Direito universal garantido pela Constituição Federal de 1988, a saúde ainda não alcança a todos os caxienses de maneira eficiente. São problemas históricos e que afetam diretamente a população, que deposita a resolução nas mãos dos próximos prefeitos. Dentre os desafios para o próximo gestor está, por exemplo, o de vencer a fila de 5 mil cirurgias eletivas para moradores da cidade, suprimir a demanda por leitos hospitalares e garantir uma assistência adequada na atenção primária, evitando a recorrente superlotação de Unidades de Pronto Atendimento (UPAs).
Os procedimentos eletivos são aqueles que podem ser postergados sem colocar o paciente em risco no momento, mas cuja demora tira a qualidade de vida, pode agravar sintomas e gerar ainda mais angústia aos envolvidos. A traumatologia lidera a lista atual, com 1,5 mil laudos autorizados.
Em relação às consultas com especialistas, a fila é de 29 mil, sendo que entre 8 mil e 9 mil consultas deste tipo são ofertadas por mês. Para diminuir o tempo de espera dos pacientes, a prefeitura firmou novos contratos com três hospitais do município e um de Flores da Cunha em 2023. O pacote contratado prevê, por exemplo, a realização de 9,9 mil consultas com especialistas e 312 cirurgias eletivas.
O envelhecimento populacional, a migração de mais usuários para o Sistema Único de Saúde na pandemia, bem como a capacidade hospitalar da cidade que não avançou com o passar do tempo e a defasagem nos recursos financeiros enviados pelo governo federal são apontados pelas autoridades como fatores que corroboram para o cenário atual.
Para entender quais devem ser as prioridades na área nos próximos anos em Caxias do Sul, o Pioneiro entrevistou dois especialistas. A reportagem também buscou as diretrizes e prioridades dos quatro candidatos à prefeitura.
O que dizem os especialistas
O professor do curso de Medicina da Universidade de Caxias do Sul, médico cirurgião torácico e diretor-técnico do Hospital Geral, Alexandre José Gonçalves Avino, entende que o futuro da saúde pública de Caxias passa essencialmente pelo investimento na atenção primária, com acesso pleno e atendimento qualificado nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs).
—Se nós tivermos uma atenção primária muito competente, nós vamos conseguimos barrar a maioria absoluta das necessidades da população. Com o oferecimento de um horário estendido (em mais unidades), com agendamento remoto e oferecimento de especialidades, nós teríamos uma ajuda enorme para a população. Além disso, as UBSs também poderiam trabalhar de maneira muito intensa com a prevenção. Assim, os moradores seriam acompanhados de uma maneira competente, para que os problemas não se agravassem, o estado de saúde dessas pessoas não se tornasse tão crítico a ponto de precisar de hospitalização — opina.
Outro apontamento de Avino se refere ao fortalecimento das tecnologias para a telemedicina. Ele sugere que, inicialmente, o contato a distância deveria ser estabelecido para consulta entre equipes assistenciais, e não diretamente no contato médico e paciente.
— Nós temos inúmeras sub e superespecialidades que não têm um acesso simples, especialmente dentro do SUS. Aqui na Serra, poderíamos utilizar, por exemplo, a expertise de uma superespecialidade que está concentrada em Porto Alegre. Dessa forma, os colegas de lá poderiam orientar as equipes que estão atendendo aqui, até o momento de se definir de transferir ou não transferir um paciente — sugere.
Para o professor do curso de Saúde Coletiva da UFRGS, Alcides Silva de Miranda, as próximas gestões também precisam se ater ao fato de que Caxias do Sul é um polo de saúde regional e traçar estratégias neste sentido. O município é referência em alta complexidade para outras 48 cidades. Por isso, ele acredita que cada município deva organizar melhor a própria atenção primária e também que exista um sistema mais competente de regulação:
— Nós já temos há algumas décadas acumulado o conhecimento e as tecnologias para o que a gente chama de gestão da clínica e do cuidado, que é estabelecer critérios para o encaminhamento de pessoas. Existe um dispositivo que tem sido trabalhado bastante no Brasil nos últimos anos que é o município maior ter um corpo de especialistas que ficam dando suporte para quem está encaminhando. Este processo tende a melhorar significativamente a regulação e diminuir aqueles encaminhamentos desnecessários que sobrecarregam o sistema — avalia.
Assim como o professor Avino, Miranda também sinaliza que uma das prioridades deva ser um atendimento eficaz na ponta, na atenção básica, evitando, desta forma, a sobrecarga nas UPAs.
— Tem que se fazer uma reorganização dos horários de funcionamento, da maneira como as pessoas vão ter acesso e da priorização de quem precisa mais — finaliza.
O que dizem os candidatos
Adiló Didomenico (PSDB)
"Fui o primeiro prefeito a criar uma alternativa para suprir as faltas de médicos em UBSs, com a contratação de empresa para cobrir as faltas desses médicos. Vamos ampliar essa medida, implantar a telemedicina, estender o Agenda+ UBS para todas UBSs para que ninguém mais precise ficar na fila para marcar consulta e também aumentar as equipes de Saúde da Família. Ainda, vamos ampliar o número de UBSs com horário estendido. Vamos ampliar os mutirões de consultas na nossa rede e a compra de consultas e procedimentos de terceiros, além dos convênios com instituições de ensino. Dessa forma, vamos ofertar ainda mais atendimentos do que os 190 mil que fizemos em quatro anos, isso contando somente compra ou convênio. As farmácias do CES serão deslocadas para outro prédio, já em processo de locação. Também faremos entrega de fórmulas e fraldas pelos Correios. Para melhorar o fluxo nas UPAs, vamos aprimorar a troca de informações entre nossos serviços, culminando em menos espera por leitos."
Denise Pessôa (PT)
"A saúde é prioridade em nosso plano de ação. Vamos fazer todos os esforços para zerar as filas de espera por consultas especializadas, exames e cirurgias. Como estamos em uma situação muito crítica, faremos mutirões e revisaremos contratos com hospitais e laboratórios para garantir a ampliação dos serviços. Fortaleceremos a atenção primária com mais médicos e profissionais de saúde, garantindo resolutividade nas UBSs. Vamos investir na teleassistência e criar policlínicas nas diferentes regiões do município, facilitando o acesso a serviços de saúde que hoje estão concentrados no CES. No mesmo sentido, para garantir medicamentos vamos aumentar as farmácias regionais, abrir a Farmácia Básica 24h e implementar o Programa Remédio em Casa. Vamos também realizar concursos públicos e fortalecer a carreira dos servidores. Tudo isso com transparência e eficiência, aderindo aos programas federais para buscar mais recursos e garantindo um atendimento de qualidade a toda população."
Felipe Gremelmaier (MDB)
"Para reduzir filas em serviços públicos de saúde, vou implantar um sistema de compra de consultas e exames especializados por meio de chamamento público. Trabalharemos muito focados nas ações preventivas de saúde, para evitar surgimento e agravamento de doenças, que depois exigem tratamentos mais complexos. Vamos aumentar as equipes de saúde da família para que a população tenha consulta médica nas UBS durante todo o dia. Assim, ampliaremos o número de consultas, o que desafogará as Unidades de Pronto Atendimento, as UPAs. Também nas UBSs, ampliaremos os serviços de equipes multiprofissionais formadas por psicólogas, nutricionistas e fisioterapeutas, trazendo esses atendimentos para mais perto da casa do cidadão. Descentralizaremos a entrega de medicamentos para outras regiões da cidade, acabando com as filas no CES. Retomaremos os programas de prevenção em saúde, como o Vigimama, o Bebê tem Hora Certa, o Primeira Infância Melhor e os grupos de doenças crônicas, programas do Governo Sartori que melhoraram a vida dos caxienses.”
Maurício Scalco (PL)
"A saúde em Caxias do Sul enfrenta sérias dificuldades. Por isso, a prioridade será propor soluções imediatas. Entre as ações planejadas, estão a redução de filas e do tempo de espera para consultas, exames e cirurgias, incluindo a compra de vagas na rede privada, além da implementação de um sistema de saúde integrado. O plano prevê a criação de um atendimento diferenciado para crianças de zero a cinco anos e especializado na saúde da mulher, por meio de parcerias público-privadas (PPPs). Também pretendemos aprimorar o programa “Médico de Família” e garantir assistência a pessoas com deficiência. Uma das inovações será a UBS do Trabalhador, que funcionará até as 22h, facilitando o acesso ao atendimento. Além disso, melhoraremos a estrutura das UPAs e UBSs. Essas iniciativas fazem parte do Plano “Mais Saúde Já”, que inclui o Consulta Agora, um serviço de telemedicina para agilizar consultas. Com o telemonitoramento dos pacientes e a criação de um Centro de Atendimento ao Idoso, buscaremos transformar a experiência de cada cidadão em um momento de cuidado e afeto."