Um dia depois de líderes do governo pedirem o adiamento da sessão do Congresso que faria a leitura da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos atos golpistas — capitaneada por parlamentares do grupo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) —, deputados da própria base de apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) mudaram de posição. Eles passaram a defender a instalação da CPMI logo após a aparição das imagens de que o ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Marco Edson Gonçalves Dias, teria facilitado o trânsito de vândalos no Palácio do Planalto durante os protestos de 8 de janeiro. O ministro pediu exoneração do cargo.
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), disse que "o fato de hoje" mudou a posição do governo sobre a CPMI:
— Se o presidente (do Congresso, Rodrigo Pacheco) ler CPMI e partidos quiserem, vamos estar dentro.
Guimarães também afirmou que o governo será o primeiro a indicar membros da comissão:
— Queremos apuração ampla, geral e irrestrita, doa em quem doer. Se o Congresso quiser instalar CPMI, estamos prontos para ajudar, inclusive para investigar.
Mais cedo, o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), vice-líder do governo na Câmara, defendeu que a CPMI poderia afetar Bolsonaro e sugeriu o ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres, preso desde janeiro, como um dos primeiros nomes a depor na CPMI.
— Ganhou força do nosso lado a tese dos que defendiam que a CPMI era boa desde o começo. Essa CPMI vai ser uma dor de cabeça para Bolsonaro, para deputados bolsonaristas. É uma mudança de página. Agora é ir para a CPMI para a ofensiva política — disse Lindbergh.
O deputado Zé Neto (PT-BA) pontua que é preciso dar prioridade ao arcabouço fiscal e reforma tributária, mas entende que há espaço para a instalação da comissão.
— Tenho uma preocupação grande com a situação econômica do país, vejo a CPMI com ressalvas, mas defendo que ela seja instalada no segundo semestre — afirmou.
Divergências
O tema ainda gera divergências no governo. Inicialmente, o líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PR), negou a possibilidade de apoio à comissão de inquérito.
A oposição concentra todos os esforços para que seja feita a leitura do requerimento da CPMI, de autoria do deputado André Fernandes (PL-CE). A estratégia parte de encontrar uma responsabilização do governo federal, que teria conhecimento prévio das manifestações e preferiu não reforçar a segurança do entorno da área dos Três Poderes. Enquanto o governo adiava a sessão do Congresso, deputados bolsonaristas usaram das comissões para pressionar ministros sobre o 8 de janeiro.
Nesta quarta-feira (19), Gonçalves Dias falaria à Comissão de Segurança Pública e até confirmou a presença às 10h para se explicar para os deputados. Após ser noticiado que que ele aparecia em imagens do circuito interno de TV do Palácio do Planalto sem confrontar invasores golpistas que depredaram o prédio nos ataques de 8 de janeiro, ele apresentou atestado médico às 13h justificando a ausência. O documento assinado pelo médico João Luiz Henrique da Silveira relatou que o então ministro teve um "quadro clínico agudo com necessidade de medicação e observação", sem especificar a causa ou código de doença.
Deputados logo aprovaram em seguida uma convocação de G. Dias, obrigando-o a comparecer à Câmara para explicar suas ações no 8 de janeiro. Mais tarde, ele pediu demissão, aceita por Lula durante encontro com o general e ministros palacianos.
"Governo está preocupado em aprovar reforma tributária"
Após anunciar apoio da bancada à instalação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), Guimarães (PT-CE) reforçou que a preocupação da atual gestão é apoiar as novas metas fiscais.
— CPMI para quem é governo não serve, eu já fui oposição — disse. — Governo está preocupado em aprovar reforma tributária, aprovar as novas metas físicas, piso da enfermagem, dinheiro para universidades, lei das Fake News — completou, em coletiva à imprensa.
Ele garantiu que o governo vai trabalhar para dar celeridade na tramitação do novo arcabouço fiscal, regra que, segundo ele, sinaliza credibilidade com preservação de investimentos em áreas sociais. O texto foi entregue na terça (18), ao Congresso, mas o relator ainda não foi divulgado. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse esperar que a matéria seja votada até o dia 10 de maio na Casa.