Em abril de 1976, um grupo de mais ou menos 30 jovens, todos moradores do Partenon, em Porto Alegre, e amantes de Carnaval, decidiram fundar sua própria escola de samba. Eles sequer sabiam como fazer isso, e precisaram pedir orientação para integrantes de outras agremiações. No dia 11 daquele mês, todos os que possuíam mais de 21 anos (idade necessária para a maioridade à época) assinaram uma ata de fundação. Daí surgiu a Sociedade Beneficente Cultural Realeza.
Sem espaço físico onde ensaiar e organizar um desfile, integrantes e simpatizantes passaram a realizar eventos em uma esquina próxima de onde alguns dos fundadores moravam, entre as ruas Carlos de Laet e Carneiro Ribeiro. O local ficou conhecido como Encruzilhada do Samba.
– A gente costumava se reunir ali para conversar, fazer festa. Era uma gurizada aqui do bairro, e todo mundo sempre gostou de Carnaval. Só continuamos os encontros – conta Vera Correa Santos, 67 anos, auxiliar de enfermagem aposentada e uma das fundadoras.
O tempo passou, a escola cresceu, a comunidade se aproximou e fortaleceu ainda mais a Realeza. O que não mudou foi a forte ligação com o bairro e com os ensaios, que seguem sendo realizados na rua.
– Pode olhar por aí, o único lazer aqui da comunidade é o Carnaval. Todo mundo participa, todo mundo gosta. Os eventos são sempre abertos, e nunca aconteceu nada. Temos isso no sangue – diz Cândido Norberto Soares, 68 anos, atual presidente da escola e também fundador.
Vizinhança
Quando realizados apenas com os componentes da Realeza, os ensaios reúnem, em média, entre 400 e 500 pessoas. Quando outras escolas são convidadas, o público chega a mil pessoas. Ninguém paga nada, e a escola monta apenas uma copa. O lucro é revertido para os desfiles.
Da porta da garagem de Mauro da Silva Santos, 68 anos, casado com dona Vera, uma quadra acima da Encruzilhada do Samba, ele aponta outros vizinhos envolvidos com a escola de samba. No bar da rua em frente, ficam os troféus da agremiação. Uma casa azul logo abaixo é da costureira responsável por fantasias da escola. Integrantes da bateria estão espalhados por todo o bairro, e assim vai.
Nos dias de ensaio, todas as famílias se reúnem. Esta presença maciça da comunidade é motivo de orgulho para todos, como explica Elaine da Silva Santos, 71 anos:
– A gente se ajuda como pode, resolve problemas, também briga bastante (risos). Mas no dia do desfile está tudo resolvido, todo mundo sorrindo. É como uma família.
Futuro
A união da comunidade já atravessa gerações. Evelise Barboza da Costa, administradora, é neta de Elaine e filha de Josiane Santos Barbosa, que também cresceu na Realeza. Aos 24 anos, a jovem já fez um pouco de tudo na escola: foi passista, desfilou na bateria e em diversas alas. Atualmente, também é membro do conselho fiscal da escola.
– Tive a sorte de participar ativamente em uma época em que existia o projeto Realeza do Amanhã, que realizava oficinas de bateria e de dança para as crianças do bairro. Era tudo aqui na rua, como os ensaios. Hoje, esse movimento não é tão forte, mas existem planos de retomar – conta Evelise.
Expectativa pelo desfile
Neste ano, a Realeza está na expectativa voltar a desfilar no Porto Seco após dois anos sem mostrar seu trabalho. A escola faz parte do Grupo Prata e levará para o Carnaval o enredo Valente Guerreira, Dandara dos Palmares, a Verdadeira Princesa Brasileira.
– Em 2017, estávamos com o Carnaval pronto e não pudemos desfilar. Por isso, estamos retomando este tema – diz Vera.
A escola pretende levar para a Avenida 700 componentes e dois carros alegóricos.
– Neste ano, os carros não serão avaliados, mas vamos mostrar os que temos – explica Cândido.
A escola está com seu desfile 90% pronto. Neste sábado, haverá um mutirão no barracão, no Porto Seco, para ajustar o que falta e limpar o local.