A decisão do juiz Ricardo Leite, da 10ª Vara Federal de Brasília, que determinou a apreensão do passaporte do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na quinta-feira (25), suscitou debates sobre a necessidade da medida cautelar.
Na manhã desta sexta-feira (26), em entrevista ao programa Atualidade, da Rádio Gaúcha, o ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Gilson Dipp, que deixou a Corte em 2014, qualificou de "autoritária" e "absurda" a decisão. Mas advogados ouvidos por GaúchaZH apontam que a medida não foge da normalidade.
O advogado criminalista André Luís Callegari, doutor em Direito Penal pela Universidade Autônoma de Madri, afirma que a decisão judicial não é uma anormalidade, pois segue o entendimento mais recente do Supremo Tribunal Federal (STF). Ele destaca que a medida não é um excesso, independente de quem seja o condenado, pois, no cenário jurídico atual, até a execução da pena já poderia ter sido imposta no caso.
— Diante do presente, que é o que temos posto no cenário jurídico, que foi uma decisão do plenário do STF, que foi contestada e muitos ministros admitem rever, é possível fazer o recolhimento do passaporte, como seria possível também mandar executar a pena — disse.
Callegari acredita que decisões como essas garantem que o Brasil não viva em uma situação de insegurança jurídica. No entanto, segundo o advogado, não seria surpresa se, nos próximos dias, o STF derrubasse a decisão que suspendeu o direito de o ex-presidente sair do país:
— Pode ser uma decisão isolada de um dos ministros, porque o Supremo vem, na realidade, derrubando a própria execução provisória.
A advogada criminalista Martha Rosa entende que a decisão é cabível e, mesmo que proferida no âmbito de outro processo, pode usar a decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) – que confirmou a condenação de Lula na Lava-Jato – como embasamento.
— Acho que não se trata de um excesso. É bem cabível, até porque é uma forma de que se garanta que ele (Lula) vá se evadir, até porque, em segundo grau, a sentença dele está confirmada por unanimidade e só faltam ser julgados os embargos declaratórios.
Professor de Direito diz que decisão não foi a mais técnica
O professor de Direito Juarez Freitas, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), acredita que, apesar de a medida cautelar ser um dispositivo previsto na lei, a decisão da Justiça de Brasília não foi a mais técnica nesse caso específico.
— Entendo que o correto seria algum tipo de postulação no processo que corre no TRF da 4ª Região. Parece que seria a fórmula mais técnica. Trata-se de uma medida cautelar, porém, sequer há sentença lá (na Justiça de Brasília). Me parece que o juiz se precipitou um pouco.
Freitas afirma que a postura do juiz da 10ª Vara Federal do Distrito Federal pode apontar que a sentença no caso especifico já está definida.
— No momento em que ele defere esse pedido, já quase que existe uma espécie de presunção de que (Lula) vai ser condenado.
A decisão da 10ª Vara Federal de Brasília acolhe pedido do Ministério Público Federal (MPF) no âmbito do processo que apura supostas irregularidades na compra de caças suecos. Lula tinha viagem internacional marcada nesta sexta-feira (26) para a Etiópia, onde participaria de atividades de combate à fome. O MPF entendeu que a viagem do ex-presidente poderia trazer riscos para investigação, como a fuga do país.
O advogado Cristiano Zanin Martins entregou, na manhã desta sexta-feira (26), o passaporte do ex-presidente à Polícia Federal (PF) em São Paulo. Também nesta sexta, o desembargador João Pedro Gebran Neto, do TRF4, em Porto Alegre, negou pedidos feitos por três advogados para apreender o passaporte de Lula e impedi-lo de sair do país.