Com 39 anos completados em 30 de abril, Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) é um senador de voz desconhecida para a maioria dos seus colegas de mandato no Senado. Filho número um do presidente Jair Bolsonaro, Flávio está no seu segundo ano de mandato, e, desde que assumiu, nem mesmo os parlamentares com cargos mais influentes na Casa se lembram de, ao menos, ter ouvido a voz do colega.
— Acho que nunca ouvi a voz dele. Nunca conversei com ele. Não que me lembre — diz a presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Simone Tebet (MDB-MS).
Desde que tomou posse como senador, Flávio não costuma ser presença constante e ativa em plenário, segundo seus colegas. Especialmente desde que vieram à tona as denúncias sobre a "rachadinha".
Flávio é investigado desde janeiro de 2018 sob a suspeita de recolher parte do salário de seus subordinados (prática chamada de "rachadinha") na Assembleia Legislativa do Rio de 2007 a 2018, quando o filho do presidente era deputado estadual. Os crimes em apuração são peculato, lavagem de dinheiro, ocultação de patrimônio e organização criminosa.
Para alguns senadores, o filho do presidente aproveitou as sessões virtuais, implementadas pelo Senado desde o último dia 24 de março, para intensificar seu afastamento parlamentar.
Em mais de um mês de sessões à distância, o senador registrou o voto, mas não fez aparição por vídeo diante dos colegas.
— Acho que o problema dele (Flávio) são as denúncias que pesam contra ele — avalia o senador Esperidião Amin (PP-SC).
Flávio agora também se tornou peça central em outra apuração da Polícia Federal (PF). A corporação vai investigar o relato do empresário Paulo Marinho ao jornal Folha de S.Paulo sobre suposto vazamento de uma operação da PF ao senador. Além de apurar o vazamento, a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), a PF vai ouvir o depoimento de Marinho no inquérito já aberto para investigar, com base em acusações do ex-ministro Sergio Moro (Justiça), se o presidente Bolsonaro tentou interferir indevidamente na corporação.
José Serra (PSDB-SP), por exemplo, que é conhecido pelos colegas por não ser adepto de participar das reuniões por meio de câmaras, costuma expressar seu voto ao telefone. Flávio Bolsonaro não usa nem mesmo esse sistema.
A reportagem pediu um posicionamento do senador por meio de sua assessoria, mas não obteve retorno.
— Ele sempre foi um senador de baixa participação em projetos, em plenário, em atuação com os colegas. A sessão virtual só deixou isso mais visível — diz o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE).
Nos registros do Senado, o último pronunciamento de Flávio em plenário ocorreu no dia 19 de novembro do ano passado. Na ocasião, rebateu o senador Renan Calheiros (MDB-AL), que alegou que haveria uma relação entre Moro e o presidente Bolsonaro antes da eleição de 2018 e que o convite ao ministério teria ocorrido antes da eleição.
De fevereiro de 2019, quando assumiu, até a primeira semana de maio de 2020, Flávio Bolsonaro fez nove pronunciamentos em plenário, segundo os registros do Senado. Desses, além da defesa sobre a indicação de Moro, o "01" do presidente fez uma manifestação rotulada de "explicação pessoal". Na ocasião, rebateu um pronunciamento do colega Tasso Jereissati (PSDB-CE), que proferiu críticas à gestão no Palácio do Planalto durante o governo petista.
— É muito trabalho para desfazer! Pode ter certeza de que nós vamos aqui ter vários embates ainda, porque o governo Bolsonaro vai sanear isso tudo e, muito rapidamente, vamos começar a gerar milhões e milhões de empregos — disse Flávio.
Nas raras vezes em que falou, o filho do presidente também defendeu o decreto que regulamentou o estatuto do desarmamento. A fala foi em 8 de maio de 2019, em um "pela ordem", após a fala do senador Marcos do Val (Podemos-ES).
— Hoje as atrocidades acontecem porque as pessoas de bem estão desarmadas. Não é passar a segurança pública para a responsabilidade do indivíduo, é para que o próprio indivíduo, caso haja necessidade, caso cumpra os requisitos legais, que são muitos, tenha acesso a um instrumento para se defender em tom de igualdade com aqueles que, hoje, estão portando armas de guerra.
Em relação às proposições, Flávio fez um encaminhamento neste ano. A proposta prevê que reuniões, como assembleias de condomínio, possam ser realizadas de forma virtual. O Senado, contudo, aprovou um projeto mais amplo, de autoria do senador Antonio Anastasia (PSD-MG), que prevê que a medida no período de calamidade pública, decretada pela pandemia causada pelo coronavírus.
Longe das telas do Senado, o senador eleito pelo Rio tem sido visto em Brasília desde que a Casa implementou as sessões virtuais. O fato de ser filho do presidente já foi, inclusive, usado por Flávio para tentar se aproximar de alguns colegas senadores. Mas ele tem se mantido à sombra das negociações, conduzidas pelo presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP).
— Ele é respeitoso quando vê os senadores. Não quero ser maldoso, mas é difícil dizer que ele é um parlamentar ativo — avalia o senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR).
Flávio não é visto nem mesmo no WhatsApp pelos seus colegas. O senador não ficou nem um dia no grupo que reúne todos os senadores, criado pelo senador Irajá (PSD-TO) no começo de abril.
— Coloquei Flávio no grupo, como coloquei todos os senadores. Ai, teve uns embates de ideias no início, coisa normal, e ele resolveu sair. Disse que quem quisesse pudesse procurar ele em separado — disse Irajá.
Segundo o senador, embora Flávio tenha se disponibilizado em ajudar junto ao governo, ele nunca o procurou para pedir nada. Quem também diz que nunca pediu ajuda a Flávio é Esperidião Amin, que chegou a viajar para a China com Flávio em uma comitiva:
— Foi a vez que mais vi ele. Ele sempre foi cordial e respeitável, cumprimentava a todos. Não sei se dá para dizer que é um bom político, porque isso é abrangente demais.