O presidente da República, Jair Bolsonaro, assinou na manhã desta terça-feira (15) o decreto com regras que facilitam a posse de armas no Brasil. O ato foi publicado em edição extra do Diário Oficial da União (DOU) e já está em vigor.
A assinatura do decreto vai além do cumprimento de uma promessa de campanha de Jair Bolsonaro. O forte discurso ligado à segurança pública foi um dos responsáveis pelos mais de 57 milhões de votos que o elegeram. No entanto, oferecer a "oportunidade de legítima defesa ao cidadão de bem" também representa uma estocada nos governos petistas — encarados como inimigos — responsáveis pelo Estatuto do Desarmamento.
Assistido por ministros e deputados da Bancada da Bala do Congresso, o presidente brincou, momentos antes de assinar o documento, que usaria uma "arma", referindo-se à caneta em sua mão, para restabelecer a vontade "soberana" do povo.
— O que nós estamos fazendo aqui nada mais é do que restabelecer um direito decidido nas urnas por ocasião do referendo de 2005. Infelizmente, o governo à época buscou maneiras, com decretos e portarias, de negar este direito — discursou.
Entre as alterações do decreto, está a adoção de critérios explícitos para a análise da Polícia Federal (PF) referente aos motivos alegados por quem deseja comprar uma arma. Até então, se a justificativa apresentada pelo cidadão não fosse considerada suficiente pelo órgão, ele teria o pedido de registro negado.
Na prática, esta alteração facilita a compra de armas por moradores de todo o país, já que coloca como critérios objetivos a residência em qualquer área rural ou em áreas urbanas de Estados com índices superiores a 10 homicídios por 100 mil habitantes, o que contemplaria todas as unidades da federação.
— Todo e qualquer cidadão e cidadã, em qualquer lugar do país, por conta desse dispositivo, tem o direito de ir até uma delegacia de Polícia Federal, levar os seus documentos, pedir autorização, adquirir a arma e poder ter a respectiva posse — confirmou o chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.
O cidadão poderá comprar até quatro armas. O limite é inferior ao que determinava a lei anterior. A situação foi justificada por Bolsonaro:
— Na legislação anterior, se poderia comprar meia dúzia de armas, mas na prática, não poderia comprar nenhuma. Era muito difícil atingir esse objetivo. Com a legislação atual, pode-se comprar até quatro e ele (comprador), preenchendo esses requisitos, cidadão de bem, com toda a certeza, poderá fazer uso dessas armas.
Apesar do limite fixado em quatro armas, quem comprovar a necessidade de aumentar seu arsenal poderá ultrapassar o teto. Como exemplo, o presidente citou produtores rurais que possuam mais de quatro propriedades e que, para segurança, poderão solicitar um equipamento para cada uma.
O decreto ainda amplia o prazo para renovação do registro de cinco para 10 anos e renova automaticamente, pelo mesmo tempo, a validade dos certificados emitidos até esta terça-feira. Quem possuir arma comprada legalmente, mas com registro vencido, poderá regularizar a situação sem sanções. Ainda em janeiro, Bolsonaro irá editar medida provisória para abrir período de recadastramento até o final de 2019, com possibilidade de prorrogação por mais um ano.
— Essa política adotada pelos governos do PT e mantida pelo governo Temer (de restringir a posse) fizeram com que, no Brasil, entre 8,5 milhões a 9 milhões de famílias tenham hoje arma (com registro vencido) em casa — afirmou Onyx.
Porte de armas em estudo
A possibilidade de flexibilizar o porte de armas — permissão ao cidadão para andar armado na rua — está em estudo pelo governo. De acordo com Onyx Lorenzoni, a avaliação está sob a responsabilidade de três ministérios: Defesa, Justiça e Segurança Pública e Casa Civil.
— Estamos analisando a legislação e vamos ver onde precisa fazer uma ação legislativa, se tem algum espaço de uma norma regulamentadora, pode ser um decreto. Está em estudo isso. O importante a fazer era facilitar a posse. O porte já é uma coisa mais complexa.
Atualmente, o porte de armas é liberado para pessoas que atuem em funções que ofereçam riscos. Entre elas, estão a área da segurança pública, integrantes das Forças Armadas e trabalhadores de empresas de segurança privada. Sócios de clubes de tiro e de caça podem portar uma arma no deslocamento entre o estabelecimento e a sua residência.
Onyx também destacou que o governo analisa a possibilidade de abrir o mercado para empresas estrangeiras produzirem armas no Brasil, embora não haja prazo para a conclusão da avaliação. O ministro defende a vinda de companhias internacionais para o país, o que, segundo ele, seria uma oportunidade de emprego à população.
Incentivos
O custo para adquirir um revólver ou uma pistola pode chegar próximo a R$ 5 mil, cinco vezes o valor do salário mínimo nacional. Questionado se o governo planeja oferecer incentivos para que famílias de baixa renda possam também garantir a legítima defesa em suas residências, Onyx afirmou que a medida não é estudada pelo governo.
O ministro afirmou, no entanto, que o governo estuda aplicar medidas que possam reduzir os impostos cobrados de quem quer comprar uma arma de fogo no País. A análise sobre a redução dos tributos, porém, não tem prazo para ser divulgada.
PT irá ao STF contra decreto
Menos de três horas após a assinatura do decreto, PT e PSOL anunciaram que irão ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra as mudanças. De acordo com o líder do PT na Câmara, Paulo Pimenta (PT-RS), uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) será levada à Corte, pedindo a suspensão das novas regras. Um decreto legislativo será apresentado no Parlamento com o objetivo de revogar trechos do documento.
(A assinatura do decreto) extrapola as competências previstas na legislação ao Poder Executivo de regulamentar aquilo que a lei prevê.
PAULO PIMENTA
deputado federal (PT-RS)
— (A assinatura do decreto) extrapola as competências previstas na legislação ao Poder Executivo de regulamentar aquilo que a lei prevê. Ela invade competências do Poder Legislativo.
Entre aliados de Bolsonaro, o decreto foi comemorado. O coordenador da bancada da bala, deputado Capitão Augusto (PR-SP), disse que o texto "surpreendeu" pela abrangência.
— Achei que o governo fosse dar um passo mais tímido, mas foi além. Agora, é partir para a liberação do porte — afirmou, mencionando que as discussões devem ser retomadas em fevereiro.
Antigo coordenador da bancada, o deputado Alberto Fraga (DEM-DF) foi o único a conceder entrevista coletiva após a assinatura, ainda no Palácio do Planalto. Para ele, o decreto "atingiu o objetivo".
Achei que o governo fosse dar um passo mais tímido, mas foi além. Agora, é partir para a liberação do porte.
CAPITÃO AUGUSTO
deputado federal (PR-SP), líder da bancada da bala
Aliado de Bolsonaro, o líder da Bancada do DEM na Câmara, Elmar Nascimento (BA), acredita que o governo poderia ter esperado para tratar o assunto, já que a área econômica elencou a reforma da Previdência como prioridade.
— O governo deveria gastar toda a energia com a pauta eFconômica. Agora, se achava urgente falar da posse de armas, poderia ter feito isso através de medida provisória, para ser discutida no Parlamento.