O procurador da República e coordenador da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, disse, em entrevista ao programa Gaúcha+, nesta sexta-feira (6), que a data errada nos recibos do duplex entregues por Lula é "o menor dos problemas". Dallagnol também comentou o afastamento do senador Aécio Neves, o futuro da operação e possíveis soluções para acelerar a prisão de políticos ainda no poder que estão envolvidos em esquemas de corrupção.
— Existem muitas evidências de que os recibos de aluguel entregues por Lula sejam falsos — disse o procurador.
A investigação que apura a suposta propina recebida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por meio de um apartamento duplex, em São Bernardo do Campo (SP), não encontrou, no contrato de aluguel, provas de que os pagamentos, de fato, existiram. Para o procurador, o erro nas datas — dois documentos apresentavam pagamentos em dias que não existem no calendário cristão — é o menor dos problemas.
— Ainda foi apreendida uma planilha de despesas domésticas do ex-presidente e, nessa planilha, consta valor do condomínio, pagamento do IPTU, mas não está na planilha o pagamento do aluguel. O próprio Glauco (Costamarques, dono do imóvel no cartório) veio em audiência e declarou que nunca teve pagamento nenhum — disse.
Sobre o recurso que pede que a pena de Lula aumente de nove anos e seis meses para 21 anos e seis meses de prisão, o procurador explica que é “muito comum” os procuradores recorrerem para aumentar pena de crimes de corrupção. Na opinião dele, a pena aplicada ao ex-presidente “foi branda”.
Fim da Lava-Jato
Sobre a afirmação do juiz federal Sergio Moro – de que a fase da Lava-Jato em Curitiba chegaria ao fim –Dallagnol disse que ainda há muitas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que devem causar impacto na cidade e no resto do país. Além disso, o procurador relembrou que o juiz já havia feito declaração semelhante, “há mais de um ano”, mas ainda há muitos casos pendentes em Curitiba, entre eles, desdobramentos do caso Odebrecht, contas alcançadas em investigações suíças e áreas da Petrobras a serem exploradas — como o marketing e setores terceirizados.
— Trabalho em Curitiba também não falta — disse.
Segundo ele, contudo, mais importante que o trabalho na capital do Paraná são os resultados que virão de Brasília, de decisões que serão tomadas pelos ministros do STF, “porque é lá que estão as pessoas mais poderosas que praticaram crimes”.
Futuro "tenebroso"
O procurador afirmou que, se tudo caminhar dentro de um rumo normal, o futuro da Lava-Jato é “tenebroso”.
— (Operação) não está investigando um ou dois parlamentares, mas centenas que estão entre as pessoas mais poderosas do país.
Dallagnol disse ainda que o único instrumento que existe para investigar, processar e punir é a lei, mas são justamente as pessoas investigadas — membros do Congresso Nacional — que têm influência direta sobre o conteúdo da Legislação.
— Você acha que essas pessoas que podem determinar o conteúdo da lei vão permitir que a lei seja usada para puni-las, para botá-las na cadeia?
O procurador explica, então, que a tendência natural seria repetir o que aconteceu na Itália, quando o congresso do país aprovou uma série de leis para esvaziar os resultados da operação de combate à corrupção Mãos Limpas. No Brasil, inclusive, segundo Dallagnol, já existem vários projetos tramitando no congresso com esse objetivo.
Demora na condenação
Quanto à demora para ver um dos políticos ainda no poder preso pela Lava-Jato, o procurador diz que vai “demorar muito, muito mais tempo” do que gostaria. Dallagnol, então, sugeriu três modos de resolver o problema.
Os dois primeiros, segundo ele, estão nas mãos das instituições. O congresso poderia reduzir o foro privilegiado, mas ele não acredita que isso possa acontecer. A outra alternativa seria o resultado do julgamento que está para acontecer no STF, que decidirá se o foro apenas será julgado no Supremo em relação a crimes praticados no exercício do mandato atual.
— Como vários dos crimes da Lava-Jato foram praticados por deputados e senadores em mandatos anteriores, grande parte desce para a primeira instância, e a gente pode seguir a investigação aqui.
O terceiro mecanismo seria a iniciativa dos próprios brasileiros, nas eleições de 2018, se comprometendo a não reeleger pessoas investigadas na Lava-Jato.
Afastamento de Aécio Neves
Já em relação ao caso do afastamento do senador Aécio Neves, Dallagnol diz que, em uma democracia forte e consolidada, o congresso deveria ser o primeiro a “cortar na carne quando existem provas significativas apontando corrupção de algum de seus membros".
— Infelizmente, no Brasil, não é o que acontece. O Congresso não só não fez isso, mas teve de esperar a decisão do próprio Supremo.
Ele diz que enxerga a atitude como uma manifestação corporativista da classe.
— Manifestação que envolve várias pessoas que são alvos da Lava-Jato e que, no futuro, podem estar na mesma situação dessas pessoas que estão sendo investigadas ou processadas por corrupção pelo STF.
Dallagnol, contudo, diz que mantém a esperança.
— Nós temos uma saída clara e ela não está distante de nós. Em 2018, há instituições trabalhando, elaboração de pacote anticorrupção e campanha para o cidadão só eleger quem tem passado limpo e quem se compromete com a aprovação do pacote. Isso seria life-changing no Brasil, mudaria nossa história.