O ex-ministro da Educação Fernando Haddad (PT) disse, nesta sexta-feira (25), no Almoço Anual de Dirigentes de Bancos da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), que o orçamento público no Brasil deve ser reconfigurado de modo a dar mais consistência e transparência aos gastos públicos. De acordo com Haddad, essa reconfiguração deve ocorrer com a colaboração do Congresso.
— Temos desorganização de programas estruturados há décadas, que vêm perdendo funcionalidade — disse Haddad, que representou o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no encontro.
Para o ex-prefeito de São Paulo, "qualquer pessoa minimamente versada em distribuição de renda" dirá que é preciso repensar diversos gastos no país.
— Temos tarefa enorme de reconfigurar o orçamento e dar a ele mais transparência — destacou, citando as áreas de Ciência e Tecnologia e Cultura.
O Congresso Nacional, segundo Haddad, poderá e deverá ter participação da gestão do orçamento. O ex-ministro disse que o Congresso pode redirecionar verbas para áreas que parlamentares consideram prioritárias, reiterando que não haverá retirada do "protagonismo do Congresso".
Na avaliação de Haddad, há "alguma coisa de muito errada que está acontecendo com desenho e execução do Auxílio Brasil".
— O Bolsa Família acabou com a fome nesse país com transferência de renda da ordem de menos de 0,5% do PIB (Produto Interno Bruto) — disse. — Hoje tem programa de mais de 1,5% do PIB que não resolveu o problema — completou.
Um dos nomes cotados para chefiar o Ministério da Fazenda durante o próximo governo Lula, Haddad afirmou que a determinação do presidente eleito é para que se dê início à reforma tributária para melhorar a qualidade da receita em 2023 já no início do governo.
— A determinação clara do presidente Lula é que nós possamos dar logo no início do próximo governo prioridade total à reforma tributária — afirmou, acrescentando que Lula vem tentando realizar a reforma há duas décadas, mas sem êxito. — Me parece que o presidente Lula vai dar prioridade à aprovação da reforma tributária de Appy — declarou, em referência à proposta elaborada pelo economista Bernard Appy. — Na sequência, Lula pretende encaminhar proposta para reformular impostos sobre bens e patrimônio — emendou.
Agenda séria no setor financeiro para continuar reformas
O ex-ministro da Educação também disse acreditar que é preciso ter uma agenda séria no setor financeiro para continuar reformas no país.
— Podemos continuar agenda forte para baratear crédito e torná-lo alavanca de desenvolvimento — avaliou.
De acordo com Haddad, uma agenda de adimplência, de acesso ao sistema bancário, é "tarefa essencial":
— Estamos dispostos a auxiliar com essa agenda junto ao setor bancário e Banco Central.
O petista citou que a intermediação do Estado no orçamento se completa com intermediação financeira e com crédito forte.
Investimento em Ciência e Tecnologia
Fernando Haddad ainda ressaltou que as empresas estatais têm investido pouco em ciência e tecnologia, apesar de estarem obtendo "lucros recordes".
— O Brasil está investindo cada vez menos em Ciência e Tecnologia, e detalhe, com uma janela de oportunidade que há muito tempo não se vê — comentou. — Empresas estatais investem pouco hoje em ciência e tecnologia, apesar dos lucros recordes que estão obtendo. Nosso investimento em ciência e tecnologia precisa ser revisto, precisa ser estimulado pelas empresas públicas e privadas com alta rentabilidade — completou.
A "janela de oportunidade" à qual o ministro se referiu diz respeito à área de energia verde. Para Haddad, a demanda global por hidrogênio verde, energia eólica e energia solar tem o potencial de alavancar investimentos no país. Ele disse ainda considerar que há vantagens competitivas na indústria automotiva brasileira.
Sobre a agenda verde, o ex-ministro disse que Lula é uma figura respeitada no Exterior e pode ajudar a destravar acordos internacionais que estão na gaveta. Ele acrescentou considerar que uma maior integração com o Mercosul pode facilitar a atração de investimentos para o Brasil:
— Está se abrindo um conjunto de oportunidades muito impressionante para o Brasil e nós podemos nos aproveitar desse cenário para fazer a diferença. E contando com um personagem que é muito popular no Exterior e muito respeitado no Exterior.
Ele acrescentou que, durante a viagem de Lula à Conferência das Nações Unidas para o Clima (COP-27), no Egito, várias delegações trataram com o presidente eleito sobre o acordo entre União Europeia e Mercosul.
Haddad disse ainda considerar que o investimento feito pelo Brasil na área de educação básica, como proporção do PIB, é adequado na comparação com países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE). No entanto, afirmou ser necessário melhorar a gestão no tema, para atingir as metas estabelecidas pela lei.
Segundo o ex-ministro, é consenso entre economistas que a qualidade da despesa pública piorou.
— Hoje temos orçamento com dificuldade de atingir qualquer objetivo programado — afirmou.
Testado
No início de sua apresentação, Haddad fez questão de deixar claro que sua presença no evento é em nome de Lula, que se recupera de uma cirurgia. No entanto, a participação do ex-prefeito de São Paulo no tradicional evento da Febraban pode servir como uma espécie de "teste" do nome do ex-ministro para a pasta. É crescente a chance de uma dobradinha entre Haddad e Pérsio Arida, membro da equipe de transição. Neste arranjo, o economista ocuparia a secretaria-executiva da pasta ou o Ministério do Planejamento.
A notícia foi recebida pelo mercado como um sinal positivo, por afastar a chance de uma equipe econômica majoritariamente heterodoxa.
Haddad disse que foi convidado, na terça-feira (22), para o evento desta sexta, mas não aceitou. No entanto, na quinta (24), ele foi convidado para representar o presidente eleito.
— Vou falar em nome do presidente Lula, não em meu nome — destacou.
Haddad ouviu atentamente as apresentações anteriores do presidente da Febraban, Isaac Sidney, e do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.