Diante do anúncio de inauguração de uma megacasa de entretenimento com 460 máquinas caça-níqueis no bairro Cavalhada, na zona sul de Porto Alegre, autoridades gaúchas advertem: o jogo de azar segue proibido no Brasil.
A empresa, que estima abrir oito empreendimentos semelhantes na Capital, defende a atividade sob o argumento de que o jogo deixou de ser ilegal, mas a Polícia Civil e o Ministério Público asseguram exatamente o contrário.
— Quem lança um negócio assim está correndo risco. Se a casa abrir, e constatada a exploração de jogo de azar, estará sujeita a todas as medidas cíveis, criminais e administrativas aplicadas a qualquer estabelecimento como bingos, que vêm sendo fechados — afirma João Pedro de Freitas Xavier, promotor assessor da Procuradoria de Recursos do Ministério Público (MP) do Rio Grande do Sul.
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A promessa de abertura da casa levou a Procuradoria-Geral de Justiça e a Polícia Civil a estudarem medidas. O chefe de Polícia, delegado Emerson Wendt, lembra que a corporação tem atuado sistematicamente contra bingos e cassinos clandestinos com a Operação Vegas.
— Não temos poder para interromper a obra, mas estamos atentos. Se a casa abrir, vamos fiscalizar o local para verificar se há exploração de jogos de azar — disse.
A empresa responsável pela casa de jogos baseia-se em decisões da Turma Recursal Criminal dos Juizados Especiais Criminais do Judiciário gaúcho a qual tem absolvido réus condenados em primeiro grau por exploração de jogos de azar. O entendimento tem sido de que o jogo não caracteriza conduta ilícita e a que penalização seria inconstitucional.
Segundo Xavier, mais de uma centena de pessoas que respondiam por esse tipo de contravenção foi inocentada no RS nos últimos 18 meses. Em todos os casos, o MP recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF):
— Inicialmente, não tivemos êxito. Mas, a partir de uma decisão do ministro Luiz Edson Fachin, a maioria das absolvições foi revertida e os réus foram condenados.
O promotor lembra que Fachin acolheu recurso do MP gaúcho, afirmando que o jogo é nocivo à saúde pública, pois pode levar à compulsão, além de, em muitos casos, estar ligado a crimes como lavagem de dinheiro, associação criminosa e até tráfico de drogas.
— Tem vários processos de condenação, com pessoas presas no Rio Grande do Sul condenadas por jogo de azar e esses crimes conexos — garante Freitas Xavier.
Em outubro de 2016, um recurso do MP chegou ao STF e tem como relator o ministro Luiz Fux. Os ministros reconheceram a repercussão geral, e o plenário do STF decidirá se o jogo de azar é ou não conduta ilícita. O resultado valerá como regra para todo o país, mas ainda não há data marcada para o julgamento.
Laerte Luis Gschwenter, advogado da empresa, afirma que, após recursos do Ministério Público, a Suprema Corte manteve a decisão dos acórdãos gaúchos.
— Desde maio de 2016, temos a mudança de orientação, onde o objeto contravencional passou a ser considerado fato atípico — diz ele.
O advogado ainda questiona as autoridades:
— No estado de segurança pública que vivemos hoje, batendo todos os recordes de criminalidade, com crimes violentos contra a vida e contra o patrimônio, tráfico de drogas, registros de facções em todos os níveis, mais a situação do sistema prisional, e o MP vai parar para discutir, a polícia vai priorizar, combater isso? Essa pergunta eles têm que responder para a sociedade gaúcha.
O que diz a legislação
A Lei das Contravenções Penais, de 3 de outubro de 1941, prevê no artigo 50 que a exploração de jogo de azar em lugar público ou acessível ao público é punida com prisão simples de três meses a um ano e multa (atualizada pela lei 13.155/2015) que varia de R$ 2 mil a R$ 200 mil.