O presidente Jair Bolsonaro encaminhou a amigos vídeo que convoca a população a ir às ruas no dia 15 de março para defender seu governo. A informação foi confirmada pelo ex-deputado federal Alberto Fraga (DF), que recebeu o arquivo do presidente.
— Recebi um vídeo, ele (o presidente) me encaminhou. Mas não foi ele que fez o vídeo. Confesso que não entendi assim (como um incentivo ao ato). Ele nunca fez esse tipo de pedido. Quem está fazendo isso são os bolsonarianos pelas redes sociais. Para mim, mesmo, ele não falou absolutamente nada — disse Fraga, que é amigo do presidente, ao jornal Folha de S.Paulo.
Um outro vídeo, diferente do recebido por Fraga, mas exaltando a manifestação e adotando tom mais dramático, também foi compartilhado por Bolsonaro, conforme o jornal O Estado de S. Paulo.
Liderada por parlamentares bolsonaristas e ativistas conservadores, a convocação tem causado controvérsia e repúdio, até entre aliados do presidente, porque agrega bandeiras de extrema-direita, contrárias ao Congresso e ao Supremo Tribunal Federal (STF).
A mobilização vem na esteira de uma fala do chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, que chamou o Congresso de “chantagista” na semana passada. O ato estava previsto desde o final de janeiro, mas acabou mudando de pauta para apoio a Bolsonaro e encorpando insinuações autoritárias após Heleno atacar o Legislativo.
Por redes sociais e WhatsApp, apoiadores do presidente postam imagens de ataque ao Congresso, retirada dos dirigentes da Câmara e do Senado e de alusão ao uso das Forças Armadas no movimento.
Ao menos seis congressistas bolsonaristas já manifestaram apoio à mobilização: Carla Zambelli (PSL-SP), Filipe Barros (PSL-PR), Guiga Peixoto (PSL-SP), Aline Sleutjes (PSL-PR), Delegado Éder Mauro (PSD-PA) e a senadora Soraya Thronicke (PSL-MS).
Os atos podem azedar ainda mais a relação entre o Palácio do Planalto e o Congresso. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), disse na semana passada que “nenhum ataque à democracia será tolerado pelo parlamento”.
Críticas
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que na última semana já havia afirmado que o chefe do GSI havia se transformado em um “radical ideológico contra a democracia”, afirmou na segunda-feira que a atuação do Legislativo não é de “parlamentarismo branco”, mas “apenas responsabilidade com os brasileiros”.
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), já chamou a manifestação do dia 15 de “inoportuna”. Nas redes sociais, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) criticou o ato de Bolsonaro de compartilhar um vídeo com convocações. “A ser verdade, como parece, que o próprio Pr (presidente da República) tuitou convocando uma manifestação contra o Congresso (a democracia) estamos com uma crise institucional de consequências gravíssimas. Calar seria concordar. Melhor gritar enquanto de tem voz, mesmo no Carnaval, com poucos ouvindo”, escreveu o tucano. Diferentemente do que disse FHC, contudo, Bolsonaro não tuitou o vídeo, mas encaminhou a amigos.
Políticos de oposição também se manifestaram. Ciro Gomes (PDT) afirmou que é preciso "lutar pela preservação da Constituição e do Brasil", e espera que Rodrigo Maia e Alcolumbre "saibam reagir a mais essa ameaça". Fernando Haddad (PT) disse que "Bolsonaro, ao que tudo indica, cometeu crime de responsabilidade previsto na Constituição que jurou respeitar".
Mudança na pauta
Inicialmente, a manifestação serviria para defender a proposta que determina a execução da pena de prisão após condenação em segunda instância e recolher assinaturas para a Aliança pelo Brasil, partido que Bolsonaro tenta criar. A fala do general Heleno, porém, foi interpretada por bolsonaristas como uma convocação. De acordo com representantes de ativistas conservadores, mais de 60 cidades já confirmaram atos no dia 15.
Em uma das postagens de apoiadores de Bolsonaro, as imagens de Heleno e do vice Hamilton Mourão aparecem ao lado de outros dois militares com a frase: “Os generais aguardam as ordens do povo. FORA Maia e Alcolumbre”.
O recente embate entre governo e Congresso começou após a aprovação do orçamento. A dificuldade em se chegar a um acordo sobre a divisão do dinheiro do orçamento impositivo elevou a temperatura entre Executivo e Legislativo.
Pessoas ligadas a Bolsonaro chegaram a chamar de “golpe do parlamentarismo branco” a insistência dos congressistas em ficar com a gestão de mais de R$ 30 bilhões do total de R$ 80 bilhões que, pelas projeções, estão livres para serem gastos em 2020.