Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Dias Toffoli defendeu, em entrevista ao jornal Valor Econômico publicada nesta quinta-feira (18), a censura determinada pela corte à revista Crusoé e ao site O Antagonista.
— Se você publica uma matéria chamando alguém de criminoso, acusando alguém de ter participado de um esquema, e isso é uma inverdade, tem que ser tirado do ar. Ponto. Simples assim— disse Toffoli, que completou: — É necessário mostrar autoridade e limites. Não há que se falar em censura neste caso.
Os veículos censurados publicaram textos com uma menção a Toffoli feita pelo empresário e delator Marcelo Odebrecht em um email de 2007, quando o atual presidente do Supremo era chefe da Advocacia Geral da União (AGU) no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010).
No email, enviado agora à Polícia Federal pelo empresário no âmbito de uma apuração da Lava-Jato no Paraná, Marcelo Odebrecht pergunta a dois executivos da empreiteira: "Afinal vocês fecharam com o amigo do amigo de meu pai?". Não há menção a pagamentos ou irregularidades.
A decisão de censura a revista e o site é do ministro Alexandre de Moraes, que atendeu a um pedido de Toffoli na sexta-feira (12), no âmbito de um inquérito aberto pelo STF em março para apurar fake news e divulgação de mensagens que atentem contra a honra dos integrantes do tribunal. O site foi notificado na manhã desta segunda-feira (15).
Entidades de defesa da liberdade de imprensa e advogados que pesquisam o tema criticaram a decisão. Para as organizações, a determinação caracteriza censura, põe em risco um direito constitucional e merece repúdio.
Nesta quarta-feira (17), Toffoli disse ao jornal que o documento com o apelido "não diz nada com nada".
— Daí tirem as suas conclusões. Era exatamente para constranger o Supremo. Quando eu era ministro, sem ser presidente, nunca entrei com ação (contra uma publicação), nunca reclamei. Mas agora é uma questão institucional. Ao atacar o presidente, estão atacando a instituição.
De acordo com Toffoli, a revista e o site publicaram essa informação sobre o apelido para constranger o Supremo dias antes de a corte analisar a possibilidade de prisão após condenação em 2ª instância.
— É ofensa à instituição à medida que isso tudo foi algo orquestrado para sair às vésperas do julgamento em segunda instância. De tal sorte que isso tem um nome: obstrução de administração da Justiça.
Segundo o diretor da revista Crusoé, Rodrigo Rangel, "a reportagem descreve o teor de um documento constante dos autos da Lava-Jato, contextualizando as informações nele contidas, sem fazer juízo de valor nem acusações ao ministro". "E não há, no texto, qualquer tipo de ofensa ao Supremo Tribunal Federal", afirma Rangel.
Desgaste
Sete meses depois de assumir a presidência do STF, o ministro Dias Toffoli enfrenta desgaste interno por causa do inquérito aberto por ele para apurar fake news e ofensas aos integrantes da corte. Um cenário que o deixa diante da perspectiva de uma derrota particular em plenário.
A polêmica atingiu seu ápice nesta semana e pôs o STF no centro do noticiário, contrariando o discurso de posse de Toffoli de que ele faria a corte submergir e pacificaria a relação com outras instituições.
Nos bastidores, ministros se dizem preocupados com a onda de ataques nas redes sociais ao tribunal. Mas o meio empregado por Toffoli para combater os ataques — o inquérito aberto sem provocação de outro órgão e sem participação da Procuradoria-Geral da República — dividiu a corte.
O episódio de segunda (15), de censura aos sites, aprofundou o desgaste interno e pode levar o plenário a rever medidas tomadas por Toffoli e pelo ministro Alexandre de Moraes, que preside a investigação sobre fake news.
Alguns magistrados tentam se descolar do caso. Quando a investigação foi aberta, em março, houve quem apoiou publicamente a iniciativa, como Celso de Mello. Reservadamente, um magistrado disse que a situação o envergonha.
Já o ministro Marco Aurélio tem vocalizado as principais críticas. Para ele, desde que o inquérito foi iniciado, as normas não foram seguidas. Há duas semanas, o ministro ironizou o discurso de posse de Toffoli e disse que o submarino que faria o STF submergir "talvez esteja avariado".
Na terça (16), a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, enfrentou o STF e, numa manifestação a Moraes, afirmou ter arquivado o inquérito. Quatro horas depois, o ministro rebateu afirmando que a medida da PGR não tinha respaldo legal.
A investigação foi prorrogada por 90 dias. Conforme a decisão, só depois desse prazo Dodge poderá ver o procedimento, que é sigiloso. Os termos duros usados pela procuradora-geral foram vistos como um aceno dela para os membros de sua carreira --a cinco meses do fim de seu mandato no comando do órgão. A PGR pode recorrer da decisão de Moraes que rejeitou o arquivamento.