Fachada pichada, passeio irregular e grama que chega à altura do joelho são o cartão de visitas da Biblioteca Pública Professor Romano Reif, na Vila do IAPI, em Porto Alegre. Entrando no prédio de responsabilidade do Estado, o cenário não melhora: há manchas de infiltração no teto, lonas pretas protegem livros para não molhar, o chão é desnivelado e tem rachaduras nas paredes. A água escorre sem parar na pia do banheiro, que ainda tem o esgoto entupido. Para completar, o prédio está sem telefone e sem internet há semanas.
A biblioteca localizada no Largo da Bandeira vinha apresentando problemas estruturais e, há pouco mais de dois meses, a situação degringolou. Em um temporal, o prédio foi parcialmente destelhado — segundo a coordenação, galhos de uma falsa seringueira que fica ao lado atingiram o telhado. Um computador foi danificado, e centenas de livros molharam. Em dias de chuva, pelo menos meia dúzia de baldes são espalhados pela biblioteca para reter a água das goteiras.
Com pedido de poda feito há mais de um ano, segundo a coordenação, a falsa seringueira também seria a responsável pelo desnível no chão, formando "ondas" — acredita-se que é em razão das raízes da árvore. Um cartaz colocado por moradores no prédio, relacionando os problemas e pedindo "SOS biblioteca", foi retirado pouco antes da chegada de GaúchaZH ao local na última sexta-feira (24).
A biblioteca tem usuários de vários bairros e até de outras cidades da Região Metropolitana. Frequentadora há 20 anos, a educadora física Luciana Samaniego, 43 anos, apaixonada pelas obras antigas do acervo, está desolada:
— Eu tenho um carinho muito grande pela biblioteca. É muito triste saber que livros estão sendo perdidos e que as pessoas não vão poder usar, não vão poder descobrir leituras tão prazerosas.
Os problemas da Professor Romano Reif foram tratados no começo de novembro pelo colunista David Coimbra em GaúchaZH. Antigo morador do IAPI, o jornalista lembrou que a biblioteca "nasceu no ventre de pedra dos blocos de edifícios da Coorigha" e foi mantida pelos moradores do condomínio, até ser incorporada pelo poder público e transferida para a Avenida Industriários. David usou o exemplo da biblioteca para comprovar a tese de que Porto Alegre, tida como cidade mais culta do Brasil, "vem recuando em direção às trevas".
Esse é também um dos temores de Luciana.
— Há um descaso do poder público, com a cultura. Acho que os governantes não se preocupam com a leitura da população, com o direito da população de ter informação. Isso me preocupa, porque acho que biblioteca tem que ser um lugar pra todos — ressalta a educadora física.
O QUE DIZEM O ESTADO E A PREFEITURA
GaúchaZH fez uma série de questionamentos à Secretaria Estadual da Cultura, Turismo, Esporte e Lazer (Sedactel), responsável pela biblioteca, a respeito das origens e gravidade dos problemas e se serão tomadas providências. A pasta respondeu por meio de nota, informando que encaminhou em regime de urgência à Secretaria Estadual de Obras, Saneamento e Habitação, na segunda-feira (27), o pedido de execução de um laudo técnico de inspeção predial, que vai atestar as condições de segurança e estabilidade da edificação. "A medida se faz necessária visando agilizar as providências cabíveis para assegurar a segurança dos frequentadores e servidores no local", diz a nota.
A respeito da capina do Largo da Bandeira, a prefeitura de Porto Alegre informou por meio da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos que a última intervenção foi em agosto e que serviço deveria ser realizado novamente antes do final do ano, segundo o cronograma, mas o município está sem contrato para o serviço.
A pasta também respondeu sobre a árvore ao lado da biblioteca: informou que os técnicos foram ao local e constataram que não há galhos, folhas ou estruturas que representem risco de queda. Afirmou, também, que os galhos da planta não afetam ou interferem no conserto do telhado, que foi danificado por algum outro vegetal do entorno, em um dia de vento forte. "Levando em consideração não se tratar de um caso de risco/emergência, foi programada, para a próxima semana, a poda de retirada e diminuição de galhos pendentes, reduzindo risco de novas ocorrências de árvores do entorno", informou a secretaria.