Depois de quatro anos e quatro meses de investigação e equipes de atuação exclusiva em três Estados e novas ações em desenvolvimento, a Operação Lava-Jato resultou na condenação de 182 réus, alguns em mais de um processo. Neste momento, 61 pessoas estão presas em regime fechado.
Investigadores comemoram os resultados, mas demonstram preocupação com o futuro. Em setembro, o ministro Dias Toffoli, crítico a prisões após sentenças em segunda instância, assumirá a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) e há o temor de que ele retome a discussão que poderá levar a um novo entendimento sobre a antecipação da execução de penas.
A atuação do Supremo na Lava-Jato cresceu assim que as primeiras condenações foram confirmadas em segunda instância. Uma torrente de recursos contra decisões e pedidos de liberdade passou a bater à porta do tribunal. Em geral, os casos são julgados pela 2ª Turma.
O relator da operação é o ministro Edson Fachin, mas o grupo é formado por uma maioria de magistrados com tendência a garantir liberdade aos réus. Um deles é Toffoli. O ministro é abertamente contrário à execução provisória, defendendo que um réu só seja preso após o trânsito em julgado de seu processo ou, ao menos, após julgamento de recurso pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que é a terceira instância do Judiciário.
Nos bastidores, interlocutores do magistrado sugerem que ele não irá pautar o assunto neste ano. Ainda assim, integrantes do Ministério Público Federal (MPF) demonstram preocupação, afirmando que qualquer alteração neste ponto poderá enfraquecer a Lava-Jato.
— Mudança de entendimento do STF em curto espaço de tempo geraria instabilidade e insegurança na sociedade. Faria com que a capacidade do Judiciário de agir de modo coerente, justo e isonômico fosse colocada em dúvida — diz Jerusa Vieceli, procuradora da Lava-Jato no Paraná.
Como há a expectativa de que a possibilidade de prisão em segunda instância seja revista se o assunto for colocado na agenda do Supremo, o tema é evitado pela atual presidente, contrária à ideia. Aliás, o perfil de Cármen Lúcia, visto como austero, deverá mudar a correlação de forças dentro da 2ª Turma, quando ela assumir a vaga de Toffoli.
Ao lado de Fachin e contando com votos do decano da Corte, Celso de Mello, a tendência é de que o grupo adote caráter mais punitivo, isolando os outros dois integrantes, Gilmar Mendes – responsável pelos casos da Lava-Jato no Rio de Janeiro – e Ricardo Lewandowski.
Integrante da força-tarefa da Lava-Jato fluminense, o procurador Sérgio Pinel critica decisões de magistrados contrárias ao entendimento vigente. Para ele, pedidos de liberdade de quem teve condenação confirmada por tribunais não deveriam ser atendidos.
– É imprescindível que (o STF) funcione como órgão colegiado e não como um órgão difuso em que "cada cabeça é uma sentença" – afirma.
Um dos casos que exemplifica a situação é o do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (PT-SP), que teve sentença confirmada em segunda instância. Ainda assim, por sugestão de Toffoli, ganhou liberdade temporária até que sua situação volte a ser discutida na Corte, o que poderá ocorrer nos próximos meses.
A decisão de soltá-lo poderia beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), preso em Curitiba desde abril, que fez pedido semelhante. No entanto, temendo derrota e a consequente libertação do petista, Fachin tirou o assunto da 2ª Turma e o encaminhou ao plenário do tribunal.
Processos criminais e apurações em andamento nas diversas esferas do poder em Brasília também ampliam o temor de interferências na Lava-Jato a partir da troca de comando do país. Siglas com representação expressiva no Congresso, que pedem ou oferecem apoio na corrida ao Palácio do Planalto, têm integrantes investigados.
Professor de Direito Constitucional da PUCRS, Marcelo Peruchin não vê riscos significativos à condução da Lava-Jato. Mas faz um alerta.
– Enquanto a Polícia Federal estiver vinculada ao Poder Executivo, sempre é possível a influência negativa. Isso aumenta a importância da qualidade e da quantidade dos elementos incluídos nos processos – defende.
Segundo Peruchin, repercussões positivas das apurações entre a sociedade e a comunidade jurídica são os principais fiadores da continuidade do enfrentamento à corrupção no país.