O procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras, pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a suspensão imediata do indulto do presidente Jair Bolsonaro que beneficiou policiais condenados pelo massacre do Carandiru. A avaliação do chefe do Ministério Público Federal é a de que o trecho do decreto que enquadrou os PMs viola a Constituição - a qual veda o indulto para crimes hediondos. Segundo Aras, tal aferição deve ser feita não no momento da prática do crime, como fez o decreto de Bolsonaro, mas sim na data da edição do texto.
O chefe do MPF argumenta que a suspensão cautelar de trecho do decreto de Bolsonaro é forma de evitar o esvaziamento das dezenas de condenações do caso.
No mérito, o PGR pede que a Corte máxima afaste a possibilidade de que o indulto seja concedido a condenados por crimes de lesa-humanidade, "notadamente os cometidos no caso do Massacre do Carandiru, cuja persecução e efetiva responsabilização o Estado obrigou-se por compromisso internacional assumido voluntariamente pela República Federativa do Brasil".
Para Aras, indultar os PMs envolvidos no Massacre do Carandiru significaria "impunidade e afronta às decisões de órgãos de monitoramento e de controle internacionais" de direitos humanos, podendo implicar em responsabilização do Brasil perante cortes internacionais
"Indultar graves violações de direitos humanos consubstanciadas em crimes de lesa-humanidade significa ignorar direitos inerentes ao ser humano, como os direitos à vida e à integridade física", ressaltou o PGR.
Aras argumentou ainda que a Constituição proíbe a concessão de indulto para crimes considerados de lesa-humanidade no plano internacional, como foi o massacre do Carandiru, classificado como grave violação de direitos humanos por cortes internacionais.
O decreto também foi considerado institucional pelo procurador-geral de Justiça de São Paulo Mário Luiz Sarrubbo. O chefe do Ministério Público Paulista acionou a PGR pedindo que o órgão questionasse o decreto no Supremo.
À Corte máxima, o PGR diz que o Massacre do Carandiru representa um "triste capítulo da história brasileira". O episódio deixou 111 mortos, com a consequente condenação de 74 policiais militares por homicídio qualificado, com penas variando de 96 a 624 anos de prisão.
"O decreto presidencial que concede o indulto natalino não pode alcançar os crimes que, no momento da sua edição, são definidos como hediondos, pouco importando se, na data do cometimento do crime, este não se qualificava pela nota de hediondez", explicou o PGR.
Massacre do Carandiru
Em 2 de outubro de 1992, 111 presos foram mortos durante invasão da Polícia Militar (PM) para conter rebelião no Pavilhão 9 da Casa de Detenção em São Paulo.
Segundo o decreto presidencial do indulto deste ano, estarão perdoados agentes de forças de segurança que foram acusados por crimes cometidos há mais de 30 anos, mesmo que eles não tenham sido condenados em definitivo na última instância da Justiça.
Os PMs condenados pelo Massacre do Carandiru se encaixam nesse perfil. O caso completou três décadas em 2022.
Cinco júris condenaram PMs
Entre 2013 e 2014, a Justiça paulista fez cinco júris populares e condenou, ao todo, 74 policiais militares pelos assassinatos de 77 detentos.
Dos agentes condenados, cinco morreram e atualmente 69 deles continuam vivos. Mais de 30 anos depois, ninguém foi preso.
Os PMs foram punidos com penas que variam de 48 anos a 624 anos de prisão. Pela lei brasileira, ninguém pode ficar preso mais de 40 anos por um mesmo crime. Apesar disso, todos os agentes condenados respondem pelos crimes de homicídio em liberdade.