O Ministério Público (MP) realizou operação na manhã desta terça-feira em Osório, no Litoral Norte, para apreender documentos sobre irregularidades detectadas em contratos da prefeitura, por meio da Secretaria da Saúde, entre outubro de 2019 e junho deste ano. No período, houve desvios de recursos públicos que podem somar até R$ 2,5 milhões.
Há uma empresa, por exemplo, ligada a servidores públicos, que forneceu apenas metade dos equipamentos de proteção individual (EPI) adquiridos pelo Executivo. Além de sobrepreço e superfaturamento, o pagamento foi feito como se todo o material tivesse sido entregue.
Agentes do MP e policiais militares cumpriram 13 mandados de busca em Osório, Tramandaí, Capão da Canoa, Xangri-lá e Porto Alegre, apreendendo vários documentos. Segundo o promotor João Beltrame, que comandou a ação, quatro empresas são alvo de inquérito — já em andamento.
Uma delas, por exemplo, não é da área da saúde e foi aberta no período de distanciamento social pelo familiar de um casal de servidores públicos, passando a fornecer EPIs para o combate ao coronavírus. Assim como esta empresa, as outras três tiveram dispensa indevida de licitação, realizavam sobrepreço e superfaturamento, além de enviarem metade do material solicitado — mas recebendo na íntegra, como se tivessem fornecido todos os produtos.
Uma das empresas sequer tinha funcionários. Já a que tinha como dono um laranja dos servidores públicos, somente ela, recebeu mais de R$ 815 mil dos cofres municipais.
— Detectamos relações familiares, como dois funcionários, um casal, cuja mãe da servidora abriu uma empresa no período da covid-19. Ou seja, familiar tem empresa, houve dispensa de licitação, até os requisitos básicos da Lei 13.979, sobre licitações no período de pandemia, foram desrespeitados. Quem pagava e fiscalizava era um ex-secretário da Saúde, além de outro familiar responsável por encaminhar documentos e fiscalizar também. Mudaram o procedimento padrão da prefeitura para favorecer estas pessoas — ressalta Beltrame.
O MP destacou ainda que as entregas dos materiais fornecidos ocorriam pela metade. Se uma empresa assinava a entrega de 2 mil luvas cirúrgicas, por exemplo, só entregava mil, mas recebendo pelo contrato inteiro. Segundo Beltrame, os pagamentos eram fracionados para burlar o controle de licitação, ou seja, sempre recebiam parcelado e ainda eram valores acima do estipulado pelo mercado.
Lavagem de dinheiro
Ao todo, as investigações, inclusive documentos apreendidos nesta terça-feira, como procurações em branco, já comprovam algumas irregularidades. Por enquanto, Beltrame diz que são oito pessoas e quatro empresas investigadas.
Houve o afastamento de três funcionários e oito proibições de empresários de poder contratar com o poder público. Mas o MP não descarta mais envolvidos após a análise do material localizado durante a ofensiva.
Um dos delitos que ainda pode ser apurado é a suspeita de lavagem de dinheiro, já que muitos investigados têm casas — inclusive incompatíveis com o salário — e carros em nome de terceiros. Beltrame não divulgou nomes devido à Lei de Abuso de Autoridade, mas informou que a prefeitura colaborou com as investigações e que os pagamentos e fiscalizações ficaram no âmbito da pasta da Saúde, em princípio, com autonomia total.
O que diz a prefeitura
O prefeito de Osório, Eduardo Abrahão, confirma que colaborou com a investigação e que segue à disposição do MP. Além disso, ressalta que já havia realizado afastamentos, bem como dois procedimentos internos — um investigativo e outro administrativo — e agora uma auditoria externa para saber o valor exato do prejuízo aos cofres públicos.
Segundo o chefe do Executivo municipal, o processo investigativo confirmou as fraudes, e o administrativo segue em andamento. Abrahão diz que um funcionário pediu para sair em maio, outro foi afastado, e um terceiro já foi exonerado. Sobre o ex-secretário da Saúde, ressalta que ele saiu no fim de maio para concorrer nas eleições, mas que depois desistiu da candidatura.
— Não quero fazer julgamento antecipado, as investigações continuam, mas eu, na verdade a administração toda, estamos mais do que chateados, estamos incomodados com esta situação — afirma Abrahão.
GZH não conseguiu contato com o ex-secretário da Saúde, no entanto, conversou por telefone com o advogado dele. Eduardo Abed ressalta que tem interesse em dar todas as explicações e com toda a transparência, mas no momento não vai se pronunciar devido ao deslocamento para Osório com o objetivo de se inteirar dos fatos e do envolvimento do seu cliente nas suspeitas.