Fundamental para a eleição de Jair Bolsonaro em 2018, a intenção de voto de evangélicos de todas as denominações é acompanhada de perto por partidos e candidatos. Os princípios defendidos pelas igrejas e a preocupação em manter os valores difundidos nos cultos são as principais justificativas dos pastores que levam a política para dentro dos templos e admitem orientar seus fiéis ao voto.
Da Região das Hortênsias, a pastora Monica Rein costuma dizer que não é sobre candidato, mas sim sobre o que ele defende. Instalada nos municípios de Nova Petrópolis, Gramado e Feliz, a Igreja Evangélica de Cristianismo Decidido tem mais de 250 pessoas envolvidas e entende ter um papel importante na sociedade. Por isso, a política não fica de fora dos cultos e os fiéis são orientados a expressar nas urnas as crenças da Igreja — contra o socialismo, por exemplo. O raciocínio faz com que a igreja se aproxime do presidente Jair Bolsonaro, que levanta pautas que conversam com o que é pregado por ela.
— Na nossa igreja, todos são livres para votarem, seja na direita, esquerda ou no centro e não queremos ter preconceito, mas praticamente todos caminham unidos com estes princípios de fé, família e honestidade — contou.
As crenças citadas por Monica tratam principalmente da proibição do aborto e o apoio à política armamentista. A política de assistência social também é criticada no círculo onde Monica atua como pastora.
— Não se mede o desenvolvimento de um povo pelo assistencialismo do governo e sim de quantos não precisam mais dele por ter emprego — disse.
Os princípios cristãos também são a justificativa do pastor Davi da Silva Vilasboa para abordar sobre política na Igreja Assembleia de Deus Ministério Fanuel, que preside há dois meses no bairro Arcobaleno em Caxias do Sul.
—Temos orientado os fiéis, não no âmbito de pregações, mas no diálogo, através de um direcionamento e um norte para que entendam o que acontece na nação nos dias de hoje — explicou.
Para Vilasboa, todo pastor deveria ter a visão de direcionar seus fiéis e faz disso seu propósito sem nenhum tipo de tabu em deixar as conversas políticas do lado de fora.
— A Igreja precisa tratar sobre todos os assuntos para que não se trate em outros (espaços) e muitas vezes de forma distorcida — afirmou o pastor, que atualmente prega para um grupo de 30 pessoas e quer alcançar 200 fiéis até o final do ano.
Com voto aberto em Jair Bolsonaro, Vilasboas também diz estar atento à forma como candidatos olham para a oportunidade de angariar votos nas igrejas:
— A nação brasileira é cristã, então temos que ter cuidado para que os candidatos não usem isso para si próprios, é preciso saber se eles cumprem princípios e tratam a família como família.
No entanto, o envolvimento das igrejas evangélicas não é unânime e há exceções. A Primeira Igreja Batista, localizada na Rua Sinimbu, garante, através do pastor Cleber Machado, que não possui inclinações políticas e nem empresta seu púlpito para candidatos de qualquer linha ideológica. O mesmo ocorre na Assembleia de Deus do bairro São Caetano, que diz não ter vínculos políticos.
Instalada há nove anos em Caxias do Sul e com quase 500 igrejas espalhadas pelo país, a Verbo da Vida, estima que 50% do seu público seja formado por jovens entre 20 e 40 anos. De acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o maior município da Serra tem 131.950 eleitores na faixa entre 20 e 39 anos, o que representa 38,41% do eleitorado caxiense. No Estado, 36,34% dos eleitores têm entre 20 e 39 anos.
No domingo (17/9), a igreja presidida pelo pastor Sílvio Demarchi, 50, distribuiu uma cartilha com o propósito de divulgar as orientações políticas da organização religiosa que diz ser totalmente apartidária.
— O regimento interno não permite que seja citado o nome de candidatos, nem o púlpito usado como palanque eleitoral. O propósito é pregar o Evangelho e não eleger políticos, mas é a nossa obrigação ensinar nosso povo a votar de forma correta — explicou o pastor Demarchi.
E a forma correta, para ele, é seguir os princípios defendidos pela Verbo da Vida e não apoiar candidatos que defendam o casamento homoafetivo, por exemplo.
— Não condenamos as pessoas por suas opções (sic) sexuais, mas não aprovamos esse tipo de conduta, então vamos trabalhar em prol daqueles que defendem aquilo que também defendemos, sem olhar para o indivíduo candidato, mas para o seu plano de governo — contou.
Ainda segundo o pastor, não há hoje nenhum político 100% alinhado com as crenças de sua igreja, por isso a opção mais aproximada é por Bolsonaro. Mas Demarchi deixa claro que assume publicamente sua escolha como cidadão, e não como líder religioso.
— Não posso chegar diante da Igreja e falar para as pessoas em quem elas devem votar, mas é minha obrigação instruir em quem não votar.
A escolha pelo candidato, segundo ele, diz respeito a cada um, e não é papel do pastor criticar as atitudes dos membros, mas orientá-los. E para isso, Demarchi cita um exemplo:
— Adultério é pecado, ensinamos isso, mas se a pessoa decidiu trair é escolha dela, eu não vou expulsar ela da igreja. Fazer isso é como expulsar um doente do hospital.
Em outra igreja, mas da Assembleia de Deus, o pastor Rodrigo Rizzon, 45, deixa os assuntos políticos do lado de fora dos cultos realizados no bairro Vila Mari. Com 600 membros ouvidos por ele, Rizzon garante não influenciar a escolha nem comentar sobre o seu voto. Mas sabe que a inclinação da congregação é à direita, fato deixado nas entrelinhas por pastores que presidem outras igrejas da região.
— A Igreja precisa de representantes, mas acho errado se valer da posição para se eleger, política é uma coisa, religião é outra, meu chamado é pastoral então não me meto — afirmou.
CIECS não interfere nos posicionamentos políticos
O Conselho Municipal das Igrejas Evangélicas de Caxias do Sul representa 38 igrejas e em 2020 oportunizou que os candidatos à prefeitura na época apresentassem as propostas em uma reunião extraordinária.
— Não há nenhuma aliança partidária, o que existe é uma convergência de valores. Quando da eleição municipal, tivemos pastores que caminhavam junto do candidato do PT e não há nenhum tipo de retaliação no meio evangélico quanto a isso — explicou João Luís Sobrinho atual presidente da organização.
Segundo ele, o Conselho se reúne mensalmente para organizar os atendimentos prestados pelas igrejas principalmente a moradores de rua. Representativa, a entidade não interfere nas crenças ou cerimônias de cada uma delas e ainda recomenda que membros que venham a se sentir pressionados procurem meios legais para a denúncia.
— Não há curral, isso é retrocesso, se o integrante da igreja confia nos princípios de candidato A ou B, a decisão cabe a ele — afirmou.
Luteranos divididos
Em dezembro o pastor Oscar Elias Jans, 59, completará dois anos à frente da Igreja Evangélica de Confissão Luterana, instalada desde a década de 1960 na Rua Dr. Montaury em Caxias do Sul. E, segundo ele, a congregação em nível nacional se mostra dividida entre os candidatos de direita e esquerda que se apresentam ao pleito deste ano.
— Internamente, há bastante tensão de polarização. Nossa igreja não está com A ou B, ela vive as tensões junto da sociedade, mas ainda que alguns pastores tenham suas preferências, não orientamos os fiéis ao voto — explicou.
Citado por pastores de todas as congregações, os valores da igreja também são abordados por Jans, mas sob outro ponto de vista, que deixa para o indivíduo a decisão do certo ou errado e separa tais princípios das decisões políticas.
— Valores não funcionam por decreto, mas por comportamento, é cada pessoa que decide sobre os seus. Nós temos uma tendência de idolatrar nossos políticos, eles não são deuses, eles estão a serviço do povo — contou.
Como está a intenção de voto dos fiéis no Brasil
A última pesquisa Datafolha, encomendada pela Globo e pelo jornal Folha de S.Paulo e divulgada em 15 de setembro mostra que o ex-presidente Lula (PT) tem 45% das intenções de voto no primeiro turno da eleição presidencial, seguido pelo atual presidente, Jair Bolsonaro (PL), com 33%. No campo da religião, Bolsonaro vai melhor que Lula entre os evangélicos (49% a 32%). Já Lula fica à frente de Bolsonaro entre os católicos (51% a 28%).
* A pesquisa ouviu 5.926 pessoas em 300 municípios entre os dias 13 e 15 de setembro. A margem de erro é de 2 pontos percentuais para mais ou para menos. O levantamento foi registrado no TSE sob o número BR-04099/2022.