A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), se manifestou nesta quarta-feira (26) sobre os ataques machistas que sofreu nos últimos dias. Ela foi alvo de ofensas misóginas por parte do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB), o que motivou uma nova ordem de prisão contra ele.
Em um vídeo publicado nas redes sociais, Roberto Jefferson comparou a ministra a "prostitutas", "arrombadas" e "vagabundas". Ele reiterou os ataques em audiência de custódia na segunda-feira (24), quando se desculpou "com as prostitutas" pela "má comparação".
Cármen agradeceu o apoio que recebeu dos pares nos últimos dias e disse que continuará julgando "serenamente". A ministra fez um discurso sobre a unidade do tribunal.
— O atingimento de um é de todos. Vários de nós passamos, nesses últimos tempos especialmente, por agruras que vão além de qualquer civilidade — disse.
Ela disse ainda que o Brasil passa por "tentativas de subversão ou erosão democrática".
— Desde pequena, no sertão mineiro, quando eu reclamava de alguma dificuldade, minha mãe perguntava: "Quem te disse que é fácil?". Dificuldades fazem parte, mas o Brasil vale a pena, o Estado de direito vale a pena, a democracia vale o que cada um de nós faz — defendeu.
Omissão
O ministro Gilmar Mendes, decano do STF, também criticou os ataques recentes contra Cármen Lúcia. Ele pediu a palavra antes da sessão de julgamentos e falou por cerca de 10 minutos.
O ministro disse que Cármen tem as "mais elevadas virtudes republicanas". Sem citar o ex-deputado Roberto Jefferson, Mendes afirmou ainda que o Brasil vive um "cenário de recessão democrática" e "erosão constitucional".
— A República foi submetida aos mais impensáveis ataques nos últimos anos. O autoritarismo germina em uma lógica discursiva bélica — declarou.
O decano do STF disse ainda que a "decadência democrática" do país é fruto de "omissões calculadas e conivências oportunistas das autoridades", no que classificou como um "ambiente de rapinagem institucional".
— A muitos interessa um Supremo Tribunal Federal fraco, e para enfraquecer a instituição todo meio é válido: ameaçar a vida de ministros e de seus familiares, financiar quadrilhas que acampam na Esplanada dos Ministérios, bem como incitar seus comparsas a destruir o tribunal — disparou.
Gilmar Mendes também reagiu a acusações de que o tribunal tem desbordado suas atribuições e interferido em funções do Executivo e do Legislativo, como frequentemente afirmam o presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) e seus apoiadores.
— Nessa realidade paralela, os que militam por ditadura apresentam-se como defensores da liberdade. Como uma mentira dita mil vezes começa a assumir tons de verdade, qualquer decisão do tribunal que busque proteger o Estado democrático de direito passa a ser descrita histericamente como um abuso. É assim que o Poder Judiciário, um poder desarmado, consegue ser pintado como golpista — falou.
Misoginia
A presidente do STF, Rosa Weber, leu no plenário a nota divulgada no último sábado (22) em que classificou as ofensas a Cármen Lúcia como uma "agressão sórdida e vil" e "expressão da mais repulsiva misoginia".
— Não há como compactuar com discurso de ódio, abjeto e impregnado de discriminação, a atingir todas as mulheres e ultrapassar os limites civilizatórios — repetiu Rosa.
A vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, disse que as ofensas a Cármen Lúcia foram "degradantes".
— O país está em um momento difícil. A pessoa pode estar revoltada, mas nada justifica — criticou.