A Assembleia Legislativa aprovou, nesta terça-feira (4), a criação de um sistema de cotas para todos os concursos do Judiciário do Rio Grande do Sul. Com 34 votos favoráveis e 11 contrários, os deputados chancelaram o projeto de lei que reserva 20% das vagas para negros. A ação afirmativa, proposta pelo próprio Tribunal de Justiça (TJ), tem objetivo de corrigir a histórica desigualdade racial do país.
— É uma ação afirmativa, para correção de desigualdades raciais e promoção da igualdade de oportunidades. E tem a cláusula de desempenho, então o candidato tem que atingir o nível de desempenho para ser incluído (entre os aprovados). O número atual de negros poderia ser mais expressivo (no Tribunal de Justiça). A provação do projeto de lei é um avanço, e acreditamos que ele trará essa correção — afirmou o desembargador Francisco Moesh, presidente do Conselho de Relações Institucionais do TJ.
Conforme o Judiciário gaúcho, o sistema de cotas se alinha aos princípios da Constituição e é uma medida de resposta ao Pacto Gaúcho pelo Fim do Racismo Institucional, assinado em 2012 entre os três Poderes mais o Ministério Público e a Defensoria Pública.
O projeto aprovado prevê que a reserva de vagas seja aplicada aos concursos que tenham em disputa ao menos três vagas. A política afirmativa será aplicada tanto para os cargos diretos do Judiciário quanto para funções delegadas.
— Vale inclusive para as áreas notarial e registral — acrescentou Moesch.
Relator do texto na Comissão de Cidadania e Direitos Humanos, o deputado Jeferson Fernandes (PT) destacou que a baixa presença de negros no Judiciário gaúcho é fruto de um passado escravocrata.
— É muito importante nos darmos conta que, daqui uns dias, em 13 de maio, novamente vai se recuperar a memória da abolição da escravatura. Já passam de 130 anos e foram muito poucas as políticas afirmativas no país. O resultado na magistratura gaúcha? Temos 780 magistrados e temos apenas uma juíza negra e um juiz negro. Esse processo precisa ser modificado e isso passa por nós repararmos esse passado tenebroso do país — defendeu Fernandes, favoravelmente à medida.
As bancadas do MDB, do PSDB e do PSL se dividiram com relação ao tema. O deputado emedebista Tiago Simon reconheceu o problema da desigualdade racial e defendeu políticas afirmativas, mas apontou que isso não deve atingir o ingresso por concurso público.
— O princípio da igualdade, plasmado na nossa Constituição, respalda, sim, políticas que promovam a igualdade material entre os brasileiros. Tivemos um processo de escravidão sem reparação histórica e eu reconheço que políticas afirmativas são necessárias para reparar essa dívida social. Todavia, quando falamos em concursos públicos, tenho dúvidas, tendo em vista que o interesse público de que os mais preparados ocupem as vagas porque o serviço público atende ao bem geral, ao bem de todos — argumentou Simon, que votou contra a proposta.
Aprovado, o projeto segue para sanção do governador Eduardo Leite. Se for sancionado, o texto se torna lei e terá impacto nos editais de concurso abertos depois disso.
Atualmente, já é aplicada a reserva de cotas raciais nos concursos do TJ, mas por definição de resolução nacional, de 2015, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Com a aprovação de lei estadual, a política afirmativa ganha estabilidade e evita questionamentos jurídicos no Rio Grande do Sul, segundo apurou GZH com fonte do Tribunal de Justiça.