Uma das principais apostas da prefeitura de Porto Alegre para destravar investimentos na cidade, as parcerias público-privadas (PPPs) ainda não saíram do papel após o primeiro ano de governo.
A complexidade desse tipo de contrato ajuda a explicar a demora, mas o andamento das PPPs em áreas como serviços urbanos, saúde ou ambiente também enfrenta obstáculos como falta de dinheiro, equipes técnicas reduzidas e necessidade de aprovar leis na Câmara de Vereadores. O município promete lançar três licitações de nove projetos prioritários ainda neste ano, mas a maior parte das iniciativas segue sem data para se concretizar.
Nesta sexta-feira, a primeira concorrência foi anunciada — envolvendo a Orla do Guaíba. O secretário municipal de Parcerias Estratégicas, Bruno Vanuzzi, afirma que um período de um a dois anos é considerado razoável por critérios internacionais para estudar cenários, detalhar projetos e preparar editais capazes de atrair parceiros privados e, ao mesmo tempo, garantir o investimento necessário.
— Não tem PPP estruturada em menos de 12 meses. Considerando que o primeiro semestre do ano passado foi de diagnóstico, as coisas estão evoluindo a contento — sustenta Vanuzzi.
Além da orla, os estudos para parcerias envolvendo iluminação pública e mobiliário urbano, incluindo os relógios de rua, são os mais adiantados. A previsão da prefeitura é que as concorrências saiam ainda em 2018. O Centro de Eventos e o setor de resíduos sólidos (coleta de lixo) podem ser licitados entre o final deste ano e 2019. As demais iniciativas — Hospital Presidente Vargas, Mercado Público, Parques e praças e Saneamento — não têm previsão confirmada.
O integrante da consultoria KPMG Charles Schramm, que chefiou a unidade de PPP do governo gaúcho entre 2008 e 2011, considera que um ano é um prazo aceitável para desenhar os planos:
— No primeiro ano, se formam equipes, delegam responsabilidades e se vai atrás dos projetos propriamente ditos, buscando consultorias. É melhor preparar bem, ainda que demore um pouco mais, e depois conduzir o processo sem parar.
Mas o andamento das iniciativas em Porto Alegre enfrenta desafios para deslanchar. Nem todos os projetos andam no mesmo ritmo — e alguns poderão demorar mais do que o desejado — por uma série de razões. Uma delas é a falta de recursos. O plano envolvendo a instalação do Hospital Presidente Vargas, por exemplo, está sob reavaliação devido à penúria do orçamento municipal — já que, pelo modelo previsto de PPP, a prefeitura teria de repassar recursos para a operação do estabelecimento.
Outro entrave é o tamanho modesto da equipe técnica que elabora os projetos no município. São nove profissionais — quatro deles concentrados no processo de iluminação pública.
— Temos uma equipe enxuta, então temos temos uma fila. Não podemos abordar todas (as PPPs) ao mesmo tempo, na mesma velocidade. Mas nem devemos crescer muito para termos garantia da qualidade da equipe — avalia Vanuzzi.
Outras iniciativa dependem da tramitação de projetos na Câmara, como a do Saneamento, a fim de viabilizar a concessão. Outra questão é se parcerias desse tipo são viáveis em um cenário de crise econômica nos setores público e privado.
— Falta segurança jurídica, certeza de que os contratos serão cumpridos. A prefeitura tem se caracterizado pelo descumprimento de pagamentos — avalia o doutor em Direito e especialista em Direito Econômico Ricardo Giuliani.
Giuliani acredita, ainda, que faltam bons exemplos de PPPs no Estado por uma questão de mentalidade:
— Temos uma mentalidade atrasada, com dificuldade de aceitar que nem tudo o que é público precisa ser estatal. Por isso, temos o menor índice de estradas duplicadas do Sul.
Vanuzzi argumenta que cada contrato oferecerá garantias financeiras adequadas, que poderá ser por meio de um tributo específico, como no caso da iluminação pública, tarifa (saneamento) ou recursos próprios (mobiliário). Schramm acredita que nem a crise ou uma eventual insegurança jurídica inviabilizará os investimentos, desde que sejam bem planejados e ofereçam garantias financeiras aos investidores:
— O que ocorre é uma readequação. Em vez de projetos enormes, passamos a falar em projetos mais modestos. Algumas iniciativas, como a da iluminação pública, são mais fáceis de dar garantias porque há um tributo vinculado.
O presidente da Polo RS e da Agenda 2020, Humberto Busnello, avalia que a confusão entre PPPs e privatizações também ajuda a inibir iniciativas desse tipo no Estado. Mas, segundo Busnello, Porto Alegre não tem outro caminho a seguir dada a capacidade reduzida de investir por conta própria:
— Não vejo outra solução, principalmente em áreas como saneamento, onde temos um grande déficit a sanar.
O ANDAMENTO DOS PROJETOS
Para uma parceria público-privada ser firmada, é preciso que o governo crie um projeto e abra uma concorrência para selecionar empresas que desejem atuar junto ao governo. Veja qual a situação de cada uma prioridades definidas da prefeitura
ILUMINAÇÃO PÚBLICA
Prestação de serviços de iluminação pública, incluindo desenvolvimento, modernização tecnológica, ampliação, maior eficiência energética, operação e manutenção da rede municipal.
Estágio
Foram definidos na semana passada, com apoio do BNDES, seis cenários possíveis de parceria, com diferentes prazos de investimento, tempo de contrato, entre outras variáveis agora sob análise da prefeitura. Os próximos passos devem ser a elaboração de outros documentos como matriz de risco, minutas de contrato e de edital.
Previsão de licitação
Segundo semestre de 2018.
PARQUE DA ORLA DO GUAÍBA
Parceria com o setor privado para a gestão, manutenção e conservação do parque localizado nas imediações da zona central de Porto Alegre.
Estágio
Foi lançada na sexta-feira, licitação para as permissões dos quatro bares e de um restaurante. Na última semana de março, segundo a prefeitura, deve sair o resultado. A expectativa é de que, no máximo até dois meses depois da inauguração da orla, os empreendimentos entrem em funcionamento. Em relação à adoção do parque como um todo, há negociações em andamento, mas nada concreto até o momento.
Previsão de licitação
A licitação para os bares e o restaurante foi lançada na sexta-feira. Para a gestão do parque, não há previsão.
HOSPITAL MATERNO-INFANTIL PRESIDENTE VARGAS
Parceria para construção, fornecimento de equipamentos, operação e manutenção de um novo hospital a ser erguido em outra localidade.
Estágio
O projeto está parado, passando por reavaliação. Segundo a Secretaria de Parcerias Estratégicas, o fracasso da tentativa de atualizar a planta de valores do IPTU no ano passado, o que reduziu as projeções de recursos municipais, exige uma reformulação dos planos iniciais. O cenário dessa PPP é menos favorável do que a da iluminação pública, por exemplo, porque não conta com recursos carimbados (como o da contribuição de iluminação pública) e depende do orçamento geral da cidade.
Previsão de licitação
Indefinido.
MERCADO PÚBLICO
Parceria com o setor privado para operação e manutenção do Mercado Público Municipal, com possibilidade de construção de estacionamento anexo.
Estágio
Foi concluído um termo de referência para um procedimento de manifestação de interesse _ processo no qual a sociedade pode apresentar sugestões de modelos de gestão para o Mercado. Esse termo deve ser lançado nos próximos dias, mas ainda não serve para escolher quem vai gerir o local. Segundo a prefeitura, também estão sendo realizados debates com os permissionários, que gostariam de assumir a gestão do Mercado.
Previsão de licitação
Indefinido
MOBILIÁRIO URBANO
Instalação, operação e manutenção do mobiliário urbano de Porto Alegre, composto por relógios eletrônicos digitais, abrigos de ônibus e placas de rua.
Estágio
Foi concluída, há cerca de uma semana, uma consulta pública sobre essa área. Cidadãos e empresas apresentaram sugestões que estão sendo analisadas _ com cerca de 70% desse trabalho concluído. No começo de março, devem ser divulgadas as propostas apresentadas e a resposta da prefeitura a cada uma delas.
Previsão de licitação
Final de março/2018 para os relógios de rua. Depois, deverão ser contempladas as placas de rua.
CENTRO DE EVENTOS
Construção, gestão, planejamento, implantação, operação e promoção de Centro de Eventos visando à realização de eventos e instalação de equipamentos de apoio.
Estágio
Já foram garantidos R$ 60 milhões do governo federal para o empreendimento. Foi elaborado um termo de referência para contratação de projetos arquitetônicos, e a prefeitura vem debatendo com entidades como Convention Bureau, Sindicato de Hospedagem e Associação Comercial de POA o melhor modelo de centro de eventos a ser adotado.
Previsão de licitação
Em até 30 dias, lançamento da concorrência para elaborar o projeto. Com ele pronto, a licitação da obra poderia sair ainda em 2018, mas não é garantido.
PARQUES E PRAÇAS
Projetos para adoção ou concessão que contemplam melhorias e manutenção de equipamentos. Há oito parques e 635 praças disponíveis para parceria com diferentes tamanhos e localizações.
Estágio
O município pretende aprovar, na Câmara de Vereadores, mudanças na legislação que trata da adoção de áreas verdes para modernizá-la e facilitar intervenções como revitalizações. Atualmente, o modelo é calcado no conceito de adoção, que privilegia a manutenção do espaço. A prefeitura também trabalha em um projeto de lei para permitir a gestão integrada dos ativos de um parque (diferentes empreendimentos localizados em uma área, como bares, poderiam ser geridos de maneira unificada, e não como contratos separados, por exemplo).
Previsão de licitação
Indefinido
SANEAMENTO
Investimentos, operação e manutenção das redes de esgoto, a fim de obter a universalização dos serviços de saneamento.
Estágio
Um projeto de emenda à Lei Orgânica está na Câmara de Vereadores, desde o ano passado, para permitir a concessão dos serviços de esgoto. A prefeitura encaminhou ofício assegurando que a possibilidade de parceria com a iniciativa privada contempla apenas o sistema de esgoto, e não o tratamento ou distribuição de água. O avanço do plano depende da aprovação das mudanças na Câmara.
Previsão de licitação
Indefinido
RESÍDUOS SÓLIDOS
Concessão administrativa para prestação de serviço público de gestão de resíduos sólidos provenientes da limpeza urbana, com objetivo de maximizar o reaproveitamento e a reciclagem.
Estágio
A prefeitura vem alinhavando, com o Ministério do Planejamento e a Caixa Econômica Federal, um projeto-piloto de PPP ou concessão. Em março, deverá ser assinado um contrato de consultoria com a Caixa e o governo federal para elaboração de diferentes cenários de parceria _ a exemplo do que já foi feito na área de iluminação pública. Depois da escolha de um modelo, deverá ser encaminhado o processo de licitação.
Previsão de licitação
Entre o final de 2018 e o primeiro trimestre de 2019.