O desafio do próximo presidente é do tamanho do Brasil. O país saiu da recessão, mas a recuperação da atividade segue lenta e o desemprego se mantém alto. Após o PIB cair 3,5% em 2015, repetir a dose no ano seguinte e crescer apenas 1% em 2017, as expectativas são de que o avanço agora chegue a menos de 1,5% até dezembro, de acordo com analistas consultados pelo Boletim Focus, do Banco Central (BC). Em 2019, as projeções indicam novamente um ritmo lento, insuficiente para revigorar o mercado de trabalho, que hoje soma 13 milhões de pessoas sem ocupação.
O desequilíbrio das contas públicas também é cada vez mais preocupante. A previsão de mercado para o déficit primário deste ano é de R$ 148 bilhões, o quinto ano seguido do rombo que representa o quanto o governo gasta a mais do que arrecada, sem levar em consideração as despesas com o juro da dívida pública. Além de atrasar a retomada da economia, o desarranjo das finanças põe em risco conquistas como inflação controlada e queda do juro, ao mesmo tempo que freia a recuperação da confiança da população e empresários, segurando o ímpeto do consumo e do investimento.
Diante do quadro desafiador para os próximos anos, a economia se tornou um dos principais temas da campanha ao Planalto. GaúchaZH selecionou as três principais propostas ou promessas dos dois candidatos que disputam o segundo turno das eleições presidenciais – Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT). Os pontos foram submetidos à análise de economistas de diferentes linhas de pensamento, para averiguar aspectos positivos, negativos e possíveis dificuldades de implementação. Apesar de a campanha estar em pleno andamento, a maior parte das ideias ainda é apresentada de forma genérica, sem detalhes de como poderão ser colocadas em prática.
Nas propostas, alguns temas são recorrentes. Um é acabar rapidamente com o déficit primário, algo considerado de difícil execução pelos especialistas. O rombo esperado para 2019 é de R$ 139 bilhões. A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) tem, por enquanto, previsão de déficit primário até 2021, de R$ 70 bilhões. Entre as promessas, há a de eliminar o buraco das contas ainda no próximo ano, ou até 2020.
Outros temas polêmicos repetidos pelos candidatos são privatizações e reformas, como a da Previdência, além de proposições para melhorar a infraestrutura do país a aumentar a renda dos brasileiros.
1) Acabar com o déficit primário em um ano
O déficit primário previsto para o ano que vem na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) é de R$ 139 bilhões. Bolsonaro promete alcançar a meta com a privatização de estatais, devolução de recursos de bancos federais, revisão de renúncias fiscais e controle de gastos públicos. O pesquisador do Instituto o Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV), Samuel Pessôa, considera a proposta inexequível.
As principais dificuldades são os prazos para fazer uma privatização, de ao menos um ano, em muitos casos com a necessidade formal de a proposta passar pelo Congresso, além da dificuldade de cortar gastos obrigatórios. A vantagem da proposta, se alcançada, seria resolver rapidamente um problema que tranca a volta do crescimento da economia.
2) Apoio a privatizações
Apesar de seu passado estatizante, o candidato do PSL diz ser favorável a privatizações, mas não de todas as empresas. A posição colide com a ideia de seu guru na área, o economista Paulo Guedes, que prega a venda de todas as estatais. Empresa-símbolo do país, a Petrobras poderia ter “partes” privatizadas, mas não o seu “miolo”, declarou Bolsonaro. Embora não tenha esmiuçado sua intenção, acredita-se que a Petrobras manteria ao menos os negócios de produção e exploração de petróleo. Bolsonaro citou que o Brasil tem cerca de 150 estatais que poderiam ser repassadas à iniciativa privada ou extintas. Em relação à Eletrobras, que o governo Temer tentou privatizar, o candidato já demonstrou ter reservas. Questionado, disse que era preciso saber o modelo. Mas já afirmou ser contra a venda de empresas de áreas estratégias, como energia e mineração.
3) Autonomia do Banco Central
Na tentativa de se mostrar como concorrente de viés mais liberal, Bolsonaro também começou a defender, desde o final do ano passado, a autonomia do Banco Central (BC). Para o candidato, essa característica dá liberdade para os membros da autoridade monetária tomarem decisões baseadas em critérios econômicos, e não influenciados por mandatários “populistas ou demagogos”, como já se manifestou, que poderiam trocar a estabilidade de longo prazo do país por posturas que trariam apenas ganho político de curto prazo. Guedes, ministro da Fazenda se Bolsonaro for eleito, é conhecido defensor da autonomia do BC. Em um comunicado no ano passado, quando se posicionou sobre o tema, lembrou que o BC é responsável por dois pontos do chamado tripé econômico, taxa de câmbio flutuante e metas de inflação. O terceiro é o superávit primário.
1) Fim do teto de gastos
A medida, aprovada em 2016, restringe o crescimento das despesas do governo federal à inflação do ano anterior por um período de 20 anos. Para Haddad e outros candidatos de esquerda, não é correto limitar despesas em áreas como saúde e educação. O petista também sustenta que o teto afronta a Constituição ao engessar gastos sociais. Para Fernando Nogueira da Costa, da Unicamp, o teto deveria deixar de existir. Considera “um austericídio ao provocar corte de políticas públicas essenciais para haver um mínimo de paz social”. Samuel Pessôa, da FGV, entende que o fim do teto levaria grande turbulência no Brasil e só poderia ser discutido após o país voltar a ter equilíbrio fiscal. Juliana Inhasz, do Insper, avalia que essa medida acabaria “jogando no lixo” o esforço feito até agora para sanear as contas do governo e poderia causar alta da inflação e do juro.
2) Isenção de IR para quem ganha até cinco mínimos
O petista pretende corrigir a faixa de isenção para o equivalente hoje a R$ 4.770. Hoje, é isento até R$ 1.903,98. A tabela não é corrigida integralmente pela inflação desde 1996. O principal ponto positivo seria a elevação do poder de compra, com maior renda disponível para a maior parte da população. Assim, poderia haver incremento no consumo das famílias, um dos grandes motores da economia. O benefício, no entanto, provavelmente deveria ser compensado com aumento da arrecadação de outros impostos, sobre dividendos, por exemplo. Devido ao momento delicado das finanças públicas, há dividas de quando a medida poderia ser implementada. O pesquisador da FGV Samuel Pessôa lembra que a medida reduziria a carga tributária e, neste momento, há grande dificuldade em abrir mão de receitas.
3) Tributação de banco para reduzir spread
Spread bancário é a diferença entre o que os bancos pagam na captação dos recursos e o que, depois, cobram ao conceder um empréstimo, a pessoas físicas ou jurídicas. A proposta do petista é criar prêmios e punições tributárias. Seria um sistema progressivo. As instituições financeiras pagariam mais tributos se cobrassem spread elevado. A intenção seria forçar a redução do juro. Na prática, a medida é de difícil implementação. O professor de economia da Unicamp Fernando Nogueira da Costa diz que os bancos, para manter sua margem de lucro, repassariam esta tributação progressiva sob forma de aumento do custo de crédito para o cliente final. Juliana Inhasz, do Insper, também entende que, devido à grande influência política do setor bancário em Brasília, seria uma medida difícil de prosperar.