O presidente Jair Bolsonaro acusou, nesta segunda-feira (16), a cúpula do Poder Legislativo federal de ter iniciado contra ele uma "luta de poder". Em entrevista por telefone à Rádio Bandeirantes, de São Paulo, ele disse que tem sido ameaçado "o tempo todo", que não existem hoje elementos para a abertura formal de um processo de impeachment contra ele, e que seria golpe de Estado isolá-lo.
— Não pode um chefe do Poder Executivo viver ameaçado o tempo todo. Seria um golpe isolar o chefe do Poder Executivo por interesses outros que não sejam os republicanos — afirmou.
Em um referência a Fernando Collor e a Dilma Rousseff, presidentes que sofreram processos de impeachment, Bolsonaro disse que não foi nem acusado de corrupção nem cometeu irregularidades na área fiscal.
— Eu não abuso e não tenho qualquer envolvimento com corrupção. E terceiro fato: um impeachment só pode haver, no meu entender, se o povo estiver favorável a isso. Não existe nenhum ingrediente no tocante a isso daí.
Para o presidente, houve motivação política nas críticas feitas contra ele pelos presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), por sua participação em manifestação neste domingo (15), apesar das recomendações do Ministério da Saúde para evitar aglomerações.
— Nós estamos em uma briga pelo poder e vou ser fiel àquilo que eu sempre tive com a população brasileira. Não dá para querer jogar nas minhas costas uma possível disseminação do vírus — disse.
Atos no dia 15 de março
Neste domingo, Bolsonaro estimulou as manifestações em diferentes pontos do país com gritos de guerra e faixas em defesa do governo federal, com uma série de ataques ao Congresso e ao Supremo Tribunal Federal (STF). O presidente incentivou os atos desde cedo nas redes sociais foram ao menos 42 postagens sobre o tema.
Sem máscara, participou de manifestações, tocando simpatizantes e manuseando o celular de alguns apoiadores para fazer selfies. "Isso não tem preço", disse, durante transmissão ao vivo pelas redes sociais. Na entrevista, o presidente ressaltou ainda que sofreu um "ataque frontal" de Maia e emendou que nunca o tratou "dessa maneira". Ele reclamou que o Poder Legislativo não tem aprovado projetos simples enviados pelo governo.
— Até as coisas simples que a gente manda para o Congresso Nacional não vão para frente. O que quero do Parlamento é que ele vote. Agora, tem um jogo de interesse muito grande. Não quero ser melhor que o Maia ou o Alcolumbre. Eu quero que nós aprovemos as questões que interessam à população — afirmou.
Bolsonaro disse ainda que tem havido uma "crítica enorme" à postura de Maia e que já o aconselhou a tentar reverter o quadro atual. Ele apontou como um dos motivos do desgaste a disputa entre Executivo e Legislativo pela gestão de R$ 30 bilhões do orçamento impositivo.
— Qual o interesse dessas lideranças políticas? É uma luta de poder e uma irresponsabilidade de algumas pessoas. E eles posando como mártires.
O presidente voltou a dizer que não houve acordo sobre a divisão do montante, apesar de ele ter enviado ao Congresso propostas propondo a repartição, e criticou o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, responsável pela articulação política.
— O defeito dele é ser muito inexperiente ainda. Mas ele esta vendo essa questão. Talvez o Ramos tenha se perdido um pouco pela sua imaturidade, inocência e até pela sua honestidade — disse.
Em um ataque ao governador de São Paulo, João Doria (PSDB), o presidente disse que uma crise econômica neste momento, causada pela pandemia no coronavírus, interessa a seus adversários para a sucessão de 2022.
— O que está em jogo é o poder. Alguns estão em campanha eleitoral, esperando 2022. É toda hora pancada em mim. Essa campanha o tempo todo para desgastar o governo é para prejudicar o Brasil — afirmou.
Na entrevista, o presidente disse também que não foi só ele quem participou de aglomerações e lembrou da presença de políticos e autoridades na festa de lançamento da CNN Brasil, que reuniu na capital paulista cerca de 1.300 pessoas, na semana passada. Além de Maia e Alcolumbre, estiveram presentes no encontro, promovido no Parque do Ibirapuera, o presidente do STF, José Antonio Dias Toffoli, e o vice-presidente da república, Hamilton Mourão.
— Que exemplos as pessoas estavam dando no tocante a essa manifestação? Agora, não vou partir para a hipocrisia na Oca do Ibirapuera. A elite politica pode reunir 1.300 pessoas e não posso ficar perto do povo — questionou.
Nesta segunda-feira (16), apesar dos ataques, Bolsonaro afirmou à rádio que pretende se aproximar do Legislativo. Pouco depois da entrevista, o apresentador José Luiz Datena conversou com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que evitou partir para o confronto e defendeu que os Poderes trabalhem juntos para conter a crise provocada pelo coronavírus.
— Neste momento, independentemente do que aconteceu de hoje para trás, nós precisamos estar unidos para organizar as soluções para reduzir o impacto da chegada do coronavírus do Brasil.
Maia se defendeu ainda de uma crítica que Bolsonaro fez sobre a participação do presidente da Câmara em um evento ao lado do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), em São Paulo, na segunda-feira passada (9):
— O mais importante é que naquele momento não havia o crescimento do vírus, como começou a crescer na quinta e na sexta, e principalmente depois da live feita pelo presidente com seu ministro da Saúde, pedindo que dali para a frente se evitassem as aglomerações. O que nós precisamos, em prol da sociedade brasileira, é esquecer nossas diferenças politicas, as nossas divergências, e vamos olhar para o problema do povo.
Em resposta às críticas do ministro Paulo Guedes (Economia), Maia disse que as reformas caminham de acordo com o cronograma. Segundo ele, a tributária deve ser votada em maio, embora tenha reiterado que o governo ainda não enviou sua parte da proposta.
Maia ressaltou ainda que o Congresso precisa estar pronto para votar as medidas emergenciais encaminhadas pelo governo para enfrentar a doença. Os acordos poderiam ser feitos por WhatsApp e a votação em plenário seria simbólica, afirmou.
O protesto que ocorreu no domingo (15) estava previsto desde o fim de janeiro, mas mudou de pauta e foi insuflado após o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, ter chamado o Congresso de chantagista na disputa entre Executivo e Legislativo pelo controle do orçamento deste ano. Na última quarta-feira (11), a Comissão Mista de Orçamento aprovou dois projetos de lei enviados pelo governo que repartem com o Congresso cerca de R$ 15 bilhões dos R$ 30,8 bilhões. Os dois textos, agora, vão a plenário do Congresso, e a discussão continua.
Durante o Carnaval, Bolsonaro compartilhou em um grupo de aliados um vídeo que convocava a população a ir às ruas para defendê-lo. Na semana seguinte, em discurso, chamou a população a participar do ato, o que mais uma vez irritou as cúpulas do Congresso e do Supremo. Além de apoiar o presidente, os organizadores da manifestação sempre carregaram bandeiras contra o Legislativo e o Judiciário e a favor das Forças Armadas. Nas redes sociais, usuários compartilharam convocações com mensagens autoritárias, pedindo, por exemplo, intervenção militar.
Antes de falar à rádio, Bolsonaro voltou a minimizar a pandemia do coronavírus e disse nesta segunda-feira (16) que a crise mundial "não é isso tudo que dizem". Na entrada do Palácio da Alvorada, onde parou para conversar com um grupo de eleitores, ele ficou distante dos apoiadores e evitou dar as mãos, apesar de não ter seguido essa recomendação no protesto de domingo (15).
O presidente afirmou ainda que a epidemia da doença na China, considerado o epicentro da doença, está "praticamente acabando". O país asiático teve até agora 81 mil casos confirmados de coronavírus, com 3.204 mortos. No mundo, são 6.513 mortos até agora.
— Foi surpreendente o que aconteceu na rua. Até com esse superdimensionamento. Tudo bem que vai ter problema. Vai ter. Quem é idoso e está com problema ou deficiência. Mas não é isso tudo que dizem. Até que na China já está praticamente acabando — afirmou.
No Brasil, segundo o Ministério da Saúde, já há 200 casos confirmados. E a previsão é de que o número apresente um grande aumento nas próximas semanas, atingindo um pico no país.
Na entrada da residência oficial, o presidente chamou os veículos de imprensa de mentirosos e disse que nunca defendeu o fechamento do Legislativo ou do Judiciário. No protesto convocado pelo presidente, no entanto, havia cartazes e faixas contra os dois poderes.
— Imprensa mentirosa aí. Capa dos jornais aí falando que eu estou falando para fechar o Congresso ou Supremo. Nunca falei isso, nada. Tudo é mentira. O tempo todo.
No domingo (15), o presidente criticou o interesse do Congresso em controlar cerca de R$ 15 bilhões do Orçamento 2020 e mandou os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a irem às ruas. Em entrevista à CNN Brasil, ele também chamou de "extremismo" e "histeria" medidas adotadas diante da pandemia do coronavírus. Bolsonaro foi duramente criticado por ter estimulado as manifestações.