provas documentais.
RECURSO DE INFRAÇÃO
Uma vez confirmada a imposição de multa, ainda é possível recorrer. Saiba as principais etapas:
- Preencher o requerimento (disponível do site da EPTC) com dados do proprietário ou condutor indicado, razões da defesa e assinatura
- Acrescentar cópia da Notificação de Imposição de Penalidade, da Carteira de Identidade ou CNH do requerente (pessoa física) ou do contrato social da empresa, onde conste quem tem poderes para representá-la e do CRLV. Em caso de procuração, anexar ainda documento que comprove assinatura do outorgante
- O recurso deve ser encaminhado por requerimento à Central de Atendimento ao Cidadão (Erico Verissimo, 100, de segunda a sexta-feira, das 9h às 16h)
- Para pedir efeito suspensivo da multa é preciso comparecer ao protocolo da EPTC (Erico Verissimo, 5, de segunda à sexta-feira, das 9h às 16h) com os seguintes documentos:
- Requerimento com dados do requerente, número do processo de recurso de multa e assinatura (poderá ser usado requerimento padrão fornecido na Central de Atendimento ao Cidadão da EPTC)
- Cópia da Carteira de Identidade, em caso de pessoa física, ou do Contrato Social onde conste quem tem poderes para representar a empresa
- Cópia da Notificação de Imposição de Penalidade (NIP) e do protocolo do recurso.
- Procuração (para requerimento por meio de terceiro) com documento que comprove a assinatura do outorgante
ATENÇÃO
Cópias de documentos relacionados à infração (Boletim de Ocorrência de Trânsito, Auto de Infração, foto de controladores eletrônicos) podem ser solicitados na Central de Atendimento ao Cidadão da EPTC pelo proprietário, condutor indicado ou mediante procuração. Fica na Avenida Erico Verissimo, 100, e funciona de segunda a sexta das 9h às 16h.