Em sua live semanal, o presidente Jair Bolsonaro cobrou do Congresso a aprovação de projetos enviados pelo governo e negou que tenha incitado a população a ir às ruas a protestos contra o Legislativo.
Sob críticas de congressistas e do Judiciário, o presidente tem sido pressionado a tentar aplacar uma crise política que iniciou quando ele compartilhou um vídeo em apoio a uma manifestação convocado para 15 de março contra o Congresso.
Nesta quinta (27), Bolsonaro negou que esteja criando um ambiente público contra os demais Poderes, mas enumerou uma série de medidas do governo que, segundo ele, não avançam no Congresso.
— Gostaria de fazer muita coisa pelo Brasil, mas estou há seis meses com um projeto de lei dentro da Câmara para que a validade da carteira de motorista passe de cinco para dez anos, mas não vai para frente. Estou também há seis meses com um projeto fazendo com que você perca a sua carteira depois de completar 40 pontos no ano, e não 20, como é atualmente — disse.
Bolsonaro disse estar apanhando de "praticamente quase toda a mídia brasileira" por ter compartilhado o vídeo pelo WhatsApp. Acrescentou que "estão falando em impeachment". Horas antes, o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), disse que o afastamento é a resposta jurídica para a atitude do presidente sobre a divulgação do vídeo.
— Agora estão falando em impeachment. O vídeo não tem nada contra o Congresso nem contra o Supremo Tribunal Federal. Não vou renunciar meu mandato, não vou gastar R$ 1 bilhão com a imprensa, com os problemas que eu tenho.
A preocupação do presidente é que o episódio dos protestos inviabilize de vez propostas de interesse do governo neste ano.
— Fui parlamentar por 28 anos, não estou inventando nada, e não estou ofendendo o parlamento brasileiro, muito pelo contrário, quero um parlamento independente e atuante. E a Justiça também, independente e atuante. E o Executivo também, nós somos independentes. Não existe qualquer crítica a eles, agora, eu tenho que dar uma satisfação porque, na ponta da linha, o povo cobra muito mais de mim do que do Legislativo ou do Judiciário — disse.
Na live, o presidente voltou a falar que não há crise.
— Nós estamos cada vez mais próximos de chegar a essa união, as nossas decisões ajudam o Brasil, e não podemos ficar como, infelizmente, não os presidentes dos Poderes, eu não vi nenhum presidente de Poder falar sobre essa questão do dia 15, que eu estaria estimulando um movimento contra o Congresso e contra o Judiciário, não existe isso. Agora, nós não podemos nos envenenar com essa mídia podre que nós temos ai, em grande parte, podre que nós temos aí.
Nas redes sociais, usuários compartilharam convocações para o dia 15 com mensagens autoritárias, pedindo, por exemplo, intervenção militar.
O protesto estava previsto desde o fim de janeiro, mas mudou de pauta e foi insuflado após o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, ter chamado o Congresso de chantagista na disputa entre Executivo e Legislativo pelo controle do Orçamento deste ano.
Sem citar diretamente o vídeo compartilhado por Bolsonaro, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro José Dias Toffoli, afirmou que não há democracia sem um Legislativo atuante e um Judiciário independente.
Já o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), cobrou respeito às instituições democráticas e disse que criar tensão institucional não ajuda o país a evoluir. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), não comentou.
— O recado para a imprensa: não vou desistir, vou buscar fazer tudo aquilo que eu falei durante a campanha. Eu não vou criticar o parlamento, assim como eu não critico decisão do Supremo Tribunal Federal. Agora, nós temos que insistir, persistir, o que eu gostaria do Parlamento é que bote em pauta. Se a maioria falar que não, enterrou o projeto. Encerra o assunto. Agora, caducar uma medida provisória, não botar em pauta, é triste isso aí — afirmou.
— Há três dias eu tô apanhando da mídia, Jornal Nacional, Folha, Estado, Globo, eu acho que praticamente quase toda a mídia brasileira: "Eu disparei trilhões de zap pedindo aí o apoio de todos à manifestação de 15 de março". O que eu mandei para poucas dezenas de pessoas do meu ciclo de amizade, eu mando sem filtro. São ministros, algumas personalidades, talvez não passe de 50, 60, tá certo? E a Vera Magalhães teria... Olha só, Vera, como eu sou legal contigo... Teria recebido um vídeo eu pedindo, sim, o apoio para a manifestação de 15 de março de 2015 — disse.
A notícia de que Bolsonaro compartilhou um vídeo sobre os atos contra o Congresso foi revelada pela jornalista Vera Magalhães, do jornal O Estado de S. Paulo, que se tornou alvo de ofensas do presidente e de seus apoiadores.
Nesta quinta, no Palácio da Alvorada, Bolsonaro afirmou que a jornalista mentiu sobre o caso.
— A Vera mentiu. Eu quero que a Vera mostre o vídeo em que eu estou convocando as pessoas — disse.
Diferentemente do que diz o presidente, a jornalista não disse que Bolsonaro compartilhou um vídeo em que ele próprio convocava a população para o ato de 15 de março. A reportagem informava que o vídeo compartilhado pelo presidente fazia uma convocação para os protestos.
O vídeo em questão também não é de cinco anos atrás -traz, inclusive, menções à facada sofrida por ele em 2018.
O jornal divulgou uma nota repudiando os ataques.
"O Estado de S. Paulo lamenta que o Presidente da República ataque a jornalista Vera Magalhães acusando-a de mentir por ter revelado que ele divulgou via WhatsApp um vídeo conclamando a participação nas manifestações previstas para o próximo dia 15 de março. Ao agir assim, ignorando os fatos, endossa conteúdos falsos vinculados ao tema que circulam nas redes sociais, algumas com ameaças veladas ou não direcionadas à Vera Magalhães."
Bolsonaro ainda cobrou que a jornalista divulgue o vídeo, afirmando que ela publicou apenas um print. Contudo, os vídeos foram publicados por ela — em seu perfil no Twitter — e por demais repórteres.