Em julgamento no plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) encerrado nesta sexta-feira (30), o ex-presidente Jair Bolsonaro foi condenado, por 5 votos a 2, a oito anos de inelegibilidade, o que significa que o ex-chefe do Executivo só poderá concorrer novamente no pleito de 2030.
Em ação impetrada pelo PDT, o TSE julgou a conduta de Bolsonaro durante reunião realizada com embaixadores, em julho do ano passado, no Palácio da Alvorada, em que ele fez ataques ao sistema eletrônico de votação. Conforme o entendimento firmado pela Corte Eleitoral, o ex-presidente cometeu abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação.
De acordo com o voto do relator do caso no TSE, ministro Benedito Gonçalves, acompanhado por outros quatro magistrados no julgamento do caso de Bolsonaro, o abuso de poder político ocorre quanto agente público usa a estrutura da administração pública para causar interferência em processo eleitoral a favor de determinada candidatura. O uso indevido dos meios de comunicação é caracterizado por exposição desproporcional de um dos candidatos em um pleito, causando desequilíbrio na disputa.
Após ratificada a decisão pelo presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, Bolsonaro afirmou em entrevista que "não está morto" politicamente e que pensa em recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), no qual Moraes também faz parte.
Além do presidente do tribunal, votaram para impedir o ex-presidente de concorrer nas próximas eleições o relator, Benedito Gonçalves, e os ministros Floriano de Azevedo Marques, André Ramos Tavares e Cármen Lúcia. Divergiram Raul Araújo e Kássio Nunes Marques.
Apesar de ter sido condenado a um período de inelegibilidade de oito anos, Bolsonaro estará livre para concorrer às eleições de 2030. Isso ocorre por uma diferença de quatro dias no calendário eleitoral: a restrição começa a contar na data da eleição de 2022, ocorrida em 2 de outubro; em 2030, o primeiro domingo do mês será no dia 6.
Reunião com embaixadores
Em julho do ano passado, o então presidente Bolsonaro reuniu-se com 72 embaixadores estrangeiros no Palácio da Alvorada. Além de chefes de missões diplomáticas, ministros do primeiro escalão do governo federal estiveram presentes.
No encontro, Bolsonaro afirmou que houve manipulação nos resultados na eleição de 2018, o que foi rebatido por autoridades do Judiciário. O ex-presidente mostrou denúncia feita por um suposto hacker que teria obtido acesso a código fonte e senhas de autoridades do TSE. A corte eleitoral havia se manifestado, na ocasião, destacando que a investigação não concluiu que houve fraude nas eleições de 2018.
Aos embaixadores, Bolsonaro disse que o que apresentou estava documentado e expôs um compilado de declarações de ministros e trechos fora do contexto da apuração da Polícia Federal (PF).
O julgamento
O júri, que iniciou no dia 22 de junho e ocupou quatro sessões do TSE, decidiu por 5 votos a 2 pela condenação do ex-presidente.
De acordo com o voto do relator da ação, ministro Benedito Gonçalves, pela parcial procedência da ação ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), houve responsabilidade direta e pessoal de Bolsonaro ao praticar “conduta ilícita em benefício de sua candidatura à reeleição”. O ministro excluiu o então candidato à vice-presidência Walter Braga Netto da sanção de inelegibilidade em razão de não ter sido demonstrada sua responsabilidade.
+ PONTO A PONTO: os argumentos do relator ao votar pela ineligibilidade
— O Tribunal Superior Eleitoral se manterá firme em seu dever de, como órgão de cúpula da governança eleitoral, transmitir informações verídicas e atuar para conter o perigoso alastramento da desinformação que visa desacreditar o próprio regime democrático — declarou Benedito, em seu voto.
Responsável pelo voto final do julgamento, o presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, argumentou que o evento de Bolsonaro com embaixadores (leia mais abaixo) não teve caráter oficial, mas foi pautado com objetivo pessoal do ex-presidente, que seria influenciar os eleitores para que desconfiassem do sistema eleitoral brasileiro.
— De oficial (na reunião com embaixadores), só o desvio de finalidade praticado pelo então Presidente da República, porque o Itamaraty não organizou, não foi avisado e não participou, a Casa Civil da mesma forma, a Secretaria de Assuntos Estratégicos também não participou. Algo eleitoreiro, um monólogo eleitoreiro — pontuou.
O presidente do TSE destacou ainda que Bolsonaro teve oportunidade de apresentar provas das alegadas fraudes nas urnas, mas que não o fez porque "elas não existem":
— Um presidente da República que ataca a lisura do processo eleitoral que o elege há 40 anos, isso não é exercício de liberdade de expressão, isso é conduta vedada. E ao fazer isso utilizando-se do cargo de Presidente da República, do dinheiro público, da estrutura do Palácio da Alvorada, da TV pública, é abuso de poder. E ao preparar tudo isso para imediatamente bombardear o eleitorado via redes sociais: uso indevido dos meios de comunicação.
"Isso não é democracia"
Em Belo Horizonte, Bolsonaro afirmou que "não está morto" politicamente e que pensa em recorrer ao Supremo. À imprensa, o ex-presidente disse ainda que o Brasil está em "caminho bastante avançado" para se tornar uma ditadura, ainda que a decisão judicial tenha sido tomada de forma colegiada.
— Isso não é democracia — disparou, após a condenação.
O ex-chefe do Executivo defendeu que foi condenado "pelo conjunto da obra" e que o TSE trabalhou contra ele inclusive durante o processo eleitoral.
— Acredito que hoje tenha sido a primeira condenação por abuso de poder político (...) Foi uma condenação sem crime de corrupção, mas tudo bem — seguiu.