O médico gaúcho Alberto Beltrame é acusado pelo Ministério Público do Pará de chefiar uma organização criminosa que teria desviado recursos públicos. Trata-se de mais uma investigação envolvendo o ex-ministro do Desenvolvimento Social. Desta vez, o juiz da Vara de Combate do Crime Organizado de Belém Lucas do Carmo de Jesus aceitou denúncia contra Beltrame e mais oito pessoas por fraude envolvendo a compra de álcool gel 70% pelo governo do Pará quando o gaúcho era secretário da Saúde paraense. Ele terá de ser monitorado por tornozeleira eletrônica.
Entre os demais denunciados, há servidores públicos e empresários. Beltrame é réu pelos crimes de peculato, fraude licitatória, organização criminosa e lavagem de dinheiro.
Conforme a acusação, houve dispensa indevida de licitação e superfaturamento na compra de 159.400 frascos de 500ml de álcool gel. De acordo com os promotores, o valor que teria sido pago para a empresa Dispará Hospitalar Comercial E Serviços Ltda chega a R$ 2.869.200, muito acima do preço de mercado. A investigação constatou que essa empresa nunca produziu ou comercializou a substância. Os promotores dizem que Beltrame transformou a Secretaria da Saúde do Pará em um "balcão de negócios".
A investigação foi reforçada pela colaboração premiada dos proprietários da Dispará Hospitalar Comercial e Serviços Ltda, que confirmaram que a empresa foi contratada, por intermediação de um dos denunciados, apenas apara emitir nota fiscal, enquanto a mercadoria foi adquirida de terceiros por valores inferiores.
Nesta sexta-feira (18), ocorreu a terceira fase da Operação Transparência, que apura desvio de recursos da saúde pública do Pará. Foram cumpridos mandados de busca e apreensão e prisão preventiva em Belém, São Paulo e Porto Alegre.
Quando os agentes do Ministério Público do Rio Grande do Sul, que cumpriram o mandado em apoio aos colegas do Pará, chegaram à residência dele, ele não estava em casa. Segundo pessoas que estavam no imóvel, Beltrame está no Pará. O médico gaúcho está proibido pela Justiça paraense de ter acesso à sede da secretaria e de qualquer estabelecimento das empresas investigadas ou envolvidas. Também não poderá sair da Comarca de Porto Alegre, que é onde ele mora. Ele terá de cumprir recolhimento domiciliar no período noturno. Beltrame está impedido por um ano de exercer função pública. A mesma medida foi estabelecida para outros cinco denunciados.
Foram apreendidos celulares, notebooks, documentos, notas fiscais, tablets e veículos dos denunciados.
GZH tentou contato com Beltrame, mas não conseguiu até a publicação deste texto. Se receber retorno, a reportagem será atualizada.
Como funcionava o esquema, segundo dos promotores do Pará
- Sabia-se de antemão quem seria o vencedor da licitação, por meio de conluio e prévio ajuste entre o núcleo político da organização criminosa e as empresas, por seus representantes ou intermediários;
- A divisão do dinheiro público que seria desviado também era previamente ajustada, sendo que em alguns casos o percentual do núcleo político chegou a 20% do valor total contratado;
- Alguns produtos foram licitados apenas para fazer o dinheiro público circular e beneficiar a organização criminosa, pois sequer tinham a justificativa de aquisição (tanto em qualidade quanto em quantidade)
- Escolhido o vencedor, ocorria o pagamento antecipado do valor total contratado, mesmo com produtos não entregues;
- A licitação era “montada” extemporaneamente, adaptando-se os valores supostamente pesquisados em planilhas (mapas de preço), sendo que vários outros documentos também foram assinados com datas retroativas, de maneira fraudulenta, tudo para dar aparência de legalidade à licitação;
- Notas de entrega dos produtos foram forjadas ou antecipadas (mesmo sem entrega formal);
- Algumas empresas contratadas serviram apenas para emitir nota fiscal, não tendo prestado qualquer serviço diretamente;
- Com a expedição da nota de empenho, emissão de nota fiscal e posterior pagamento, os valores eram divididos (a depender da negociação) entre os integrantes do esquema;
- Gerados os recursos ilícitos, e para fins de dar aparência de legalidade, os valores monetários eram submetidos a atos de lavagem para ocultação e dissimulação de origem e natureza. Encerrado esse ciclo, partia-se para novas licitações, com outros objetos e empresas, buscando novos lucros, mas sempre atuando com modus operandi similar;
- A organização criminosa se comunicava por meio de um grupo criado no Whatsapp.