As datas para as eleições gerais de 2022 começam a se afunilar cada vez mais. Na próxima semana começarão a ser oficializados nas convenções partidárias os nomes e chapas dos candidatos à Presidência da República, ao Piratini, ao Senado, à Câmara dos Deputados e à Assembleia Legislativa. Em menos três meses, milhões de brasileiros irão às urnas.
Contudo, até lá, existe um período de preparação e 46 dias de campanha política, com ações nas ruas e na internet com candidatos, líderes políticos e apoiadores. Fala-se em eleições polarizadas no Brasil, com redes sociais inundadas de informações e também desinformações sobre os candidatos e sobre o sistema eleitoral. Além disso, existe o medo de o país enfrentar uma eleição violenta.
O futuro desse segundo semestre de 2022, que marca um dos períodos mais fundamentais deste ano, com as eleições, é o centro do debate em várias instâncias. Para o cientista político e doutor em Ciências Sociais Marcos Paulo dos Reis Quadros, a sociedade passa por um processo de hiperpolitização, que muitas vezes transcende as questões eleitorais e interfere nas relações pessoais e no cotidiano das famílias.
— Há o lado ruim disso, porque a política deve ser entendida como apenas uma das esferas da vida, e enquadrar e reduzir as pessoas a uma ideologia é, na verdade, um traço totalitário.
Entretanto, o cientista político reflete que essa hiperpolarização também demonstra um maior engajamento da população nos temas nacionais e uma familiarização com o ambiente democrático.
— Considerando o nível cultural do nosso povo e a imaturidade da democracia, não surpreende que haja excessos. Mas essa é uma etapa pela qual precisamos passar, porque há uma longa estrada a trilhar.
Quadros sinaliza que a polarização, os ânimos exaltados e a hiperpolitização não necessariamente levarão o país a uma eleição violenta. Segundo ele, o conflito de ideias é pressuposto da democracia, e divergências acirradas como as que ocorrem entre conservadores e esquerdistas são absolutamente normais em todas as nações livres.
— Recentemente, o ex-premier do Japão Shinzo Abe foi assassinado enquanto discursava. No entanto, ninguém ousa afirmar que a sociedade japonesa é bárbara. Nos EUA, democratas e republicanos geram intensa polarização, e nem por isso se considera que os americanos não são civilizados. Tampouco se diz que se trata de um país enfermo e dividido. Estranhamente, é assim que muitos julgam a sociedade brasileira.
"Procuramos crer que foi um fato isolado"
A morte do guarda municipal Marcelo Arruda, 50 anos, ocorrida no último final de semana em Foz do Iguaçu, no Paraná, levantou um debate no país sobre uma possível eleição violenta. Marcelo atuava como tesoureiro do Partido dos Trabalhadores (PT) e foi assassinado durante a própria festa de aniversário, que tinha como tema o PT e o ex-presidente Lula.
Na ocasião, o policial penal federal Jorge Guaranho, que não era convidado do evento, invadiu o local e teria feito xingamentos por causa da ideologia do aniversariante. Minutos depois, retornou ao salão com uma arma e atirou contra Marcelo.
Nesta sexta-feira (15), a Polícia Civil concluiu que não houve motivação política no crime. Guaranho foi indiciado por homicídio duplamente qualificado, por motivo torpe e por causar perigo comum, de acordo com a delegada responsável pelo caso, Camila Cecconello. Ele teve prisão preventiva decretada na última segunda-feira (11).
A juíza Taíse Velasquez Lopes, da 136ª Zona Eleitoral de Caxias do Sul, garante que a Justiça Eleitoral estará preparada para os enfrentamentos necessários.
— Não posso te dizer que a gente espera uma eleição violenta. O que a gente procura crer é que tenha sido um fato isolado, tem uma conotação política, mas também tem uma questão social e pessoal, no sentido que existem pessoas mais violentas, mas a maioria das pessoas não são assim.
Taíse ressalta que é fundamental a confiança das pessoas na Justiça Eleitoral e em todo o processo eleitoral.
— Esse tipo de problema de comunicação acaba fomentando, principalmente em redes sociais, essa polarização e essas brigas que acabaram extrapolando de alguma forma, como nesse episódio (da morte do guarda municipal em Foz do Iguaçu). Episódios isolados acontecem, mas não são a regra e queremos acreditar que não serão a regra.
Os partidos políticos têm um papel essencial nesse controle. De acordo com a juíza, a Justiça Eleitoral tem contado com o apoio dos líderes de todos os partidos e de pessoas envolvidas com a política.
— Cabe às lideranças fomentar nos seus correligionários, nas pessoas que simpatizam com as suas propostas políticas, a discussão de ideias, sem levar isso para a pessoalização. A gente sabe que, para fins de governança, os próprios partidos políticos e políticos que são antagônicos entre si, em algum momento, acabam se aliando para colocarem em prática aquilo que acreditam. É importante que as pessoas não levem isso como um tudo ou nada. Tem a disputa política, mas no fim o objetivo é o bem comum.
"A violência política é relativamente restrita"
Na opinião do cientista político, embora não devam ser considerados normais, os episódios de violência política não chegam a ser incomuns. Esses casos, na história do Brasil, ocorrem com certa frequência, aponta Quadros, citando desde o caso do atentado contra o presidente Prudente de Morais, em 1897, até a facada no então candidato Jair Bolsonaro, em 2018.
— A despeito disso, julgo que, no momento atual, a violência política é relativamente restrita. Vimos incontáveis manifestações de massa que lotaram as ruas desde o impeachment de Dilma (Rousseff, ex-presidente do Brasil), mas os incidentes violentos foram, a rigor, pontuais. Apesar da polarização e dos ânimos exaltados, creio que as eleições de 2022 seguirão esse padrão.
Debates fervorosos, "postagens" contundentes em redes sociais e críticas contra adversários são coisas naturais e até desejáveis em sociedades livres, de acordo com Quadros. Ele analisa que a maioria das pessoas que de algum modo se envolvem com política não praticam atos violentos.
— Aqueles que o fazem (atos violentos) devem ser postos fora do jogo e punidos criminalmente. Não vejo explícita apologia à violência no discurso de nenhum líder político relevante na atualidade. Quando os episódios acontecem, há investigação e processo judicial. Não me parece prudente ver no que aconteceu em Foz do Iguaçu um reflexo de algo característico da sociedade brasileira. E menos prudente ainda seria associar aquele ato insano a algum candidato — finaliza.