Como predadores rondando a presa, mais de 50 homens e mulheres caminham em círculos, olhos nos olhos. Passa das 22h na noite gelada de quarta-feira, 29 de junho, mas ninguém se importa com a temperatura no galpão isolado no Cantagalo, área rural de Viamão. Ligados em uma energia de raiva, alguns já atiram peças de roupa longe.
— Trouxa!
— Babaca!
— Metidinho de merda!
O vocabulário de provocações fica cada vez mais chulo enquanto aqueles homens e mulheres batem forte os pés no chão de madeira. De uma hora para outra, explodem: ao som de uma trilha eletrônica chamada Return to hell (retorno ao inferno), começam a berrar ofensas para a pessoa que para mais perto. Gritam o mais alto que podem, com o rosto vermelho e veias saltando do pescoço. Pela manhã, eu havia conhecido uma professora de yoga com 22 anos e cabelo dreadlock, um poço de calma. Agora ela está ali, disputando de igual para igual aquele duelo de gritos e saliva, durante meia hora.
A cena faz parte de um dos exercícios realizados para buscar autoconhecimento e viver em harmonia na Comunidade Osho Rachana, no limite de Viamão com a zona sul de Porto Alegre. Intitulado "Eu te odeio, eu te amo", marca o início da meditação Awareness Understanding Meditation (AUM: "Consciência, Compreensão e Meditação"). É uma faxina emocional. O objetivo é colocar todo o lixo que há dentro de si para fora e depois abraçar os amigos da comunidade, pedir perdão e se reconciliar.
— É que nem no mundo das crianças: elas brigam e depois vão lá e se abraçam, porque precisam umas das outras pra brincar — explica Prem Milan, 60 anos, terapeuta de bioenergética, um dos fundadores e líder da Osho Rachana, onde moram 70 pessoas.
As coisas são intensas na comunidade: as meditações, os relacionamentos — e a franqueza aplicada a eles —, os abraços, a sexualidade. São funcionários públicos, professores, músicos, dentistas, engenheiros, programadores, estudantes, massoterapeutas e terapeutas, brasileiros e estrangeiros da Suíça, Espanha, Alemanha e Portugal que decidiram se isolar geograficamente, mas não vivem apartados da sociedade. Depois de um café da manhã coletivo em uma grande mesa, boa parte deles encara uma hora diária de viagem para trabalhar na área central de Porto Alegre. No final do dia, voltam para o sítio de 42 hectares ladeado por estradas de chão, onde só há sinal de uma operadora telefônica e a internet chegou apenas em 2015.
O nome da comunidade celebra Osho (1931-1990), para quem a verdade só é conhecida no silêncio meditativo. O mestre indiano, apelidado de "guru do sexo", defendia que "o orgasmo sexual oferece o primeiro vislumbre da meditação". Sua imagem está por todo lugar, do refeitório ao galpão de atividades. Com sua longa barba grisalha, ele vigia até quem senta na privada, junto à mensagem "ser natural é a única espiritualidade". Mas ele também era afeito a bens materiais: tinha uma polêmica coleção de 93 Rolls-Royces.
Os moradores da comunidade não se consideram seguidores do Osho — "O guru não ditou regras para serem seguidas", afirma Milan. Eles dizem se identificar com as reflexões e buscam utilizar suas ferramentas. Também adotam novos nomes em sânscrito, como os que o guru dava. Este novo nome, o sannyas (palavra que em híndi significa renúncia), estabelece uma certa ruptura com o passado e pode simbolizar uma busca.
— Se tu me chama de Amanda, é totalmente estranho para mim — diz a terapeuta de bioenergética Anand Punya, nome que significa "êxtase sagrado".
Ela usa Amanda em situações burocráticas, pois não registrou a mudança em cartório, e também segue sendo Amanda para a avó. No Facebook, é Punya Amanda, para não confundir totalmente os amigos de adolescência. Filha de Prem Milan ("união de amor"), Punya, 31 anos, conta que recebeu o sannyas do próprio Osho aos três anos, mas só o adotou definitivamente aos 17. Quando seu pai resolveu mandar uma carta para Pune, na Índia, solicitando um nome em sânscrito, ela também quis o dela. Normalmente, os interessados respondiam algumas perguntas. Punya ainda não sabia escrever, então mandou um desenho — não lembra ao certo como era, mas sabe que esboçou um sol.
Hoje, os próprios moradores criam sannyas para os novatos. Eles buscam "sentir a onda" da pessoa para achar um nome que seja também uma referência para ela. Eu cheguei ao sítio apenas Jéssica Rebeca Weber e me despedi conhecida como Prem Satyam, que significa amor verdadeiro.
Taxa de R$ 1.270 paga casa, luz, água e comida
Na comunidade, há oito casas — prioritárias para moradores com filhos — e dois dormitórios adultos. O maior dos dormitórios, a Casa de Estudante, tem 24 bedspaces, espaços onde cabe basicamente um colchão de casal, delimitados por cortinas na frente e nos dois lados. Banheiros e chuveiros são compartilhados por homens e mulheres.
A produtora audiovisual Cibele Toledo, 42 anos, na casa conhecida por Prem Fulwari ("amor e contentamento no jardim das flores"), é dona de um bedspace impecável. Atrás da cortina enfeitada com a imagem da divindade indiana Krishna, tem uma cama arrumada, seis almofadas simetricamente dispostas, a estatueta de um buda, um quartzo rosa e uma ametista — "para dar uma purificada". Enquanto lia as cartas do tarô para o fotógrafo, contou que não estranha os banhos coletivos — como no início achou que estranharia — e também não se incomoda com o som de gente transando nos bedspaces ao lado.
— Eu não sei viver sozinha. Aqui, para pegar um pano de chão, vão duas pessoas — diz Fulwari.
O sítio é uma grande fazenda, com horta orgânica, vários pés de laranja e bergamota, criação de coelhos, porcos e galinhas. Mas também parece um complexo hoteleiro: tem sauna, piscina, lago com tobogã, ateliê, ofurô, campos de futebol e de vôlei, estúdio de música, um salão de jogos (batizado de Maluco Beleza), um salão de festas e até pista de autorama. Um dos espaços apreciados é o "deck do morro", um tablado com o mosaico de um símbolo chinês, o Yin Yang, de onde é possível ver o bairro Lami e o Guaíba em dias de tempo bom. O autônomo Prem Dhirendra ("amor do lorde dos bravos"), 29 anos, vai lá para "desopilar":
— Dá uma sensação de tranquilidade e de liberdade. Na comunidade, eu me sinto muito livre, muito à vontade para fazer o que eu quiser.
Está sendo construído um novo prédio para os adolescentes, que terá capacidade para até 20 pessoas. Mas de onde vem a verba para essa infraestrutura toda? Como eles se sustentam? De acordo com Milan, o dinheiro provém de eventos realizados na Osho Rachana, rifas e ações como um leilão de quadros doados pelos moradores. As contas, como comida, luz e água, eles dividem, pagando uma mensalidade de R$ 1.270 (que inclui o "aluguel").
A comunidade tem faxineira e funcionários que lavam a roupa e auxiliam nas atividades de agropecuária, mas cada morador precisa dedicar oito horas da semana em mutirões de trabalho — quando cortam a grama, pintam paredes, cuidam da horta. Na manhã de sexta-feira, 1º de julho, o engenheiro civil Matias Bersch, lá chamado de Prem Vikrant (que remete a "bravura do amor"), 37 anos, dedicou-se a tirar o inço que cresceu entre os pés de brócolis e couve-flor plantados há cinco semanas.
— Eu trabalho muito na frente do computador, e a terra proporciona outra energia — diz.
Na cozinha, também tem sempre um batalhão trabalhando para alimentar algumas dezenas de famintos. É preciso começar às 8h para servir o almoço ao meio-dia.
— Se não fosse para eles, eu certamente não faria isso — diz Deva Anubhava, 43 anos, que no seu dia de chef preparava feijão com abóbora, refogado de cenoura e arroz integral.
Anubhava diz isso porque nunca foi cozinheira profissional. Hoje é terapeuta de bioenergética, após ser, até os 32 anos, atriz — "mundo onde era tudo muito fake, exatamente o oposto daqui". Embora seja difícil fazer comida para mais de 50 pessoas, diz que o trabalho não é oneroso, pois é feito em grupo.
— É um bom momento para tocar a conversa que durante o dia não dá tempo. Cortando os legumes e perguntando: como está o relacionamento? E a sexualidade? — comenta Anubhava.
A comunidade ainda faz pão, queijo, doce de leite e até uma linha de produtos de limpeza e higiene pessoal biodegradáveis. Os produtos da marca Alquimia do Amor ganharam outros nomes: o amaciante é Fofura, o desodorante se chama Chega Mais e o repelente, Quero Paz. Os moradores são os modelos que ilustram os rótulos diferenciados.
Do lado do refeitório, há um jardim com um deck, um pequeno lago e a imagem de um Buda, em um espaço que lembra o episódio mais triste dos 11 anos da Osho Rachana. Uma placa suspensa informa que a área se chama Jardim da Meeta, ou Jardim da Amizade, sannyas de uma moradora que morreu em um assalto na comunidade há uma década. Um homem entrou no sítio e atirou em Meeta, que cuidava do pagamento dos operários que trabalhavam na construção de um dormitório. Não foi a única vez que a criminalidade atingiu o Cantagalo. No ano passado, bandidos renderam os moradores no refeitório e fizeram a limpa: levaram dinheiro, roupa e 27 notebooks, diz Milan.
Romances abertos e sexo sem tabu
Milan gosta de falar que a comunidade é um espaço onde é possível se descobrir como ser humano, onde as pessoas podem resgatar a capacidade de amar e a capacidade sexual, "que é a maior fonte de alegria e prazer". Por meio da bioenergética (técnica corporal que é a especialidade de Milan, fundador do centro de terapia Namastê, na Cidade Baixa), são tiradas algumas travas e barreiras para o sexo, e ninguém na comunidade trata como tabu o que se faz entre quatro paredes — ou três cortinas.
— Sabe por que o Osho fala que é fundamental você transar? Porque o único jeito de se iluminar é quando você está tão preenchido com a sexualidade que você não tem nem mais fome. Vai além. Senão você vai estar sempre preso ao sexo — diz Milan.
A maior parte dos relacionamentos cultivados na comunidade é aberta. Os casais não dormem na mesma casa ou dormitório "para não virarem carrapatos" e são confrontados pelo grupo quando ficam muito tempo grudados. A artesã Prem Indali ("amor poderoso"), 28 anos, e o programador Jeevan Amrit ("néctar de vida"), 29, tiveram alguns feedbacks negativos no começo do namoro por causa disso. Relutaram contra as críticas dos amigos, em uma sensação de "estão indo contra o nosso amor". Mas agora avaliam que colocar toda a expectativa da sua felicidade nas costas do outro não é uma prática saudável, e sim uma "sugação".
— Quando a gente está muito grudado, a gente não fica bonito, não tem energia para buscar outras coisas. Fica um casal chato — disse Indali enquanto fazia na varanda da casa de estudante um kokedama: jardim suspenso usando terra preta, argila, musgo e algumas folhagens que ela achou no mato.
Há quase um ano juntos, eles não negam que existem dificuldades ao manter um relacionamento aberto, mas estão certos de que o amor pode crescer mais desta forma.
— Vamos supor que eu encontre uma outra pessoa. Se eu reprimir o sentimento, vou culpar ele (Jeevan) por não ter vivido isso, por não ter tido essa experiência — argumenta Indali.
Lavação de roupa suja
A reunião das quartas-feiras da Comunidade Osho Rachana pode começar de um jeito semelhante às que ocorrem no seu condomínio ou na escola do seu filho. São levantados os erros na realização da festa junina, fala-se sobre a realização de uma peça de teatro, reclama-se da bagunça no dormitório. Só que a etapa seguinte é muito mais quente. Sentados no chão, formando um grande círculo no galpão de meditações, os moradores apontam, na frente de todo o grupo, o que lhes incomodou nos outros durante a semana. Os feedbacks são assim:
— Tô puta contigo, não cai a ficha da tua carência.
— Fiquei de cara que tu começou a namorar, engordou e está se atrolhando!
— Tua energia tá uma bosta, tu tá um morto apagado!
— Tu é muito venenosa!
— Eu dormi do lado de vocês, e tua transa foi só uma descarga de raiva!
O único sentado em poltrona, com seu inseparável cigarro eletrônico à mão, Prem Milan interrompia bruscamente quem tentava responder às acusações: os feedbacks servem para serem ouvidos e assimilados. O líder tem um jeito truculento às vezes, não se acanha de falar o que pensa, mas não deu feedbacks. Também não foi alvo de reclamação.
Milan destaca que atritos e irritação vêm à tona em qualquer relação — ainda mais quando ela tem 70 integrantes. O grupo acredita que os relacionamentos precisam ser constantemente limpos, pois mágoas e ressentimentos impedem que se tornem profundos.
Foi após essa reunião, com os ânimos aflorados, que Milan conduziu os moradores ao exercício meditativo "Eu te odeio, eu te amo", descrito no começo da reportagem. Depois de meia hora para colocar a raiva para fora com gritos e xingamentos, os moradores se lançaram ao chão em um choro uníssono de lamento. Por mais meia hora, abraçaram-se e pediram perdão. Os abraços na comunidade duram muito, mais de meio minuto, e as pessoas não buscam afastar o corpo ou dar logo um fim com uns tapinhas nas costas. A portuguesa Anand Chaitanya ("êxtase da consciência"), 41 anos, admite que, antigamente, não sabia abraçar:
— Tinha dificuldade de sentir meu corpo, o corpo da outra pessoa. Eu não fui criada para isso.
Depois do exercício, a estudante Gyan Vanmalli ("sabedoria da flor selvagem"), 22 anos, estava visivelmente exausta. Mas se dizia também mais esclarecida:
— Consigo me enxergar mais, enxergar também meus amigos.
O sítio foi comprado por nove amigos em 1991, em uma proposta que incluía "apartamento, moto, cachorro e a promessa de pagar", lembra Milan. Há 11 anos, tornou-se uma comunidade, com o modelo copiado da Humaniversity, comunidade do Osho na Holanda. E depois foi completamente modificado, pois era rígido demais — algumas regras se mantiveram, como a proibição do uso de drogas.
Ingressar na comunidade não é para todos. O interessado precisa ter realizado trabalhos terapêuticos antes, e o centro de meditação e terapia Namastê é o canal. Além do mais, os moradores precisam ver se a pessoa se encaixa no espírito do grupo — "Xaropão não entra", define Milan.
O nome escolhido para a comunidade, Rachana, significa criação em sânscrito. Combina com a relação de moradores artistas ou inclinados a alguma vocação — dois CDs já foram gravados no estúdio de música do sítio. A espanhola Jemima Fuentes, 41 anos, é quem mais utiliza o ateliê. Ela trabalha com acrílico em tela, e no momento está pintando os pés do Osho, o guru que usava chinelos com meias. Jemima chegou a estudar conservação e restauração pictórica em Barcelona, mas foi na comunidade, mais de 10 anos depois, que se tornou artista plástica.
— Eu morei na Holanda, na Austrália, na Tailândia, na Inglaterra. Viajei muito, um pouco como uma fuga e um pouco como uma procura. Durante esse tempo, parei totalmente de pintar e de desenhar, eu estava bloqueada. Mas retomei em uma gincana de final de ano na comunidade, quando eu deixava de fazer outras coisas para poder criar — diz a espanhola, que ficou sabendo da Osho na Humaniversity, onde conheceu Milan (lembra que ele tirou para ela a carta do amor no tarô).
A entrevista com Jemima foi interrompida algumas vezes por Caetano, quatro anos, que pedia pincéis emprestados para brincar com Mel, cinco, Catarina e Vitória, ambas de três anos – há 11 crianças e adolescentes morando na Osho Rachana. Aos cuidados do geógrafo Bodhi Naveen, 32 anos, os pequenos haviam acabado de ensaiar uma música para o sarau do final de semana: escolheram cantar Sociedade Alternativa, de Raul Seixas.
Naveen se chamava André Fernandes de Caldas, tinha recém se formado e montado uma casa na Zona Sul do Rio de Janeiro. Namorava e sabia que os próximos passos seriam casar e constituir família. Mas não conseguia achar graça nisso tudo.
— Por mais corridas que eu desse na lagoa ou fosse à praia de manhã cedo, isso não era muito vida, não tinha muita troca — diz.
Após passar um tempo viajando nos finais de semana para o Rio Grande do Sul, Naveen mudou-se para o sítio gaúcho e se descobriu como educador infantil dos filhos dos amigos. Estava acostumado com uma família pequena — ele, a mãe e a avó — e considera a vida no Osho um "constante desafio".
— É difícil quebrar essa solidão que a gente carrega dentro de si, que é muito desse formato que a gente vive: cada um no seu quadrado. Eu tive que me adaptar, deixar de sentir vergonha do que eu ia dizer, aprender a me colocar. Quando eu ouvia um não, tinha tendência de fazer as coisas sozinho, e não pode ser assim — conta.
Meditações para o povo do ocidente
Os moradores praticam meditações ativas, criadas por Osho para o "povo do Ocidente", segundo Anand Punya. São pensadas para gente que não consegue ficar sentada imóvel e meditar, enquanto passam pela cabeça a briga com o marido, a lista do supermercado, o tema das crianças. A ideia é mexer o corpo e extravasar os sentimentos: pular, correr, dançar, rir, chorar, gritar para só então chegar ao estágio de meditação. Há três meditações lá.
Dinâmica
Antidepressiva, a meditação matinal tem cinco estágios, que levam pelo menos 10 minutos. Primeiro, os praticantes respiram freneticamente pelo nariz para desorganizar o cérebro. Então inicia-se a catarse — deve-se berrar, xingar e "colocar todo o lixo para fora". O "Hoo" é o estágio de centramento: a pessoa pula sem sair do lugar com os braços para cima repetindo esse mantra. Depois, passa 15 minutos imóvel e em silêncio, Em seguida, dança livremente por outros 15 minutos.
Mandala
Com quatro estágios de 15 minutos, serve para ajudar a pessoa a desenvolver foco e concretizar seus objetivos. Primeiro o praticante corre sem sair do lugar, levantando os joelhos o mais rápido que puder. Então senta, fazendo movimentos rotatórios com o corpo, da cintura para cima, e se deita de costas girando os olhos na direção horária.
Kundalini
Traz equilíbrio para a sexualidade. Começa com a vibração do corpo, dos pés ao topo. É necessário se soltar e deixar todo o corpo chacoalhar. Depois de sentar em silêncio por alguns minutos, a pessoa deita para relaxar, com os olhos fechados.
Universos paralelos
Grande parte dos moradores da Osho Rachana vive uma espécie de dupla identidade: usa seu nome em sânscrito na comunidade, enquanto segue sendo chamado pelo da certidão de nascimento no trabalho e na família — que em muitos casos condena a mudança no estilo de vida. Na Osho Rachana, Gabriel Gonzáles de Oliveira, 34 anos, é Prem Baldev ("amor forte"), mas é Gabriel ou Gonzáles no Tribunal Regional do Trabalho. Embora tenha recebido seu nome em sânscrito há um ano e meio, o bacharel em Direito já se identifica mais com ele do que com o que está na sua carteira de identidade.
Em 1º de julho, o dia dele incluiu trabalhar na horta da comunidade, dar uma mão na cozinha fritando peixe e depois partir para o tribunal no bairro Praia de Belas, onde faria minutas de sentenças.
— O contraste é muito grande, mas a gente vai equalizando a diferença — diz Gabriel, que às vezes volta com um quê formal à comunidade e leva um tempo para se soltar novamente.
Gabriel gosta do seu trabalho no Tribunal do Trabalho, onde atua desde os 18 anos, mas tem descoberto outros ramos que o deixam feliz — está fazendo curso de formação em bioenergética. Acabou desistindo dos concursos para se tornar juiz, embora tenha ficado a um ponto de passar. Filho de advogado, conta que os pais achavam que ele "estava ficando doido".
— Eu fazia os concursos mais pelo dinheiro e pelo status, não era algo que me faria vibrar — afirma. — Hoje, vejo que eu era um zumbi.
Depois que acaba o expediente no prédio de 11 andares na esquina das avenidas Praia de Belas e Ipiranga, ele pega o carro no estacionamento ao lado e encara 30 quilômetros até o Lami e mais sete quilômetros de estrada de chão para chegar à Osho Rachana. Assim que entra no Cantagalo, vira Baldev — e retoma sua busca pelo amor forte.