Em meio à tensão entre Congresso e Judiciário, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), prepara o arquivamento de uma nova comissão parlamentar de inquérito (CPI) articulada para investigar os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). De autoria do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), o requerimento será protocolado nesta terça-feira (3).
A investida tem origem no movimento "Muda Senado, Muda Brasil". Formado por 21 senadores, o grupo está disposto a enfrentar Alcolumbre para dar vazão às investigações. Na quinta-feira, conseguiu as 27 assinaturas necessárias para o pedido de CPI. Até então, tinha o apoio de 21 nomes, mas fez esforço intensivo para pelo menos conseguir apresentar o documento.
A partir desta terça, os parlamentares irão se revezar na tribuna exigindo a instalação da CPI. Será a terceira tentativa de criar uma comissão para emparedar o STF. Dessa vez, o requerimento cita expressamente o presidente da Corte, Dias Toffoli, como um dos alvos. A justificativa é a instauração do inquérito, aberto por ofício pelo ministro, para investigar fake news e ataques à honra dos membros do tribunal. Os senadores também miram em Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes.
— Queremos investigar por que Gilmar liberou tanta gente, como Toffoli usurpou o papel do Ministério Público e instaurou o inquérito e como Alexandre de Moraes passou a presidir a investigação. A finalidade é cassar ministros – admite Lasier Martins (Podemos-RS), segundo vice-presidente do Senado e um dos líderes do movimento.
Se depender de Alcolumbre, a iniciativa não irá prosperar. Na mesma quinta-feira em que o Muda Senado conseguia as 27 assinaturas, o presidente da Casa afirmou a interlocutores que iria fazer o que fosse possível para não deixar o pedido avançar. Alcolumbre sustenta que é preciso preservar o equilíbrio institucional e que não pode fazer a Casa perder tempo discutindo impeachment de ministros do STF enquanto a economia patina e há milhões de desempregados.
O presidente da Casa já arquivou dois requerimentos semelhantes e mantém engavetados 12 pedidos de impeachment de ministros, todos protocolados nos últimos sete meses, volume considerado recorde. Às vésperas do fim da legislatura passada, em janeiro, o então presidente do Senado Eunício Oliveira (MDB-CE) havia sepultado 33 processos acumulados em quatro anos.
Argumentos
Para engavetar as CPIs, Alcolumbre tem recorrido aos próprios assessores. Foi assim em março, quando acatou uma nota técnica da consultoria legislativa do Senado que sugeria o arquivamento com a justificativa de que a “atividade jurisdicional está fora do alcance das comissões parlamentares de inquérito”. Pelo regimento interno da Casa, a mesa diretora tem poder para rejeitar ou acolher pedidos de CPIs, mas desde a posse, em fevereiro, Alcolumbre não reuniu o colegiado.
— É uma sutileza malandra. Ele manda o pedido para uma consultoria que foi nomeada por ele e não reúne a mesa. É acomodado e acomodador — reclama Lasier.
Na semana passada, Jorge Kajuru (Patriotas-GO) se antecipou e ingressou com mandado de segurança no STF exigindo a instalação da CPI. O pedido de liminar, ainda sem decisão, caiu nas mãos de Gilmar Mendes, um dos maiores desafetos do Muda Senado e alvo de impropérios do próprio Kajuru. Em mais de uma oportunidade, o ministro foi chamado pelo senador de “ladrão, canalha, safado” e acusado pelo vender sentenças.
Diante de tanta fuzilaria, Toffoli considera Alcolumbre seu principal aliado em busca de proteção institucional. Além de poder criar uma CPI com 27 assinaturas — ante as 171 exigidas na Câmara —, é do Senado a missão constitucional de fiscalizar o STF, com outorga para barrar nomeações e instaurar processos de impeachment dos ministros. Até mesmo a nova legislação sobre abuso de autoridade é vista com simpatia pela maioria da Corte. Para esse grupo, embora a lei tenha sido motivada por ressentimento, é salutar para coibir desmandos e reequilibrar o jogo de forças após o que foi considerado ativismo desmedido da Justiça Federal do Paraná e do Ministério Público Federal na condução da Lava-Jato.
As polêmicas
Congresso
CPI do STF - Em sua terceira investida, um grupo de senadores tenta emplacar uma CPI para investigar atos de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Nas duas iniciativas anteriores, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, arquivou os pedidos após parecer da consultoria da Casa.
Abuso de autoridade - Aprovada pelo Senado em 2018, a nova legislação sobre abuso de autoridade passou na Câmara e foi enviada ao Palácio do Planalto para sanção presidencial. O pacote foi aprovado em meio ao desgaste da Lava-Jato após a revelação das conversas da força-tarefa.
Judiciário
Investigação do Coaf - Em pleno recesso do Judiciário, Dias Toffoli suspendeu todas as investigações em curso no país que tivessem colaboração do Coaf, órgão que fiscaliza transações financeiras e agora chama-se UIF. A decisão beneficiou principalmente o senador Flávio Bolsonaro (PSC-RJ), suspeito de ficar com parte do salário de assessores.
Inquérito das fake news - Ocupando o papel do Ministério Público, Dias Toffoli instaurou de ofício inquérito para investigar fake news e ataques à honra dos colegas de Corte. O expediente foi usado para censurar o site O Antagonista e a revista Crusoé, que haviam publicado reportagens contra o próprio Toffoli.