É enganoso o vídeo que afirma que o candidato do Partido Novo à Presidência, João Amoêdo, é ligado ao magnata George Soros e trabalha para uma de suas organizações, a Open Society Foundations, acusada de ser "criminosa" e "financiar a esquerda em todo o mundo". Há fatos verdadeiros no vídeo. Porém, aparecem misturados com informações inverídicas.
No material, um dos principais argumentos para ligar Amoêdo a Soros é a relação do bilionário húngaro-americano com o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga. Entre 1993 e 1999, Fraga foi diretor-gerente do Soros Fund Management (SFM), a empresa de investimentos de Soros. Depois de deixar o Banco Central, Fraga abriu sua própria empresa, a Gávea Investimentos. Ele disse admirar o trabalho da Open Society Foundations, mas confirmou que não tem vínculos com Soros.
No vídeo, Fraga é apontado como parceiro de Amoêdo na criação do Novo. No entanto, o economista não está na relação de fundadores e não é filiado à legenda.
A assessoria do partido informou que Amoêdo e Fraga são "conhecidos, mas nunca tiveram relação pessoal". Fraga, por sua vez, afirmou que nunca atuou em sociedade com Amoêdo.
Além de Fraga e Amoêdo, o vídeo aponta uma terceira pessoa como artífice da criação do Novo — Fernão Bracher, também ex-presidente do Banco Central. A gravação está correta ao afirmar que Bracher comandou a instituição no governo José Sarney, responsável por iniciar a política de venda de estatais, mas não é possível apontar que Bracher é "líder do programa de privatizações".
Bracher fundou o banco BBA, mas somente depois de deixar o governo, em 1988. O banco atuou nas privatizações e foi a única instituição brasileira a coordenar o consórcio de bancos estrangeiros para investimentos no programa de privatização.
A origem da relação entre Bracher e Amoêdo que aparece no vídeo está correta. Amoêdo trabalhou no BBA ao lado de Bracher. Em 2002, a companhia foi vendida ao banco Itaú. Hoje, a Itaú-BBA é o braço do conglomerado responsável por atender investidores e empresas com alto faturamento.
O que não procede no vídeo é a alegação de que Fraga atuou com a dupla. Nos 11 anos em que Amoêdo trabalhou no BBA, entre 1988 e 1999, Fraga passou pela gerência de operações do Banco Garantia, entre 1985 e 1988, no Rio de Janeiro, pela vice-presidência do Salomon Brothers, em Nova York, entre 1989 e 1991, pela direção de assuntos internacionais do Banco Central do Brasil, entre 1991 e 1992, e pela Soros Fund Management, entre 1993 e 1999, também em Nova York.
Outra suposta ligação entre Amoêdo e Soros seria o Itaú, apontado na peça como um "império" que teria "fortes ligações com George Soros". De fato, o Itaú Unibanco é um dos maiores conglomerados financeiros do mundo, mas não há qualquer evidência sobre Soros ser o dono do banco — em 2010, Soros comprou ações do Itaú, conforme publicou a revista Exame. Essa publicação tem servido para alimentar boatos sobre a instituição pertencer ao megainvestidor.
Já o vínculo de Amoêdo com o Itaú deu-se apenas por um braço da instituição dedicado a altos investidores, o Itaú-BBA, resultado de aquisição em 2002. Entre 2009 e 2015, integrou o conselho de administração da investidora. Amoêdo entrou pouco depois da fusão entre Itaú e Unibanco, anunciada em novembro de 2008. Antes disso, a partir de 2004, havia sido vice-presidente e membro do conselho de administração do Unibanco.
O Novo é apontado no vídeo como extensão do banco Itaú e da atuação do suposto trio Bracher-Amoêdo-Fraga. Como mencionado anteriormente, Fraga não atuou com Bracher e Amoêdo.
Bracher, que foi presidente da Itaú-BBA, não está na lista de fundadores do Novo, mas doou R$ 50 mil para ajudar a erguer o partido, fundado sob liderança de Amoêdo em 2011, e R$ 50 mil à campanha presidencial deste ano. Hoje, o seu filho, Candido Bracher, é presidente do Itaú Unibanco.
O Itaú não tem vínculos institucionais com o Novo, mas executivos e ex-executivos do banco estão entre os empresários que fizeram doações à agremiação quando criada, como mostrou o Valor Econômico em setembro de 2016. Atualmente, o Novo é presidido por Moisés Jardim, que foi diretor do Itaucred, outro braço do Itaú Unibanco.
Para apresentar o Novo como um partido de esquerda com "layout novo” e financiado por George Soros, o vídeo elenca equivocadamente uma série de organizações supostamente patrocinadas pela Open Society Foundations, a organização filantrópica do bilionário. A OSF já investiu US$ 32 bilhões em projetos ao redor do mundo, e os financiamentos concedidos são abertos.
Na lista, não há patrocínios ao Foro de São Paulo, ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), ao "Partido Comunista", ao PT ou ao PSDB, conforme mencionado no boato. Porém, consta no documento um financiamento à Fundação Instituto Fernando Henrique Cardoso, em 2016, no valor de US$ 15,7 mil, e um de US$ 53,6 mil à organização Quebrando o Tabu.
O vídeo foi enviado ao WhatsApp do Comprova — (11) 97795-0022 — por diversos leitores. O Comprova entrou em contato com a Open Society Foundations e um porta-voz da organização informou que o material é "impreciso". Procurado, o Itaú preferiu não se manifestar.
Enganoso
João Amoêdo não tem ligação com George Soros nem com as organizações comandadas pelo famoso investidor. Partes do conteúdo divulgado em vídeo são enganosas.
Projeto Comprova
Este texto foi originalmente publicado no site do Projeto Comprova. A evidência foi checada pelos veículos parceiros SBT, Estado de S. Paulo, Folha de S.Paulo, O Povo e Gazeta Online.
O Comprova é um projeto que reúne jornalistas de 24 diferentes veículos de comunicação brasileiros, incluindo GaúchaZH, para descobrir e investigar informações enganosas, inventadas e deliberadamente falsas durante a campanha presidencial de 2018.