Reeleito para governar Porto Alegre, o prefeito Sebastião Melo tem desafios em diferentes áreas sensíveis, mas demarcou a educação como prioridade. Confirmada a vitória no domingo (27) com 61,53% dos votos válidos, Melo afirmou que pretende deixar uma marca na educação, setor em que ele mais sofreu dissabores no primeiro mandato.
O prefeito reeleito, que dedicou a segunda-feira (28) a uma bateria de entrevistas, incluindo visita à orla do Guaíba, mencionou a intenção de lançar um pacto entre governo, professores, universidades e sociedade civil para melhorar a qualidade da educação e reformar o currículo.
A avaliação entre aliados é de que as transformações, se dependerem apenas da vontade do Executivo, esbarram em resistências e não acontecem. O caminho idealizado é o de criar um movimento para encampar mudanças e amainar contrariedades.
Melo tem defendido a criação de um programa de premiação das escolas melhor avaliadas e abriu a hipótese de escolher os diretores a partir da apresentação de uma lista tríplice. Isso daria ao governo a possibilidade de indicar para o cargo um servidor mais identificado com as transformações desejadas. Atualmente, os diretores são definidos em eleição, com o voto de servidores, alunos e pais.
Para o segundo mandato, Melo deseja concluir a adoção da parceria público-privada (PPP) que entregará a empresas a tarefa de cuidar das manutenções prediais das escolas. A intenção, diz ele, é deixar os dirigentes focados nas tarefas pedagógicas. Outra promessa é zerar a fila da educação infantil para crianças de zero a cinco anos — faltam cerca de 3 mil vagas.
Para cumprir o desejo de transformar, o primeiro desafio de Melo será encontrar um nome para assumir a Secretaria Municipal de Educação (Smed). Ele afirma não ter um escolhido, embora já tenha feito sondagens dentro do seu partido, o MDB.
Nos primeiros quatro anos, a educação foi um dos pontos baixos do governo Melo. Quatro secretários estiveram à frente da pasta e uma delas, Sônia da Rosa, foi presa temporariamente por suspeita de recebimento de propina de um grupo econômico favorecido em compras de materiais. Os indícios de corrupção na Smed abalaram o governo. A educação de Porto Alegre teve queda na avaliação do Ideb, um dos piores desempenhos dentre as capitais do Brasil.
Outra agenda que se impõe é a reconstrução do sistema de proteção de enchente com as obras emergenciais. Tiveram início as recuperações de diques e casas de bombas. Será necessário articular, em parceria com o governo do Estado e a União, obras intermunicipais na bacia hidrográfica do Guaíba. Melo também projeta a construção de um sistema de contenção para regiões desguarnecidas de Porto Alegre, do bairro Cristal em direção ao Extremo Sul.
Saúde e novas secretarias
A saúde é ponto importante da pauta. A fila por consultas com especialistas e exames foi um dos fatos mais mencionados por adversários durante a campanha. Além de reduzir a espera, Melo será cobrado por duas das promessas do período eleitoral: a ampliação do Hospital de Pronto Socorro (HPS) e a construção do novo Hospital Materno Infantil Presidente Vargas (HMIPV), na Avenida Erico Verissimo, em uma modelagem de PPP que está sob análise do Tribunal de Contas do Estado (TCE).
Transporte público, limpeza urbana, assistência social e concessão parcial de Departamento Municipal de Água e Esgoto (Dmae) também terão destaque nos próximos quatro anos.
Ainda nesta semana, Melo deverá formalizar a criação do escritório de transição. Embora seja um governo de continuidade, o prefeito reeleito deseja promover uma análise, contando com opiniões externas, para identificar gargalos, erros e acertos. O escritório de transição fará um desenho da reforma administrativa e composição do novo governo.
É provável a criação da Secretaria de Turismo e Eventos, nicho que Melo pretende reforçar. Já tramitam na Câmara de Vereadores projetos de lei que transformam os gabinetes de Inovação e de Comunicação Social em secretarias. É um assunto que também deve ser abordado na transição. O favorito para coordenar o escritório é o emedebista Cezar Schirmer, titular da Secretaria Municipal de Planejamento e Assuntos Estratégicos.
Base no Legislativo
De boa relação com os vereadores, Melo não terá dificuldades para compor maioria. Os partidos dominantes serão MDB e PL. A federação PSDB-Cidadania, PP, Republicanos e Podemos também terão relevância.
O governo terá ao seu lado pelo menos 20 dos 35 parlamentares da Câmara. O ingresso do Novo na base é possível, o que aumentaria a bancada governista para 22 assentos.
O quórum é suficiente para aprovar projetos que exigem maioria absoluta de 18 votos, como a concessão do Dmae e as modificações no Plano Diretor. A dificuldade para Melo será mexer na Lei Orgânica, o que exige dois terços da Câmara, equivalente a 24 votos. Seria necessário contar com parte da oposição para alcançar a marca.
Exemplo de proposta que deve ficar emperrada é a restrição da oferta de licença-prêmio aos servidores, que já tramita na Câmara. Como o direito tem matriz na Lei Orgânica, depende dos 24 votos de que o governo não deverá dispor.
Com 12 cadeiras, duas a mais do que na atual legislatura, a oposição terá, sozinha, condição de emplacar a abertura de CPIs. É ponto de atenção para Melo, que enfrentou, no primeiro mandato, uma desgastante CPI da Smed, emplacada devido às assinaturas de parlamentares da oposição e independentes.
Recursos internacionais
O segundo mandato de Melo começará com a expectativa de ter recursos para investir. Duas operações internacionais estão em estágio avançado. Um dos empréstimos é negociado junto ao Banco Mundial (BM) e Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD), no valor de 129,6 milhões de euros. O programa prevê investimentos em infraestrutura urbana, saneamento, drenagem, qualificação do Centro Histórico e do 4º Distrito.
O segundo financiamento, de US$ 150 milhões, é tratado com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (Bird). O recurso será destinado a quitação de precatórios, investimentos em unidades de saúde, sedes do Conselho Tutelar e combate à pobreza extrema, entre outras finalidades.
Uma terceira negociação, menos avançada do que as anteriores, acontece com o Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe. A proposta é liberar US$ 80 milhões para aplicar em assistência social e obras de infraestrutura.
— A expectativa é começar a execução dos três financiamentos no próximo mandato — diz Cezar Schirmer, que coordena as negociações.
Volta de secretários
Encerrado o segundo turno, integrantes do primeiro escalão do governo Melo que deixaram os cargos para concorrer à Câmara retomaram as funções nesta segunda-feira (28). Eles devem finalizar o atual mandato, até 31 de dezembro. Voltaram Marcos Felipi Garcia (Serviços Urbanos), André Machado (Habitação e Regularização Fundiária) e Débora Garcia (Esporte Lazer e Juventude).
Gustavo Ferenci (Transparência e Controladoria) deve regressar ainda nesta semana. Destes, apenas Garcia se elegeu vereador. Luiz Otávio Prates, que liderou a comunicação da campanha de Melo, retomou a chefia do Gabinete de Comunicação Social da prefeitura.