Relator das ações que discutem a constitucionalidade da prisão de condenados em segunda instância, o ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou por alterar a jurisprudência atual e só autorizar que réus sejam presos após o trânsito em julgado — o esgotamento dos recursos nas instâncias superiores.
Em um voto curto, de 11 páginas, Marco Aurélio afirmou que a Constituição é clara ao estabelecer, em seu artigo 5º, que um cidadão só pode ser considerado culpado após sentença condenatória transitada em julgado.
Se houver a necessidade de prender um condenado antes disso — porque ele representa risco à sociedade ou pode fugir da aplicação da lei, por exemplo —, os juízes podem decretar a prisão preventiva, conforme é previsto na lei.
O Supremo julga nesta quarta-feira (23) três ações que debatem a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal, segundo o qual ninguém pode ser preso antes do trânsito em julgado (o fim dos recursos).
— O princípio da não culpabilidade é garantia vinculada, pela Lei Maior, à preclusão, de modo que a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal não comporta questionamentos. O preceito consiste em reprodução de cláusula pétrea — disse Marco Aurélio.
— A determinação constitucional não surge desprovida de fundamento. Coloca-se o trânsito em julgado como marco seguro para a severa limitação da liberdade, ante a possibilidade de reversão ou atenuação da condenação nas instâncias superiores.
O relator também votou por soltar todas as pessoas que tenham sido presas por causa de condenação em segundo grau, exceto as que se enquadram nos critérios da prisão preventiva.
Um dos beneficiados pode ser o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), preso desde abril de 2018 em Curitiba depois de ter sido condenado em segunda instância na Lava-Jato, acusado de corrupção e lavagem de dinheiro no caso do triplex de Guarujá (SP).
Posteriormente, em abril deste ano, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), que é visto como uma terceira instância, manteve a condenação do petista, fixando a pena em 8 anos, 10 meses e 20 dias de prisão.
Além de Lula, uma eventual mudança no entendimento do STF teria o potencial de beneficiar 4.895 réus que tiveram a prisão decretada após serem condenados em segundo grau, de acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).