Se até agora era a possibilidade de delação premiada de Antonio Palocci que assombrava petistas, a partir do depoimento que ele deu ao juiz Sergio Moro, na quarta-feira (6), a expectativa é outra: saber se ele tem como provar tudo que afirmou contra os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.
Desde a divulgação de trechos do depoimento, líderes petistas repetem a tese de que em busca de benefícios proporcionados por eventual acordo de delação o ex-ministro Palocci está dizendo qualquer coisa. A colaboração premiada dele estava parada, há um mês, por falta de detalhes comprobatórios, mas pode avançar agora, informa um dos negociadores.
Por trás do discurso dos petistas, no entanto, há apreensão: foi a primeira vez que um integrante do "núcleo duro" do partido admitiu crimes. Palocci está preso desde setembro do ano passado.
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– O que vale para Palocci vale para qualquer suspeito que dá um depoimento e depois de um tempo muda o depoimento com objetivo de fazer delação, de reduzir a pena dele. Ele está reconhecendo que cometeu crimes, o que é lamentável, pois teve uma função de confiança como membro de um partido político e está reconhecendo que, ao exercer essas funções, cometeu crime. Ele tem que provar o que está dizendo. Ele não fez o depoimento sob juramento de dizer a verdade – avalia Pepe Vargas, presidente estadual do PT e ex-ministro do governo Dilma.
Pepe lembra ainda que Palocci estava há anos "afastado da vida partidária", mas reconhece o peso do depoente:
– Ele estava afastado, não se desfiliou, mas não tinha mais participação. Mas é evidente que pelas funções que exerceu era pessoa de confiança do Lula.
Crítico da forma como as delações estão sendo conduzidas na Lava-Jato, o ex-ministro da Justiça do governo Lula e ex-governador do Estado, Tarso Genro, diz que as declarações de Palocci devem influenciar nas eleições de 2018:
– Do ponto de vista político, o prejuízo é grande. Informações dadas por pessoas com relações de amizade com delatados, mesmo que se comprovem depois como falsas, têm uma carga moral muito forte e devem influenciar no processo eleitoral, se Lula puder se apresentar como candidato.
Para Ricardo Antunes, professor de Sociologia da Unicamp, "as informações de Palocci, se comprovadas, tendem a se constituir nas mais duras de todas, na medida em que são de alguém da absoluta e estrita confiança de Lula, de Dilma e do PT. O tamanho do seu estrago estará na razão direta do tamanho das provas que forem apresentadas".
– Pode ser o elemento que faltava para, uma vez consubstanciada em provas, impedir a candidatura de Lula em 2018 – reflete Antunes.
Mas o professor alerta para um risco: de a Operação Lava-Jato, ao atingir o PT, voltar a ter a marca da unilateralidade.
– Mesmo que Joesley (Batista, da JBS) e seu administrador percam os benefícios da delação, isso não pode inviabilizar o processo que envolve a alma do governo Temer. O combate à corrupção no Brasil tem que atacar todos os polos, e não resta dúvida de que o polo mais estruturado, longevo, duradouro e maléfico da corrupção no Brasil é o do PMDB.
O cientista político e professor da Universidade de Brasília, David Fleischer, também avalia que o teor das declarações de Palocci serviu para "desgastar muito Lula".
– Atinge em cheio Lula, desgastou. Mas Palocci está fazendo delação, quer reduzir sua pena, está cansado de ficar na carceragem. Isso é a técnica de desgastar a pessoa até que conte tudo. Vamos ter que ver quais provas concretas vão ser encontradas. É o desafio da delação premiada – destaca Fleischer.
Ele aponta ainda outros reflexos do depoimento do petista: o peso sobre o depoimento de Lula a Moro e sobre o julgamento da apelação de José Dirceu (condenado a 20 anos e 10 meses de cadeia) pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ambos marcados para o próximo dia 13.
Maria do Socorro Sousa Braga, cientista política da Universidade Federal de São Carlos, avalia que as revelações de Palocci são de forte impacto para o sistema partidário, reforçando a certeza de que o problema não é isolado e é sistêmico:
– Já tínhamos uma noção dessas questões, só não se sabia vindo de um interlocutor como o Palocci. Não é de hoje, é sistemático esse processo, algo que já vem acontecendo há muito tempo e é algo muito sério. Você vê Geddel (Vieira Lima, que seria dono de R$ 51 milhões encontrados pela Polícia Federal em um apartamento em Salvador) com aquele monte de dinheiro, Temer com a JBS. São diferentes eventos que levam para mesma conclusão: de que a gente vai ter de repensar a democracia dessa forma. Isso não é uma democracia consistente, de qualidade, pelo contrário.