Um grupo de moradores de comunidades que integram a região da 2ª légua no interior de Caxias entregou a vereadores manifesto contra a instalação de canil na localidade de São Virgílio. Uma comissão liderada pelos ex-vereadores Raimundo Bampi e Ari Dalegrave — ambos moradores da região — apresentou pessoalmente o ofício aos parlamentares no plenário, durante a sessão desta quinta (21).
No manifesto, eles reiteram que consideram o local inadequado para instalação da estrutura em razão da perturbação que poderia causar aos moradores, assim como afetar a produção de agricultores.
— Nada contra os animais, eles merecem ser bem tratados, não concordamos é com o local. A comunidade entende que o local tem de ser uma região onde não existem moradores e nem produção agrícola. Tem toda a preocupação com possível contaminação também. A prefeitura alega que não há risco, mas se não há então que coloquem (o canil) em uma bacia de captação — defende Bampi.
A comissão sugere que a instalação do canil seja realizada em local desabitado e não constitua zona produtiva. Como uma das opções, propõem que o projeto seja planejado no aterro sanitário de Rincão das Flores.
Uma das preocupações, reiteram, é também com suposta insegurança que a estrutura traria à região:
— Essas promessas de que vai ter segurança... A referência que temos hoje não são boas. Roubaram o busto (do Duque de Caxias) na Praça Dante Alighieri e ninguém viu. A prefeitura é incompetente para administrar espaços públicos. Lá não seria diferente, pelo contrário, pela distância e pela indicação de como seria logo logo se tornaria um lugar inseguro e de difícil acesso — acredita Dallegrave.
O manifesto é assinado pela Comissão Representativa das Comunidades de São Martinho, São Vigílio, Loreto, São Valentin e Caravaggio e ratificada pelos moradores
O Pioneiro tentou contato com a vice-prefeita de Caxias, Paula Ioris (PSDB), mas não obteve retorno.
Moradores alegam desprezo do governo
No manifesto, a representação das comunidades critica o poder público por suposto desprezo à reivindicação.
— A forma que foi feita criou uma rejeição muito grande, pelo desprezo. O poder público fez tudo escondidinho. Descobrimos por acaso que estava se medindo e negociando a área. Depois o prefeito chamou individualmente algumas pessoas, como eu, para tentar desmobilizar e não receber toda a comunidade. E nós defendemos que se abra diálogo com toda a comunidade — afirma Ari Dallegrave.
A crítica se estende:
— Divulgaram para todo mundo, vereadores, ONGs, menos aos moradores. A comunidade está bastante revoltada. O que mais nos incomoda é que é uma decisão sem consulta — pontua Valdecir Segat.
— Qualquer incidente que ocorrer vai cair no colo do prefeito. Ele que está trazendo esse problema para nós. Se tivesse um pouco de bom senso, antes de fazer esse estudo teria ido na comunidade e conversado com os moradores — avaliou Bampi.
O vice-líder de governo, Adriano Bressan (PTB), falou no plenário que uma reunião deve ser agendada entre o Executivo e os moradores na próxima semana.
O que diz o governo
A reportagem contatou com a vice-prefeita Paula Ioris (PSDB) para ouvir o governo diante de críticas dos moradores quanto à condução dada à definição de um local para o Parque Municipal de Proteção Animal. Paula enviou um áudio, mas disse que quem fala oficialmente sobre o assunto é a secretária de Governo, Grégora Fortuna dos Passos, e pediu para que fosse aproveitada a resposta dela na reportagem.
“Estamos trabalhando da forma mais transparente possível. Estamos em contato com a comunidade para fazermos uma apresentação do projeto para todos. O projeto foi apresentado para ONGs e entidades protetoras (dos animais), para a Câmara, para o Ministério Público e para alguns moradores. Nos próximos dias, fecharemos a data com a comunidade e iremos lá fazer a apresentação também. Nossa intenção é dialogar e pensar no melhor para o município.” Grégora Fortuna dos Passos, secretária de Governo
Confira o manifesto na íntegra
"MANIFESTO DOS MORADORES DA SEGUNDA LÉGUA DE CAXIAS DO SUL CONTRÁRIOS À INSTALAÇÃO DO CANIL MUNICIPAL NA LOCALIDADE DE SÃO VIGÍLIO
"Considerando que a região da Segunda Légua tem sua vocação plantada na produção de uvas, frutas e hortigranjeiros de qualidade, estando gravada também de interesse turístico, com investimentos da iniciativa privada em cervejarias artesanais, gastronomia com desenvolvimento do turismo;
Considerando que as proximidades do local indicado pelo Município para o novo canil são habitadas por agricultores nativos de tradição centenária na agricultura familiar;
Considerando que a pretensão do Município colide frontalmente com iniciativas de combater o êxodo rural;
Considerando que o projeto apresentado é absolutamente inadequado para o local, seja pelo espaço físico, seja porque fora do contexto cultural da localidade;
Considerando que a região da Segunda Légua, se não a maior, é das maiores produtoras de uva de qualidade de Caxias do Sul, fortemente integrada ao evento maior da cidade, a Festa da Uva;
Considerando que um grande número de produtores têm participado da exposição de uvas, com grande número de premiações pela qualidade dos produtos;
Considerando que um canil nas proximidades pode desestimular e comprometer a produção de qualidade atual, prejudicando nossa festa maior;
Considerando os mananciais de águas intocados pela poluição que, inevitavelmente, serão contaminados pela incompetência do poder público no manejo ambiental;
Considerando o desprezo do poder público com os agricultores, que sequer estabeleceu diálogo com as famílias atingidas, querendo impor goela abaixo empreendimento que não tem nenhum vínculo com os moradores;
Considerando a prática do Município de abandono de todas as áreas públicas, a iniciar pela praça Dante Alighieri, sem segurança e sem o atendimento mínimo de ajardinamento;
Considerando que o local indicado pelo Município para construção do novo canil se constitui em reserva de fauna e flora, em meio ao corredor ecológico de mata nativa que vem do Rio Caí e Rio Belo, berço de uma infinidade de animais e aves silvestres, situação incompatível com centenas ou milhares de cães latindo dia e noite, em impacto ambiental negativo e desnecessário;
Considerando que os moradores atingidos são em sua grande maioria pequenos agricultores nativos, que terão seu sossego abalado pelo latido dos cães, moscas, odor das fezes, infestação de ratos, insetos e doenças, situação já vivenciada no atual canil;
Considerando que todas as áreas públicas pertencentes ao Município, de livre acesso, estão comprometidas com a falta de segurança, mesmo próximas a postos policiais e guarda municipal, o que indica que em pouco tempo moradores e região serão vítimas da insegurança, diurna e noturna sem nenhum atendimento;
Considerando que em diversas oportunidades em que foram apontados locais para instalação do canil municipal, houve fortes conflitos com a população por escolha de locais inadequados, e aqui não é diferente;
Considerando que efetivamente o canil se constitui em problema exclusivamente urbano, não pode ser atirado no meio rural sem critério e sem respeito aos moradores próximos e da macro região, que devem opinar e decidir sua vocação;
Considerando que a Lei maior do Município estabelece critérios de ocupação de áreas rurais, impacto de vizinhança, consulta e garantia da participação da população diretamente afetada pelo empreendimento, consulta aos moradores, análise do impacto na paisagem urbana e patrimônio natural e cultural, entre outros;
Considerando que qualquer empreendimento deverá contemplar a análise dos seus efeitos positivos e negativos ou atividade quanto à qualidade de vida da população residente na área e em suas proximidades;
SUGEREM:
A imediata suspensão de qualquer procedimento do Município com a finalidade de instalação do canil municipal na comunidade de São Vigílio;
Que a instalação e execução do projeto sejam efetivados fora de zonas produtivas e habitadas, levando em conta o distanciamento de pessoas, de modo a garantir a inexistência de desconforto de vizinhança;
Que a instalação não ponha em risco a vocação da localidade escolhida, de maneira a não interferir na qualidade das águas, florestas e produção agrícola;
Que a distância entre a cidade e o canil, seja suficiente para inibir mal feitores e estimular o abandono de animais nas proximidades, com espaço que efetivamente garanta o bem estar dos animais;
Por tudo isso, as comunidades de São Martinho, São Vigílio, Loreto, São Valentim e Caravaggio se manifestam CONTRÁRIAS à instalação do Canil Municipal na Localidade de São Vigílio da Segunda Légua;
Pelo exposto, REPUDIAM também a forma de condução dos trabalhos por parte do Município, sem diálogo, desprezo aos agricultores, até deboche, falta de transparência, enfim, uma total falta de respeito com os moradores e moradoras da colônia.
Finalmente, sugerem que o novo canil seja instalado na ampla área do aterro sanitário no Apanhador, local que não gera custos nem desperdício do dinheiro público, porque já pertence ao Município, ainda, distante dos moradores o suficiente a não causar perturbação.
Firmam esta nota, a Comissão Representativa das Comunidades de São Martinho, São Vigílio, Loreto, São Valentin e Caravaggio, ratificada pelos moradores".