Poucas vezes Brasília havia experimentado tamanha tensão. Com a Lava-Jato correndo havia um ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) preparava a revelação da primeira leva de políticos citados no bilionário esquema de corrupção. Alheio à expectativa, o ministro Teori Zavascki escutava canto gregoriano em sua sala enquanto assinava uma a uma as aberturas de inquérito. Às 20h38min daquela sexta-feira, 6 de março de 2015, vieram enfim a público os nomes das 55 pessoas investigadas pelo então procurador-geral da República Rodrigo Janot.
Cinco anos depois, apenas dois processos da “lista de Janot” tiveram veredito. Ex-deputado federal, Nelson Meurer (PP-SC) foi condenado e preso. Já a deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR) foi inocentada. Dos 21 inquéritos restantes, oito foram arquivados, dois seguem tramitando e outros 11 deram origem a sete ações penais que aguardam julgamento.
Meurer foi considerado culpado por corrupção e lavagem de dinheiro em 29 de maio de 2018. A decisão unânime da Segunda Turma do STF ocorreu 1.183 dias após a chegada da lista à Corte. Acusado de receber R$ 29,7 milhões em propina, Meurer foi sentenciado a 13 anos de cadeia. O filho dele, Nelson Meurer Júnior, pegou quatro anos de prisão.
Mesmo condenado em última instância, o político continuou recorrendo e só foi recolhido em outubro do ano passado, quando Fachin emitiu ordem de prisão após considerar os recursos protelatórios. Desde então, ocupa uma cela da Penitenciária de Francisco Beltrão, no sudoeste do Paraná. Meurer Júnior estava no semiaberto, mas na última quinta-feira (5) recebeu permissão para cumprir o resto da pena em casa, com tornozeleira eletrônica.
A absolvição de Gleisi ocorreu em junho de 2018. Ela e o então marido, o ex-ministro Paulo Bernardo, foram acusados de receber R$ 1 milhão. Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), o dinheiro teria sido desviado da Petrobras para a campanha da petista ao Senado, em 2010.
Eles foram absolvidos por unanimidade das acusações de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O relator da ação, Edson Fachin, e o revisor, Celso de Mello, votaram pela condenação do casal por caixa 2, mas os outros três ministros da Segunda Turma também rejeitaram essa tipificação.
As ações penais de Meurer e Gleisi foram as únicas da lista de Janot julgadas pelo STF até hoje. Quatro inquéritos foram arquivados — três deles a pedido do próprio procurador — e outros três tiveram denúncias rejeitadas. Somente um ainda tramita na Corte, sem apresentação de denúncia ou pedido de arquivamento. Há outros cinco processos criminais no Supremo, dos quais três estão prontos para julgamento.
A letargia na condução dos casos contrasta com o ambiente criado no país naquele 6 de março. Quando remeteu a documentação ao gabinete de Teori, Janot pediu a abertura de 21 inquéritos. Entre os alvos estavam proeminentes autoridades da República, como os então presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ), e o do Senado, Renan Calheiros (MDB-AL).
Ciente do teor explosivo da lista, Teori vinha sofrendo pressões de todo o espectro político e queria evitar espetacularizações. Para impedir vazamentos e registros fotográficos, o ministro pediu que os documentos fossem entregues no STF com total discrição. Dessa forma, por volta das 20h de 3 de março uma caminhonete branca sem qualquer identificação da PGR ingressou por uma garagem lateral da Corte.
Os procuradores desceram com os carrinhos lotados de processos, embarcaram nos elevadores privativos dos ministros e saíram direto no gabinete de Teori. Ele levaria três dias concluindo a análise da papelada para determinar a investigação de 46 pessoas.
Além de Cunha e Renan, estavam na lista integrantes de oito partidos, entre eles a cúpula do MDB, do PT e nada menos do que 31 parlamentares do PP, incluindo toda a bancada gaúcha do partido — contra a qual mais tarde a investigação seria arquivada.
Um a um, nomes eram revelados pelo enxame de jornalistas que se acotovelavam no comitê de imprensa do STF, provocando o primeiro terremoto político da Lava-Jato. Meia década depois, o turbilhão pouco avançou nos escaninhos do Judiciário. O chamado inquérito-mãe da Lava-Jato, que abrigava 38 políticos e dos quais quatro se tornaram réus, ainda hoje nem sequer foi reclassificado como ação penal.
Situação dos inquéritos
Em 6 de março de 2015, o STF determinou a abertura de 21 inquéritos contra 46 das 55 pessoas. Outras duas investigações haviam sido formalizadas dias antes. Veja o que aconteceu com os 23 inquéritos e quais políticos estavam em cada um
- 5 foram arquivados: Antonio Anastasia (PSDB-MG); Roseana Sarney e Edison Lobão (ambos do MDB-MA); Lindbergh Farias (PT-RJ); Simão Sessim (PP-RJ); e José Mentor (PT-SP)
- 3 denúncias foram rejeitadas e arquivadas: Arthur Lira e Benedito Lira (PP-AL); José Otávio Germano (PP-RS) e Luis Fernando Faria (PP-MG) e Eduardo da Fonte (PP-PE)
- 1 tramita ainda hoje no STF: Arthur Lira e Benedito Lira (PP-AL)
- 1 foi remetido à 13ª Vara Federal de Curitiba: Humberto Costa (PT-PE)
- 2 se tornaram ação penal e tiveram veredito: Nelson Meurer (PP-PR) foi condenado e cumpre pena de 13 anos e nove meses de prisão e Gleisi Hoffmann (PT-PR) foi inocentada por unanimidade
- 11 se tornaram 7 ações penais em andamento: Aníbal Gomes (MDB-CE) aguarda julgamento no STF; João Pizzolatti (PP-SC) e José Otávio Germano (PP-RS) aguardam julgamento na Justiça Federal de Curitiba; Vander Loubet (MDB-MS) aguarda julgamento no STF; Eduardo da Fonte (PP-PE), Arthur Lira (PP-AL), Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e Ciro Nogueira (PP-PI) se tornaram réus, mas o processo ainda não foi reclassificado como ação penal; Valdir Raupp (MDB-RO) aguarda julgamento no STF; Fernando Collor (PTC-AL) aguarda julgamento no STF; e Eduardo Cunha (MDB-RJ) aguarda julgamento na Justiça Federal de Curitiba