Em reunião com o secretariado na manhã desta quarta-feira (31), o governador Eduardo Leite anunciou que vai mandar à Assembleia Legislativa um projeto de lei que reajusta em 9% o salário mínimo regional. Pela proposta, o valor pago à menor faixa do piso regional passaria dos atuais R$ 1.443,94 para R$ 1.573,89, um aumento de R$ 129,95.
O índice de correção é superior à inflação acumulada entre janeiro de 2022 e janeiro de 2023, que foi de 5,71%. No entanto, não seria aplicado de forma retroativa a fevereiro, como em anos anteriores, visto que o projeto do governo muda a data-base do reajuste para o mês de maio, mesma regra adotada em outros Estados.
A proposta do Piratini desagradou o setor produtivo, que considera o reajuste elevado. Já as centrais sindicais almejam ampliar o percentual proposto até a votação do projeto na Assembleia.
Composto por cinco faixas (veja ao final o impacto do reajuste em cada uma), o salário mínimo regional incide sobre a remuneração de categorias que não têm previsão de outro parâmetro em convenções ou acordos coletivos e de trabalhadores informais. Também serve de base para o salário de alguns funcionários públicos estaduais, como servidores de escolas.
Para além do impacto direto, o reajuste do mínimo também costuma ser adotado como parâmetro para as negociações entre trabalhadores e empregadores que possuem convenções coletivas.
No anúncio, o governo frisou que o novo valor deve reestabelecer a diferença de 19% em relação ao mínimo nacional, que vigorava até 2021.
Antes da pandemia de covid-19, o Piratini vinha propondo anualmente a correção do piso pela inflação. Em 2020, Leite encaminhou proposta de reajuste de 4,5%, mas os deputados estaduais firmaram acordo para congelar o piso em razão do impacto econômico das restrições impostas pela emergência sanitária.
Em 2021, o governo propôs correção de 2,7%, que acabou elevada para 5,53% pela Assembleia. No ano passado, Leite ofereceu 7%, mas os deputados elevaram o reajuste para 10,06%.
Se o valor proposto para este ano for aprovado, o Rio Grande do Sul ficaria com o segundo maior piso regional do país, atrás apenas do Paraná, onde o menor valor pago aos trabalhadores é de R$ 1.749,02.
— O governo tem conduzido esse processo com muita responsabilidade e diálogo, com o objetivo de buscar o equilíbrio entre a valorização da mão de obra regional e a prevenção de distorções no mercado de trabalho — disse o governador, em comunicado do Palácio Piratini.
Fator surpresa
A decisão de Leite, de propor um reajuste ao piso superior à inflação acumulada até a data-base, vai na contramão do desejo das principais entidades empresariais do Estado. Nos últimos anos, os empresários têm criticado os reajustes anuais e defendido inclusive a extinção do piso.
As principais alegações são de que a reposição recorrente aumenta o custo de produção e impacta negativamente na geração de empregos. Outro argumento levantado é o de que apenas cinco das 27 unidades da federação têm um salário mínimo próprio, maior que o nacional.
De acordo com o vice-presidente de Integração da Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande do Sul (Federasul), Rafael Goelzer, os empresários foram pegos de surpresa com o anúncio de Leite nesta quarta-feira, visto que, no dia anterior, havia sido agendada para o dia 15 de junho uma reunião entre o governo e representantes das entidades para tratar do assunto.
Goelzer ressalta que o reajuste divulgado é superior à inflação do exercício anterior e prevê, como um dos impactos diretos, o desestímulo a contratações de trabalhadores e ao trabalho formal.
— Temos um histórico de três anos de quebra de safra no Estado e estamos e um momento desafiador, com dificuldades de tomar crédito e perspectiva de baixo crescimento. Esse aumento muito acima da inflação vai acarretar em um arrefecimento da economia — avalia.
Até o final desta semana, as entidades empresariais gaúchas devem se reunir para analisar as consequências do reajuste anunciado e levar um contraponto ao governo estadual.
De acordo com o vice-presidente da Federação do Comércio de Bens e de Serviços do Estado do Rio Grande do Sul (Fecomércio-RS), Joel Dadda, o percentual proposto também deve provocar por uma pressão por reajustes semelhantes a trabalhadores que possuem acordos coletivos e não são impactados diretamente pelo piso.
— Não existe um critério para o parâmetro desse reajuste. Se não é baseado no INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor, que mede a inflação), é baseado em quê? Vamos levar uma proposta ao governo mostrando o absurdo desse reajuste e pedir que se tenha uma regra — afirma Dadda.
Sindicatos querem ampliar percentual
De parte dos trabalhadores, a proposta ficou aquém do índice pleiteado. No mês passado, integrantes da seccional gaúcha da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB-RS) haviam entregue ao secretário estadual do Trabalho, Gilmar Sossella, o pedido de uma reposição de 15,42%. Esse reajuste elevaria o valor do piso regional a um patamar de 28% maior do que o nacional, percentual que foi adotado na sua criação, em 2001.
Diante disso, o presidente da CTB-RS, Guimar Vidor, diz que o índice apresentado pelo Piratini é insuficiente diante do crescimento do valor da cesta básica, que cresceu quase 60% na região metropolitana de Porto Alegre desde 2016, conforme estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
— Os trabalhadores que dependem do piso regional são justamente os que menos ganham, e o custo da cesta básica aumentou muito nos últimos anos. Vamos buscar um novo contato com o governo para persuadi-lo a aumentar essa proposta — avisa Vidor.
Na mesma linha, o presidente da Central Única dos Trabalhadores do Rio Grande do Sul (CUT-RS), Amarildo Cenci, diz que a pretensão da categoria seria obter uma correção de ao menos 10,5%, que recuperaria as perdas inflacionárias dos últimos anos:
— Vamos fazer contatos e esforços para conseguir chegar pelo menos aos 10,5%, que representa a reposição da inflação desse período do governo Leite.
A proposta do governo ainda vai tramitar na Assembleia Legislativa e pode sofrer alterações até a votação em plenário.
Como ficaria o piso regional com o reajuste de 9%
Faixa 1: de R$ 1.443,94 para R$ 1.573,89
Agricultura, pecuária e pesca; indústria extrativa; empregados domésticos; turismo; construção civil; motoboys etc.
Faixa 2: de 1.477,18 para R$ 1.610,13
Indústria do vestuário, calçado, fiação e tecelagem; estabelecimentos de serviços de saúde; serviços de limpeza; hotéis; restaurantes e bares etc.
Faixa 3: de R$ 1.510,69 para R$ 1.646,65
Indústrias de alimentos, móveis, química e farmacêutica; comércio em geral; armazéns etc.
Faixa 4: de R$ 1.570,36 para R$ 1.711,69
Indústrias metalúrgicas, gráficas, de vidros e da borracha; condomínios residenciais; auxiliares em administração escolar; vigilantes etc.
Faixa 5: de R$ 1.829,87 para R$ 1.994,56
Técnicos de nível médio