Sob protestos da oposição, o Conselho de Ética da Câmara arquivou o processo contra o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) por incitação à instituição de um novo AI-5. O ato, de 1968, foi o mais duro instituído pela ditadura militar, com revogação de direitos fundamentais e delegação ao presidente da República do poder de cassar mandatos de parlamentares, intervir em municípios e Estados.
Foram 12 votos a favor e cinco contra o arquivamento. Votaram contra os deputados Delegado Waldir (PSL-GO), Célio Moura (PT-TO), Paulo Guedes (PT-MG), Júlio Delgado (PSB-MG) e Fernanda Melchiona (PSOL-RS).
O relator, deputado Igor Timo (Podemos-MG), já havia apresentado parecer pelo encerramento do caso na semana passada, mas os partidos de esquerda pediram vista, o que adiou a votação para esta quinta-feira (8).
Timo não viu motivos para dar continuidade às representações de Rede, PSOL, PT e PCdoB, que acusavam Eduardo Bolsonaro de quebra de decoro parlamentar e de atentado contra a democracia.
— O que seria mais danoso ao Congresso Nacional, a possibilidade ou a prática de uma ação em seu desfavor? Essa ação seria a censura. Essa mesma aventada pelo representado, mas que agora pode ser praticada pelos seus pares em seu desfavor. Se estamos aqui para discutir e combater a censura, é importante que nós não pratiquemos contra um colega. Quando digo a um colega, me refiro a todos — disse Timo.
"Se a esquerda radicalizar"
A polêmica declaração do deputado foi publicada em outubro de 2019. Em entrevista ao canal da jornalista Leda Nagle no YouTube, Eduardo Bolsonaro fez uma ameaça caso manifestações contra o governo, como as que ocorriam naquela época no Chile, chegassem ao país.
— Se a esquerda radicalizar a esse ponto, vamos precisar dar uma resposta. E essa resposta pode ser via um novo AI-5, pode ser via uma legislação aprovada via plebiscito, como ocorreu na Itália. Alguma resposta vai ter que ser dada — disse, na ocasião.
Na sessão desta quinta, Eduardo Bolsonaro voltou a criticar a esquerda.
— Esses mesmos que me acusam de ter conduta ditatorial, como o próprio presidente Jair Bolsonaro, que nunca matou uma pessoa em sua vida, esses mesmos que o acusam de ser genocida fazem apologia à revolução bolchevique, celebram mais de 200 anos do nascimento de Karl Marx e tantos outras figuras, como Marighella — disse.
Deputados que vivenciaram o AI-5 lamentaram a decisão.
— Eu sei o que foi o AI-5. Fechou o Congresso e definitivamente instaurou a tortura como política de Estado — afirmou o deputado Ivan Valente (PSOL-SP).
A oposição apresentou um voto em separado contra o arquivamento e pela continuidade do caso no colegiado, mas não teve efeito prático. Os partidos pediram ainda a suspeição do relator.
Para as siglas, há imparcialidade na relação entre Timo e Eduardo. Em junho do ano passado, o relator gravou um vídeo com Jair Bolsonaro agradecendo pela liberação de verbas para o seu Estado e publicou nas redes sociais.
Timo se defendeu durante a sessão desta quinta sobre essa questão. Ele disse ter votado no senador Álvaro Dias (Podemos-SP) para a presidência da República no primeiro turno das eleições de 2018 e que decidiu gravar o vídeo com Bolsonaro para informar a população de sua região sobre o envio de recursos.
Esse é o segundo caso relacionado a Eduardo Bolsonaro arquivado na atual legislatura. Em fevereiro deste ano, o conselho já havia arquivado outra representação protocolada pelo PSL a pedido da deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), que o acusou de ter quebrado o decoro ao promover um "linchamento virtual" contra ela, por postagens consideradas "difamatórias e injuriosas" nas redes sociais.
Em 2017, na legislatura passada, Eduardo Bolsonaro teve outros dois processos arquivados. No primeiro ele era acusado de ter cuspido nas costas do então deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), na sessão em que foi julgada a admissibilidade do impeachment de Dilma Rousseff (PT), em abril de 2016. No segundo, ele era acusado de ter feito uma edição fraudulenta do vídeo do ocorrido no Plenário.
O Conselho de Ética realizada ainda nesta quinta eleição para o novo comando do colegiado. Cada chapa é eleita para o mandato de dois anos. O deputado Paulo Azi (DEM-BA) é até o momento o único candidato para ocupar o posto de presidente no lugar de Juscelino Filho (DEM-MA).