O Supremo Tribunal Federal (STF) marcou para esta quarta-feira (13) a discussão sobre o primeiro de uma série de assuntos relacionados à pauta de costumes. Há, aí, um potencial para colocar a Corte em colisão com parte do Congresso e com o Palácio do Planalto. No plenário, ministros vão julgar duas ações que pedem a criminalização da homofobia, tema controverso entre parlamentares e que permeou a campanha eleitoral.
Os julgamentos testarão as relações entre o tribunal e o Congresso no momento em que senadores miram a Corte e chegaram a articular a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o "ativismo judicial" de ministros — proposta que foi engavetada na segunda-feira (11). Na "pauta de costumes" definida pelo presidente do STF, Dias Toffoli, o julgamento de ações do PPS e da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT) sobre a discriminação contra homossexuais e transexuais terá prioridade.
O partido e a entidade querem que o Supremo não apenas declare o Congresso omisso por não ter votado projeto de lei que criminaliza a homofobia, mas também dê um prazo final para que os parlamentares aprovem uma legislação criminal que puna especificamente violência física, discursos de ódio e homicídios por causa da orientação sexual da vítima.
A proposta sofre resistência das bancadas evangélica e do PSL —partido de Jair Bolsonaro —, que veem na medida uma forma de proibir pastores de pregarem contra a homossexualidade em templos religiosos.
Durante a campanha presidencial, o então candidato Bolsonaro criticou o "coitadismo" de gays ao contestar a adoção de políticas afirmativas para a comunidade LGBT. Eleito, em entrevista ao Jornal Nacional, o presidente mudou o tom e disse que a "agressão contra um semelhante tem que ser punida na forma da lei":
— E, se for por um motivo como esse (ser gay), tem que ter sua pena agravada.
Ministros da Corte afirmam que o Supremo não pode deixar de cumprir o seu papel de defender minorias e zelar pelo cumprimento da Constituição.
— São (temas) de interesse da sociedade. O que nós precisamos no país é de mais segurança jurídica, saber o que pode e o que não pode ocorrer no dia a dia da vida gregária. Não há colisão com o Planalto. O Planalto respeita a atuação do Judiciário e o Judiciário, tanto quanto possível, desde que não seja provocado e não caiba atuar de forma diversa, respeita a atuação (do Planalto) — disse o ministro Marco Aurélio Mello.
Um segundo ministro, que preferiu não se identificar, avaliou que o respeito ao princípio de separação dos poderes "pressupõe independência" e ressaltou que o Supremo não pode se dobrar na defesa dos direitos de minorias. Para um terceiro ministro, o "STF é o STF, independentemente de presidente".
Outras ações
Na pauta do Supremo para este semestre está um pedido do PSL para alterar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e endurecer a punição a jovens infratores. O julgamento está previsto para março. Outra ação, também polêmica e agendada para 22 de maio, tenta criar mais uma condição para aborto legal no país, incluindo a possibilidade para o caso de grávidas infectadas com o vírus da zika.
Os ministros vão apreciar ainda a ação que discute a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal, que já tem três votos a favor no plenário. Para um ministro, esses temas estão colocados na pauta da sociedade e caberá ao Supremo decidi-los, independentemente de pressão da opinião pública ou dos demais poderes. Quanto ao papel das redes sociais, um outro ministro ironizou:
— Não estou nas redes sociais.
Embora se alinhem em questões como a defesa ou a crítica à Lava-Jato, é difícil prever resultados, pois os ministros do STF costumam ter posições bem distintas em temas comportamentais.
Ao definir a pauta, porém, Toffoli deixou de fora ação que trata de projeto similar ao Escola sem Partido em Alagoas. Para ele, essa é uma discussão que provoca "catarse" na sociedade e a Corte deve enfrentá-la apenas depois de amplo debate.