Recebido com festa na Praça da República, em São Paulo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) discursou como candidato ao Palácio do Planalto no início da noite desta quarta-feira (24), apesar da derrota em Porto Alegre. Depois de passar parte do dia recluso na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, onde acompanhou a sessão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), o líder petista foi saudado por uma multidão de militantes no centro da capital paulista.
Ícone do Partido dos Trabalhadores, Lula decidiu aguardar o desfecho da audiência rodeado de familiares, de parceiros do movimento sindical, onde começou a vida pública, no fim da década de 1960, e de companheiros de sigla. Ao seu lado estavam filhos, netos, os ex-ministros Aloizio Mercadante, Jaques Wagner e Celso Amorim, além do ex-presidente do PT Rui Falcão e do pré-candidato ao governo de São Paulo Luiz Marinho (PT), entre outros nomes.
De carro, sem falar com a imprensa, ele chegou ao sindicato às 10h10min e só saiu no fim da tarde. Nos bastidores, o ex-chefe de Estado já esperava a manutenção da sentença do juiz Sergio Moro e, a interlocutores próximos, não deixou transparecer abatimento. Ao falar com amigos que acompanhavam o julgamento ao seu lado no sindicato, mais cedo, o político disse que não desistiria "de lutar". Preferiu ficar longe das imagens transmitidas ao vivo pelo TRF4, em uma sala reservada, longe das notícias. Passou o dia conversando e, a cada voto, era informado dos resultados.
Por volta das 11h, o ex-presidente foi para o auditório do sindicato, no terceiro andar, para discursar para a militância. Estava sorridente e tirou foto abraçado com petistas.
— Tenho certeza absoluta de que não cometi nenhum crime e que, por conta disso, a única decisão que possa acontecer hoje é eles, por três a zero, dizerem que o juiz Moro errou ao dar a sentença. Se vai acontecer ou não, eu não sei, mas a única coisa certa e justa que poderia acontecer era isso — disse Lula.
Apesar de tentar demonstrar otimismo, ele já apontava para o futuro, prevendo a manutenção da condenação.
— Se não acontecer (a absolvição), temos muito tempo pela frente para mostrar o equívoco, as mentiras contadas contra o PT e o Lula nesses últimos anos — projetou.
Antes de sair do palco, deu um último aviso:
— Só o dia em que eu morrer vou parar de lutar pela democracia.
Pelo Twitter, prometeu voltar e "transformar" o país e agradeceu o apoio de seus defensores.
Pouco antes do fim da audiência, deixou o sindicato de carro e foi para seu apartamento, a cerca de um quilômetro de distância. Ao entardecer, sob nuvens carregadas de chuva, era aguardado em ato organizado pelas frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo na Praça da República, em São Paulo.
O largo da praça ficou lotado e coberto de vermelho, com bandeiras e balões da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e outras entidades sindicais. No carro de som, líderes de movimentos sociais e de esquerda se revezavam nos discursos a favor do presidente de honra do PT e subiram o tom. O senador Lindberg Farias (PT) e o líder do Movimento de Trabalho Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, conclamaram a população à luta. Lindberg falou em "desobediência civil". Boulos foi ainda mais direto.
— Se tentarem prender o Lula, nós vamos para o pau — disse o presidente do MTST, afirmando que o "tempo de obediência acabou".
Fui condenado outra vez por um raio de um apartamento que não é meu
Ovacionado pela multidão, de preto, Lula acenou e sorriu. Ao assumir o microfone, falou:
— Não quero que pensem que isso é um ato de campanha. Isso é muito mais do que isso. É um ato de soberania nacional.
Sob aplausos, Lula disse que "quem está condenado é o povo brasileiro". Afirmou que espera "desculpas" e que "digam que crime cometemos".
— Fui condenado outra vez por um raio de um apartamento que não é meu. Falaram dez horas seguidas, leram não sei quantas páginas e não tem um crime — reclamou.
Diante dos apoiadores, chamou o julgamento "de oportunidade para viajar o Brasil" para discutir o futuro do país:
— Eu já nem queria mais fazer política. Mas essa provocação é de tal envergadura que me deu uma coceirinha, e eu agora quero ser candidato à Presidência da República.
Em um desabafo, criticou a mídia e o Judiciário, para depois concluir:
— Eles que se preparem, porque nós vamos voltar a cuidar desse povo brasileiro do jeito que o povo merece.
Enquanto isso, na Avenida Paulista, manifestantes ligados ao Movimento Brasil Livre (MBL) comemoravam o aumento da pena prevista para o ex-presidente. Desde o meio-dia, um boneco inflável de Lula vestido de presidiário, chamado de "pixuleco", animava a mobilização, com carro de som, bandeiras verde-amarelas e buzinaço, em um repeteco dos protestos pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.
Mesmo diante da festa dos adversários e do fracasso no TRF4, a executiva nacional do PT confirmou reunião na manhã desta quinta-feira (25), na sede da CUT, em São Paulo, para reafirmar o que vem defendendo desde sempre: o consenso em torno da candidatura de Lula, que está mais forte do que nunca. Pelo menos por enquanto.