Relator do PL das Fake News, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) estima que o texto deve ser votado no plenário da Câmara ainda no primeiro semestre. Em passagem por Porto Alegre nesta sexta-feira (19), Silva disse que a retirada da matéria da ordem do dia de 2 maio, quando estava prevista para ser votada na Câmara, contribuiu para a construção de um ambiente mais receptivo à regulamentação das redes sociais.
— Esse tempo foi muito produtivo. Viramos votos em duas bancadas que haviam votado contra a tramitação em regime de urgência, do Podemos e do Solidariedade, e pudemos incorporar boas ideias ao texto. Muita coisa que estava dúbia ou com duplicidade de interpretação foi ajustada — afirmou o parlamentar.
Silva participou de dois debates na Capital, na PUCRS e na Assembleia Legislativa. À tarde, também esteve presente no lançamento da Frente Parlamentar de Combate às Fake News, de autoria do vereador Pedro Ruas (PSOL). Pela manhã, na PUC, o deputado comentou que a iniciativa tem por essência sintonizar a legislação brasileira com modelos já adotados internacionalmente, sobretudo na União Europeia, garantindo liberdade de expressão, transparência e responsabilização. Em alguns pontos, destacou, o PL inclusive é menos rigoroso do que em outros países.
— Nós importamos da lei de 2017 da Alemanha o dever de cuidado que restringe a publicação de conteúdo ilegal. Ou seja, se a plataforma souber que o conteúdo é ilegal, tem o dever de remover. Mas nós fomos mais econômicos. Na Alemanha, isso abrange todo o código penal. Aqui, nós restringimos a alguns crimes, como contra criança e adolescente, automutilação e indução ao suicídio, crimes contra a mulher, racismo, ataque ao Estado democrático de direito e infrações sanitárias. Acredito que isso é algo que pode tornar a internet mais saudável — comentou.
Ao lembrar que alguns aplicativos de redes sociais estão presentes em 99% dos celulares em circulação no Brasil, o parlamentar citou necessidade de regulação de ao menos dois atos praticados pelas big techs: a coleta de dados e a política de distribuição de conteúdos. De acordo com Silva, as empresas terão de informar o funcionamento não só dos mecanismos que multiplicam a exposição de determinados conteúdos, como justificar eventuais remoções.
— A liberdade de expressão é um bem essencial. Então se você publicou algo e a plataforma tirou porque feriu os termos de uso, ela terá de dizer onde o termo foi ferido e lhe dar direito de contraditar. Isso é um instrumento objetivo de defesa da liberdade de expressão. Mas liberdade é também ser ouvido, porque são os tais algoritmos que decidem quem ouve. Não é democrático você encapsular o debate entre iguais. Ter uma sociedade fraturada, como é a brasileira, ter uma dinâmica social encapsulada, como as bolhas produzem… é esse o ambiente social em que queremos viver? Esse precisa ser um debate ético e civilizatório — pontuou.
Diante de pesquisadores, políticos e estudantes, Silva salientou as dificuldades na busca de consensos dentro do Congresso, sobretudo frente a força de bancadas alinhadas à extrema-direita e que fazem oposição à regulação das redes. Nesse contexto, ele considera positiva a ideia de retirada de dois temas polêmicos, como a discussão sobre direito autoral e a remuneração das empresas jornalísticas. A sugestão de que as propostas sejam votadas em projetos de lei distintos ganha força na Casa e diminui a controvérsia em torno do texto principal.
Questionado sobre quem irá fiscalizar e aplicar eventuais sanções, Silva disse que essa discussão ainda está em construção. De acordo com o deputado, o ideal seria a criação de um órgão central, dotado de corpo técnico auxiliar selecionado por concurso público e cuja direção tenha mandato e estabilidade. Todavia, há resistência na oposição pois os futuros titulares desse novo órgão seriam indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
— Não queremos nada que já não exista no mundo. Esse é um tema da nossa geração e as regras do jogo podem impactar não apenas a democracia, mas a identidade da civilização que queremos construir para o próximo período — concluiu.