A eleição 2022 chega a seu desfecho neste domingo (30), com o ato final da votação em segundo turno para presidente e para governador do RS. Mais de 154 milhões de eleitores estão cadastrados para comparecer às urnas no país - 8,5 milhões só no Rio Grande do Sul. Está sendo uma eleição eletrizante, por suas características e pelos candidatos selecionados para o segundo turno, em especial no caso da eleição a presidente, com o atual presidente, Jair Bolsonaro, que tenta a reeleição, e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Os dois protagonizam o que vem sendo chamado de "polarização". Não por causa de serem polos opostos, o que é uma imprecisão política, mas sim pela concentração de votos, que definiram no primeiro turno dois polos bem evidentes. É uma eleição em que os partidos de centro tentaram estabelecer uma terceira via, mas sem sucesso.
O resultado é um ambiente eleitoral tenso, acirrado, com níveis elevados e exacerbados de agressividade, tanto na retórica empregada por candidatos e apoiadores como nos embates e enfrentamentos. Essa é uma marca dessa eleição. No meio do caminho, houve pelo menos três homicídios causados por motivações eleitorais. Politicamente, essa característica do enfrentamento se dá na relação entre poderes, especialmente na tumultuada relação entre uma das candidaturas, de Jair Bolsonaro, e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), presidido pelo ministro Alexandre de Moraes. O último desses enfrentamentos está se dando esta semana, com a denúncia da campanha de Bolsonaro de irregularidade e desigualdade na veiculação de inserções do horário eleitoral em emissoras de rádio do Nordeste. Moraes não acolheu a denúncia.
É, ainda, uma eleição com características próprias pela proximidade com as igrejas e o ambiente religioso, em que o segmento evangélico assumiu um peso eleitoral e uma posição bastante demarcada, porém não única. E também é uma eleição que adentrou as celebrações católicas pelo país. Uma eleição de episódios políticos de impacto, como nos casos das adolescentes venezuelanas e na reação do ex-deputado federal Roberto Jefferson à prisão, atirando e lançando granadas contra policiais federais.
É outra eleição de questionamento sobre urnas eletrônicas, com participação do Exército no acompanhamento do sistema, mas outra vez sem comprovação de irregularidades, e também de uma enxurrada de fake news e desinformação, especialmente em redes sociais, mas que chega e extravasa no horário eleitoral. O TSE tentou conter as fake news. Não conseguiu. Assim, aos trancos, nesse ambiente turbulento, chega-se ao dia da votação.
A palavra está com o eleitor.
O que dizem
O Pioneiro ouviu dois cientistas políticos e professores com atuação na área para traduzir a eleição de 2022
Marcos Paulo dos Reis Quadros, cientista político, pró-reitor de Graduação da Estácio Belo Horizonte
Importância desta eleição
"Estamos diante de uma escolha entre dois projetos de país absolutamente distintos. Em síntese, um deles busca preservar tradições e costumes, liberalizando as relações econômicas. O outro aposta na defesa das pautas das minorias diversitárias, com maior relevo para o Estado na economia. A decisão é importantíssima, já que nos trará consequências de longo prazo e nos fará definir quais valores vamos fortalecer e quais vamos descartar. Entendo que os valores estão no centro dessa eleição."
Características desta eleição
"Três características que se anunciaram em 2018 ficaram consolidadas em 2022. Uma delas é que ficou claro que a direita se impõe com uma força jamais vista desde a redemocratização. Há setores sociais organizados e dispostos à mobilização, além de candidatos dispostos a defender suas bandeiras abertamente. O fenômeno da "direita envergonhada", portanto, desapareceu. Hoje temos uma direita aguerrida que é capaz de pautar a opinião pública. A segunda é que a operação das campanhas entrou em um novo estágio, que me parece sem volta. Os comícios e as peças publicitárias do horário eleitoral ainda têm um papel, mas as redes sociais e os aplicativos de mensagens instantâneas ganharam muito relevo, permitindo a disseminação da imagem dos candidatos quase ininterruptamente. Pode-se fazer campanha "em casa". Prova disso é que em muitos dias os candidatos sequer tiveram agendas externas. A terceira é que a sociedade brasileira se politizou, para o bem e para o mal. O debate político está presente em praticamente todos os níveis do cotidiano e em todas as faixas sociais. O interesse por política já não é para poucos e se expande para além das eleições."
Maurício Assumpção Moya, professor de Ciências Políticas da UFRGS
Importância desta eleição
"A democracia é um processo em permanente construção, as instituições democráticas não vão se sustentar sozinhas, precisam de apoio das pessoas, das associações, das empresas, da mídia. Quando grandes grupos se articulam para atacar os pilares da democracia, eles podem causar danos significativos. Não podemos tolerar que políticos aventureiros, amadores ou irresponsáveis causem retrocessos ao funcionamento do governo democrático e dos processos políticos."
Características desta eleição
"O combate a fake news por parte do TSE foi muito maior, mas ainda distante do ideal. Porém, o uso da máquina pública foi escancarado e tolerado como nunca antes. O presidente teve compromissos de campanha durante o expediente de governo, fez reuniões e lives para a campanha dentro do Palácio da Alvorada, usou recursos públicos para fins no mínimo ambíguos, para citar uns poucos exemplos. Polarização não é um problema. Na Inglaterra ela existe, na Alemanha, nos EUA, na França. O problema é a radicalização. No Brasil a polarização ocorreu acompanhada do comportamento radical, principalmente dos apoiadores do atual presidente. Vimos casos de violência, de assédio eleitoral (que foi recorde), de manifestações agressivas. Houve também uma cristalização precoce das preferências eleitorais. O 1° turno meio que antecipou o 2° turno. Os dois primeiros colocados somaram mais de 90% dos votos válidos. Isso deixou uma margem muito pequena de votos para serem conquistados entre um turno e outro. Também importante citar o recorde de casos de assédio eleitoral. E de cada 10 casos, 9 envolviam apoiadores do presidente. São dados do MPT, Ministério Público do Trabalho."