Derrotado na proposta de ouvir a população gaúcha sobre a venda da CEEE, CRM e Sulgás, o governador José Ivo Sartori cogita agora adotar caminho contrário: a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) trabalha na redação de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) a ser ajuizada no Supremo Tribunal Federal (STF), contestando a necessidade de plebiscito.
O Piratini pretende alegar que os deputados não poderiam ter aprovado, em 2002, a emenda à Constituição do Estado que obriga a necessidade de consulta popular para privatizações.
Contudo, para juristas consultados por GaúchaZH, o governo deve ter dificuldades no STF. Ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça, Gilson Dipp considera que os deputados estaduais têm legitimidade para propor e aprovar emendas constitucionais, principalmente quando o objetivo é ouvir a população sobre empresas estatais.
— Vender uma estatal não é vender um carro usado. O Executivo não é dono dessas empresas. E o Supremo não vai entrar em bola dividida, sobretudo em época de eleição. Os ministros já estão desgastados de tanto intervir em atos de Legislativo e do Executivo. Por que discutiriam uma ação que visa evitar um plebiscito? O governador Sartori nem deveria propor uma coisa dessas em fim de mandato. Ouvir a população é obrigação de todo político — disse.
O governador Sartori nem deveria propor uma coisa dessas em fim de mandato.
GILSON DIPP
Ex-ministro do STJ
O constitucionalista Eduardo Carrion concorda com Dipp. Na opinião do professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, o governo age com "oportunismo político" ao recorrer à Justiça após ser derrotado na Assembleia.
— O legislador pode muito bem fixar as hipóteses para uma consulta popular. Não vejo nenhuma inconstitucionalidade nisso. Surpreende esse comportamento do governo. Afinal, o governador é a favor ou contra o plebiscito? — questiona.
Ação no Supremo
A ação no STF foi discutida na manhã desta quarta-feira (6), durante reunião do núcleo político do Piratini. Sartori fez uma avaliação da derrota ocorrida na Assembleia, creditada à ação do pré-candidato do PSDB ao governo do Estado, Eduardo Leite, e projetou as formas de reação.
— Nós tentamos fazer o plebiscito. Os deputados não deixaram. Agora precisamos fazer algo porque o governo está convicto da necessidade de privatização destas estatais — disse o líder do governo, Gabriel Souza (MDB).
Surpreende esse comportamento do governo. Afinal, o governador é a favor ou contra o plebiscito?
EDUARDO CARRION
Constitucionalista
A venda das empresas é uma das exigências do governo federal para adesão do Estado ao regime de recuperação fiscal, que suspende o pagamento da dívida com a União. Em viagem a Brasília para discutir o assunto, o vice-governador, José Paulo Cairoli, admitiu que entrar na Justiça é a última cartada do Piratini.
— Vamos usar o recurso que for possível, a nossa missão é fazer este enfrentamento — argumentou.
O texto que está sendo preparado pela PGE sustenta que, se a gestão das empresas públicas é de responsabilidade exclusiva do Executivo, não deveria haver interferências do Legislativo sobre a extinção de estatais. Segundo relatou um dos técnicos que trabalham na peça, o governo também aponta a "situação de urgência do Estado" e que o regime proposto pela União exige a venda de ativos.
Após mais uma rodada de negociações em Brasília, a aposta do Piratini é assinar um pré-acordo ainda em junho. A medida serviria para convencer o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, a manter a liminar judicial concedida em agosto do ano passado, suspendendo o pagamento das parcelas mensais.
A partir deste pré-acordo, o Estado também teria mais 12 meses para cumprir as exigências para a assinatura do acordo final, que prevê a suspensão do pagamento da dívida por três anos, renováveis por mais três.